Só no ano passado foram atribuídos mais de 8,2 mil milhões de euros em subvenções e em outros benefícios disponibilizados pelos mais variados organismos públicos, de acordo com os dados da Inspeção-Geral de Finanças a que o Nascer do SOL teve acesso. Nessa lista constam milhares de apoios a instituições públicas, a empresas, a associações e a muitas outras entidades, como a Cruz Vermelha Portuguesa, cujos montantes podem chegar aos milhões de euros.
O Instituto da Segurança Social foi a entidade que mais verbas transferiu em 2024, ultrapassando os 2,4 mil milhões de euros. A maioria desta verba teve como destino projetos dirigidos à ação social, mas também é possível encontrar valores atribuídos no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), à Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados ou para o Programa de Emergência Alimentar.
Também o Fundo Ambiental aparece em lugar de destaque ao pagar mais de mil milhões, seguido pelo IAPMEI que atribuiu mais de 700 mil euros destinados essencialmente a apoiar pequenas e médias empresas, assim como para projetos de internacionalização.
Em relação a beneficiários, o setor da energia bate recordes. A subvenção mais alta foi paga à EDP Distribuição (atual E-Redes) pelo Fundo Ambiental no montante de 623,1 milhões de euros no âmbito da receita à redução do défice tarifário do Sistema Elétrico Nacional – um valor que representa a diferença entre os custos de produção e distribuição de energia elétrica e os preços cobrados aos consumidores. Aliás, a elétrica portuguesa foi a campeã dos valores arrecadados ao receber mais de 934 milhões de euros em 2024 nesta matéria.
A empresa liderada por José Ferrari Careto, a par do défice tarifário recebeu ainda mais de 311 milhões relativos à transferência de receitas de leilões relativos ao Comércio Europeu de Licenças de Emissão. A somar há que contar também com quase 74 milhões destinados à taxa de apreciação + Ramais (OVP) atribuídos pela câmara de Matosinhos, ou seja, taxas associadas à ocupação da via pública e à realização de obras. Do IAPMEI recebeu mais de 17 mil euros no âmbito do PRR e quase 10 mil euros da Agência para o Desenvolvimento e Coesão para projetos de investigação e desenvolvimento.
Já a EDP Comercial recebeu perto de 268 mil euros, em que grande parte da fatia foi atribuída pelo Fundo Ambiental no montante de 228 mil euros relativos a apoios financeiros aos utilizadores de veículos elétricos, cabendo o restante a projetos de inovação e desenvolvimento pago pelo IAPMEI.
Por sua vez, a EDP Inovação recebeu mais de 49 mil euros provenientes do PRR e a EDP Serviço Universal recebeu mais de 3,4 milhões do NER 300, um programa de financiamento para projetos inovadores de demonstração de energia de baixo carbono.
Ao todo, só o grupo EDP beneficiou de mais 930 milhões de euros só em subvenções e e outros benefícios públicos no ano passado.
Ainda no setor há que destacar a Empresa de Eletricidade da Madeira que recebeu mais de 30 mil euros, a grande maioria foi proveniente do Instituto de Desenvolvimento Regional do arquipélago para a empresa levar a cabo um projeto-piloto de armazenamento de energia com baterias no Porto Santo
Transportes são alvo
Na área de transportes, só a Carris recebeu mais de 137,8 milhões de euros em subvenções, na sua maioria destinados à criação de passes, nomeadamente os gratuitos. Verba que foi, em grande parte, entregue pela Transportes Metropolitanos de Lisboa (detida a 100% pela Área Metropolitana de Lisboa e responsável pela gestão do serviço público de transportes rodoviários): 65,6 milhões com este objetivo.
A somar a estes valores há que contar ainda com verbas para a eficiência energética nos transportes públicos e dinheiro que é dado pelo município de Lisboa pelos serviços de transporte fornecidos, incluindo as tarifas pagas pelos passageiros. A título de exemplo, a autarquia liderada por Carlos Moedas pagou à empresa mais de 25 milhões pelos serviços prestados.
Mas a Carris não foi a única empresas de transportes a receber subvenções. A Fertagus é outro exemplo. Em 2024, recebeu quase nove milhões de euros destinados, na sua maioria, à criação de passes municipais. O mesmo cenário repete-se com os Transportes Coletivos do Barreiro. Já a Sociedade Transportes Coletivos do Porto (STCP) recebeu quase 18 milhões para a gestão da rede de transportes urbanos e para projetos de modernização e digitalização da frota.
Curiosamente a TAP recebeu mais de 59 mil euros da Associação de Promoção da Região Autónoma da Madeira – detida pela Direção Regional de Turismo e a Associação Comercial e Industrial do Funchal – para desenvolver ações de campanha e de marketing para esta região.
Sociedades de garantia mútua captam verba
Só a sociedade de garantia mútua Norgarante – que opera na região Norte e em três distritos da zona Centro: Aveiro, Guarda e Viseu -, recebeu mais de 100 milhões. Também a Lisgarante -com sede em Lisboa e agências Comerciais em Lisboa, Setúbal, Algarve e Madeira – e a Garval – com sede em Santarém e agências comerciais em Santarém, Leiria, Coimbra, Castelo Branco e Açores – receberam quase 87 milhões e mais de 48 milhões, respetivamente.
