Governo quer pôr a economia a crescer e baixar impostos

Programa do Executivo aposta em metas de crescimento acima de todas as previsões, na redução da carga fiscal e em mexidas no mercado de trabalho. Presidente da CIP aplaude mas defende reforço no investimento e quer voltar a discutir o pagamento do 15.º mês.

Só com mais crescimento económico é possível aumentar as receitas e baixar a carga fiscal. A garantia é dada ao Nascer do SOL pelo presidente da CIP, Armindo Monteiro depois de ter conhecido o programa do Governo, em que foram mantidas as perspetivas de crescimento económico de 2,4% para este ano e um excedente orçamental de 0,3% do Produto Interno Bruto (PIB). Números que ficam acima de todas as perspetivas nacionais e internacionais. Ao mesmo tempo, o Executivo promete baixar os impostos, nomeadamente o IRS em 500 milhões de euros já este ano mas deverá atingir os 2.000 milhões ao longo da legislatura.

De acordo com o ministro da Economia e da Coesão Territorial, Manuel Castro Almeida, a «prioridade atribuída ao crescimento económico tem como objetivo aumentar os rendimentos e garantir o Estado social – a escola, a saúde, a habitação, a mobilidade, a cultura ou o desporto», acrescentando que «com este ímpeto transformador, temos de enfrentar e remover obstáculos estruturais que esgotam o animo dos investidores, desencorajam o mérito e penalizam a produtividade».

Uma aposta aplaudida pelo patrão dos patrões. «A única forma de conseguirmos aumentar receitas é fazer crescer a economia. Não é possível com o mesmo nível de economia aumentar mais os impostos. Estamos com uma carga fiscal asfixiante, seja em sede de pessoas seja em sede de empresas», salienta.

E dá um exemplo: «Uma pessoa em Portugal com um nível de rendimento de 70 mil euros é considerada multimilionária e é-lhe aplicada uma taxa máxima de IRS. Os mesmos 70 mil euros na Europa são tributados à taxa média que anda à ordem dos 25 a 35%. Aqui estamos a falar de 50-55%. Não podemos pagar mais impostos. O que precisamos é de crescer» e, para isso, defende que é necessário promover o investimento.

E os números falam por si. De acordo com o relatório publicado, esta semana, pelo Conselho das Finanças Públicas (CFP), a carga fiscal aumentou 0,1% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2024, fixando-se em 35,6% do PIB e explicou que «este acréscimo resultou do aumento do peso dos impostos indiretos e das contribuições sociais efetivas, que mais do que compensaram a redução verificada nos impostos diretos».

Menos otimista está João César das Neves ao duvidar das contas apresentadas pelo Governo. «O crescimento parece situar-se na parte de cima do intervalo razoável. É possível, mas pouco provável. Quanto ao défice a aposta parece mais arriscada. Este ano, que já vai a meio, até é capaz de não falhar muito, mas as várias promessas do programa dificilmente permitirão um excedente em 2026», diz ao nosso jornal.

E deixa um recado: «Promessas de crescimento são habituais nestes documentos», mas lembra que não cabe ao Governo fazer a economia crescer. «Quando muito pode reduzir o estrago que gera no crescimento. Reduzir impostos pode ajudar nisso. Portugal é um país rico há 30 anos», ironiza.

IRC à margem do OE
Armindo Monteiro aponta ainda o dedo à lentidão dos processos e acena com a necessidade de os agilizar. «Imagine um empresário que venha para Portugal porque acha fantástico o clima e o ambiente. Entretanto, alguém lhe diz que o licenciamento da empresa pode durar dois anos. Acha que fica cá? Não fica. E quantos investidores já perdemos nos últimos tempos por causa disso? Não nos podemos esquecer que estamos a reindustrializar a Europa e Portugal não está a conseguir atrair esse investimento porque nenhum país da Europa tributa os lucros das empresas como nós tributamos. Nenhum país da Europa desincentiva a criação de grandes empresas como acontece em Portugal», confessa.

