Passos Coelho está contra o ‘relaxamento’ de regras da IVG

No prefácio de um livro que reúne textos em defesa da vida, o ex-PM critica quem  quer cancelar opiniões  contrárias sobre o tema.

My body my life, é o título do livro que será lançado esta terça-feira em Lisboa, com a recolha de textos publicados na imprensa em defesa de uma revisão da lei do aborto em vigor em Portugal. O livro coordenado por um grupo de militantes pró-vida, ligados à Federação Portuguesa pela Vida, tem o prefácio do ex-primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, que vai marcar presença da apresentação da obra.

Na introdução os coordenadores, Teresa Melo Ribeiro, José Ribeiro e Castro e Isilda Pegado, justificam a publicação com o ressurgimento do debate nos últimos meses, visando alargar os prazos permitidos para a realização de Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG) e restrições ao direito à objeção de consciência dos profissionais de saúde. Escrevem os autores que «aqueles que entendem que em Portugal o aborto é um não assunto ou um assunto encerrado estão enganados» . E mais à frente afirmam que o crescimento do número de abortos praticados nos últimos anos justificam que «a questão do aborto nunca será nem pacífica, nem pacificada, uma vez que estamos a falar de vidas humanas».

É exatamente sobre as tentativas de alteração da lei em vigor que Pedro Passos Coelho fixa a argumentação do seu texto de prefácio. Começando por dizer que não coincide com as posições assumidas pelos autores dos textos publicados no livro, o antigo primeiro-ministro diz que as discussões sobre o aborto e a eutanásia «são problemáticas que, em comum, têm o condão de remeterem a discussão para um plano filosófico e de consciência moral que não divide apenas a opinião pública, divide também os partidos e as respetivas correntes de pensamento ideológico e programático, embora de modo desigual».

Depois de referir no texto que defendeu as várias leis aprovadas no parlamento em matéria de despenalização do aborto (em 1984, 1997 e 2007), Passos Coelho refere que em 2011, quando chefiava o governo, «considerei que talvez se tivesse ido longe demais em 2007 e que deveria ser realizada uma avaliação de impacto da lei para permitir uma discussão informada sobre o assunto. Apesar de não ter defendido a realização de um novo referendo sobre o assunto, considerei que esta não se poderia excluir se fosse caso de alguém o defender na sequência dessa avaliação». Lamentando as muitas críticas que lhe foram feitas na altura, acusando-o de  «trair» a sua posição original para «seduzir o voto católico e conservador», refere que a sua posição foi sempre restritiva «apesar de se expressar no campo da defesa da despenalização».

Num longo texto de nove páginas, Passos Coelho dirige fortes críticas aos que considera serem «uma classe de ativistas que classifica as suas posições nestas matérias como sendo progressistas» e que, do seu ponto de vista impedem qualquer reavaliação da lei em vigor, impondo a quem o defende «uma reação de cancelamento não apenas das pessoas em si mesmas no espaço público, como até de qualquer atividade a que possam estar ligadas».

Contra os que inviabilizam a discussão no espaço público, o antigo primeiro-ministro defende a publicação do livro My body my life por «ajudar a fixar este importante debate num plano de pluralismo e de exigência intelectual, que não pode ficar arrogantemente impermeável às correntes de opinião que aqui se expressam».

Na segunda parte do texto, Passos Coelho faz uma análise aos dados estatísticos da realização de abortos em Portugal, desde a entrada em vigor da lei de 2007, sublinhando que a maioria das IVG realizadas desde então (mais de 70%) ocorreram a pedido da mulher e não pelos restantes motivos previstos na lei:_evitar o perigo de morte ou grave lesão para a mulher grávida; grave doença ou malformação congénita do nascituro.

A análise dos dados leva o autor do texto a dizer que «não parece existirem dados que recomendem, por razões económicas, sociais ou sanitárias, qualquer relaxamento das condições legais para a realização do aborto». O texto do longo prefácio conclui com a defesa de uma discussão livre e aberta sobre o tema:   «em questões desta sensibilidade que, como é minha opinião, envolvem um dilema moral pesado, tanto para os cidadãos interessados no debate e na formulação das políticas, como para as mulheres que têm de enfrentar a decisão de interromper a sua gravidez, não deve ser visto como fraqueza procurar evitar certezas e conclusões definitivas. Fraqueza é ter medo de confrontar as ideias ou pretender calar ou diminuir aqueles de quem discordamos e esconder-se atrás de qualquer relativismo moral para não tomar posição».

O livro que republica textos de quinze autores é lançado na próxima terça-feira dia 17 de junho, ao final da tarde no auditório sul da feira do livro em Lisboa. A apresentação será feita pelo constitucionalista Paulo Otero e Passos Coelho marcará presença no evento, embora não esteja previsto que venha a falar.

Na anterior legislatura, a discussão em torno da lei do aborto foi reaberta logo na campanha eleitoral, quando o deputado centrista Paulo Núncio admitiu a realização de um novo referendo sobre o tema. Luís Montenegro garantiu de imediato que, caso vencesse as eleições, não pretendia revisitar a lei em vigor,  mas os partidos à esquerda apresentaram um conjunto de propostas com vista ao alargamento de prazos e outros ajustes na lei, nomeadamente no que respeita à objeção de consciência.  Todas as propostas foram chumbadas.