Nos três casos as verbas são provenientes, em larga maioria, do Fundo de Contragarantia Mútuo – fundo que cobre parcialmente o risco das operações concretizadas pelas sociedades de garantia mútua (SGM) alavancando a sua capacidade de apoio às PME e pelo Instituto de Desenvolvimento Empresarial.
No fundo, trata-se de apoios indiretos a empresas, canalizados através das sociedades de garantia mútua, em que o Estado usa estas entidades como veículos financeiros para assegurar o cumprimento de obrigações em linhas de crédito.
Apoios sociais dominam
A Cruz Vermelha Portuguesa é outra entidade que recebe subvenções do Estado. Só em 2024 recebeu quase 40 milhões de euros, montante atribuído não só pelas várias autarquias nacionais como pelo Instituto de Gestão da Segurança Social e não só. Aliás, o montante mais elevado foi atribuído por esta última entidade no valor de 14 milhões de euros, em que a sua maioria diz respeito à atribuição de apoios sociais.
Os montantes recebidos tiveram ainda como destino programas de distribuição alimentar e integração de migrantes, projetos de inclusão social e apoios a vítimas de violência. Há ainda a destacar os montantes destinados ao mercado de trabalho e que passa por apoios financeiros relativos a estágios e por compensações financeiras a empresas com vista a contratar desempregados de longa duração.
Futebol em destaque
A Federação Portuguesa de Futebol (FPF) recebeu mais de 37,5 milhões em subvenções e em outros benefícios públicos, dos quais quase 34 milhões são provenientes do Turismo de Portugal e dizem respeito à distribuição de verbas do Imposto especial de jogo online. A título de exemplo, a entidade recebeu ainda 55 mil euros para a organização da Taça de Portugal de Futsal (masculina e feminina) e conta ainda com verbas para estágios profissionais através do IEFP e para deslocações e atividades regulares de desporto federado.
A par da Federação há que contar ainda com as verbas que são transferidas das mais variadas autarquias para os clubes de futebol local. A título de exemplo, destaca-se o Futebol Clube de Ferreiras que recebeu da Câmara de Albufeira 1,1 milhões de euros para a cedência de instalações para a prática desportiva.
Entre autarquias, a Secretaria Regional de Educação, Ciência e Tecnologia, Instituto Português do Desporto e Juventude, Turismo de Portugal e IEFP, o futebol recebeu no ano passado mais de 71 milhões de euros. É certo que este montante não se destina apenas a clubes desportivos locais, já que entra neste bolo a verba para a FPF, Liga Portuguesa de Futebol para clubes como o Sporting, Benfica e Porto.
Banco do Estado também recebe
Também a Caixa Geral de Depósitos recebeu mais de 34 milhões, dos quais 31 milhões de euros provenientes da Direção-Geral do Tesouro e Finanças relativos à bonificação de juros em créditos internacionais, ou seja, apoio a países da cooperação portuguesa.
Há ainda a destacar dois milhões transferidos da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa para a emissão de uma carta conforto para garantir um financiamento à Cruz Vermelha Portuguesa – Sociedade de Gestão Hospitalar. Esta carta serve como uma garantia de apoio, demonstrando a solidez financeira e o compromisso da entidade com a Cruz Vermelha. É certo que esta operação também foi acompanhada por outras instituições financeiras, nomeadamente o BCP, BPI e Santander Totta. O mesmo aconteceu com as bonificações de juros.
O banco liderado por Paulo Macedo recebeu ainda do Instituto Português de Desenvolvimento Empresarial várias bonificações de diversas linhas de crédito.
Paralelamente, a Culturgest detida pelo banco público recebeu mais de 144 mil euros, dos quais 120 mil da Direção-Geral de Artes para constituir uma plataforma de referência na dinamização da arte contemporânea portuguesa, através do reforço do eixo de descentralização artística nacional.
Turismo domina
Dentro do setor do turismo há uma associação que se destaca na lista. Trata-se da Associação de Turismo de Lisboa que recebeu mais de 26 milhões em 2024. Destes, 10 milhões foram entregues pela Câmara de Lisboa para a organização e apoio financeiro no âmbito do Web Summit.
A par deste evento, a entidade recebeu ainda do Turismo de Portugal e da Entidade Regional de Turismo da Região de Lisboa vários montantes destinados à promoção de Lisboa como destino turístico e para o apoio à cultura e congressos.
Em nota de curiosidade a autarquia disponibilizou 300 mil euros à associação para apoiar financeiramente a exposição de Pedro Cabrita Reis – 45 anos de Obra.
Outros dados
O setor industrial também surge nesta lista. Um desses casos é a Navigator Pulp Setúbal, uma subsidiária da The Navigator Company, que recebeu mais de 11 milhões do IAPMEI no âmbito do PRR. A este valor há que somar ainda montantes atribuídos pelo IEFP para a realização de estágios.
Destaque ainda para a Associação de Jardins-Escolas João de Deus que recebeu, em 2024, mais de 14,5 milhões de euros. Grande parte desta fatia foi entregue pelo Instituto da Segurança Social destinada à ação social e a acordos de cooperação.
Também o ACP recebeu mais de quatro milhões destinados, na maioria, à organização de eventos de automobilismo como o WRC Vodafone Rally de Portugal.
Quanto a dados curiosos há destaque para valores destinados às marchas populares onde, por exemplo, a Câmara de Lisboa entregou 30 mil euros a cada entidade. Um dos casos foi o da Voz do Operário, mas a esta soma-se muitos outros grupos desportivos lisboetas.