Já todos conhecem os chavões: neutralidade carbónica, metas distantes, toneladas evitadas, gigawatts instalados. Tudo apresentado em relatórios bonitos, com gráficos vistosos e frases feitas para conferências. Mas a verdadeira transição energética não vive aí. Vive onde o frio entra pelas frinchas da janela. Onde o chão está sempre húmido. Onde a luz só se acende com medo da fatura e o aquecedor só liga quando o frio já dói. A transição energética começa onde mais falta faz. É aí que a verdadeira mudança precisa de acontecer primeiro.
A transição energética faz-se no terreno. No rosto do técnico municipal que explica uma fatura incompreensível ao cidadão. Na escuta atenta de quem vive com frio dentro de casa. Na partilha de soluções simples, mas que mudam vidas. A mudança só acontece quando alguém se senta do outro lado do balcão e diz: «Vamos resolver isto juntos».
A Rede Espaços Energia está a mudar o mapa da energia em Portugal. Criada com os municípios e técnicos formados pela ADENE, leva soluções concretas ao terreno e faz a diferença com presença real e pessoas que contam. São já 121 espaços a funcionar. Em cada um, há alguém que explica, que escuta, que ajuda uma família a perceber porque é que a conta da luz é maior do que devia. Não é em Bruxelas, é em Quelfes, em Loulé ou na Junta de Freguesia de Miranda do Douro.
Os balcões da rede Espaços Energia existem para afirmar a dignidade de cada cidadão, garantindo que todos têm acesso a conforto, justiça e uma vida mais sustentável. E é aqui que tudo se liga. Quando falamos de transição justa, temos de falar de justiça em concreto. A ADENE tem mostrado que é possível fazer política pública com gente dentro. Com técnicos no terreno, com linguagem simples e com respostas úteis.
A energia não é o único reflexo das desigualdades. Há outra crise a crescer em silêncio. A água continua fora do debate público, esquecida enquanto corre. Só se fala dela quando escasseia, quando os reservatórios descem e as torneiras secam. Mas a escassez não espera. E a cultura do desperdício já está instalada há demasiado tempo.
No Algarve, onde o problema da escassez de água é mais premente, mais de uma centena de hotéis e empreendimentos turísticos aderiram ao Compromisso com a Eficiência Hídrica do Turismo do Algarve — uma iniciativa conjunta do Turismo de Portugal, APA e ADENE que desafiou o setor a reduzir consumos e implementar boas práticas na gestão da água.
Em apenas um ano, reduziram em média 13% do consumo de água. Sem grandes obras, só com decisões certas e uma ferramenta criada em Portugal. O AQUA+ da ADENE avalia o desempenho hídrico e ajuda a corrigir perdas. O resultado foi claro. 105 unidades turísticas receberam o selo Save Water. Um exemplo de política pública aplicada com impacto real.
O que falta então? Falar com mais verdade. Comunicar melhor. Falar de energia é falar de pessoas. De famílias que precisam de ajuda, mas também de autonomia. Portugal tem todas as condições para liderar esta mudança. Mas só vai conseguir fazê-lo se olhar de frente para quem ainda está fora dela. O futuro energético tem de incluir todos. Sem exceções. A transição energética exige liderança pública e ação local. A ADENE está a demonstrar que ambas são possíveis e necessárias.
Presidente da ADENE