E diz que, uma parte da ‘culpa’ se deve às taxas progressivas de IRC que «não existem em lado nenhum da Europa» a somar às taxas de derrama que se aplicam a partir de determinado volume de negócio. «Se uma empresa tiver êxito e se tiver acima de determinado volume de negócio tem uma penalização. Isto não é lógico e não se aplica em parte nenhuma da Europa», acrescenta.

Aliás, umas das propostas do Governo diz respeito à proposta de redução transversal do IRC à Assembleia da República, mas será feito, segundo o ministro das Finanças, à margem do Orçamento do Estado para 2026. A ideia é diminuir as taxas deste imposto IRC, de forma gradual até aos 17% até ao final da legislatura.

Uma promessa que é aguardada pelo presidente da CIP com alguma expectativa. «Este ano esperamos que não haja outra vez aquela situação caricata como tivemos no ano anterior, em que se ameaçou que o Governo poderia cair se em vez de descer um ponto percentual do IRC ousasse reduzir dois. Tive imensa dificuldade em explicar aos nosso parceiros europeus o que se estava a passar. Isso é uma vergonha tendo nós as taxas mais elevadas na Europa», referindo que espera que esta nova distribuição parlamentar seja acompanhada por «bom consenso» não só para baixar o IRC, mas também para avançar com outras medidas para tornar a economia mais competitiva e para incentivar os investimento.

Uma dessas medidas, de acordo com o responsável, passa alterar o prazo para a obtenção do licenciamento e sua desburocratização. «Pode-se dizer que é muito difícil, mas os outros países estão a fazê-lo. Todos os país do Leste o fazem e a Irlanda já o fez há muito tempo. Não podemos continuar neste adormecimento confortável onde estamos, nem ver partidos dizerem que são contra o capital, contra o investimento, como se tivéssemos muito. Enquanto não mudarmos isto a economia não cresce. O relatório do Banco de Portugal diz que Portugal vai crescer 1,5% e depois acrescenta abaixo do seu potencial, então se é abaixo de seu potencial culpa é nossa. Nós queremos continuar pobres», alerta.

Mexidas no trabalho criam polémica
Também presente no programa do Governo estão algumas alterações do mercado de trabalho. Uma das que causou mais curiosidade está a possibilidade de os trabalhadores poderem ‘comprar’ dias extra de férias. Outra das alterações previstas é a reintrodução da opção de pagamento dos subsídios de férias e de Natal em duodécimos, ao longo do ano, em vez de uma única vez e possibilidade de reduzir o horário de trabalho com redução proporcional do salário.

É certo que a que causou mas polémica é a intenção de rever a lei da greve com o Governo a falar na necessidade de «equilibrar interesses», sobretudo em serviços públicos essenciais, o que levou a CGTP e a UGT a mostrarem o seu descontentamento e a acenarem com uma linha vermelha que não pode ser ultrapassada.

Armindo Monteiro lamenta que algumas das alterações tenham sido alvo de fortes críticas e chama a atenção para o facto de estarem ausentes do programa algumas medidas para incentivar a produtividade.

Ao nosso jornal, o presidente da CIP refere que é uma das questões que será levada à reunião que irá ter com o Governo, assim como a ideia do 15.º mês que foi proposta no ano passado, mas que não chegou a avançar. «Vai voltar a estar em cima da mesa porque a proposta foi tão limitada, tão limitada que acabou por não ter o potencial que podia ter». E em relação ao futuro não hesita: «Nem as empresas, nem os empresários vão a eleições e temos de ter sempre esta perspetiva de médio-longo prazo. Esperamos que o Governo resista a não ter apenas o poder pelo poder, mas que tenha o poder para transformar e o país precisa de ser transformado».

Também César das Neves diz que o «programa parece apostar em todas as direções», mas acrescenta: «Vamos ver o que realmente faz».