Há muito que nos fomos habituando a aceitar «notícias» incitadoras de ódio , mesmo as mais aleivosas, com um indiferente encolher-de-ombros reflexo; para isso, temos vindo a ser domados pelo sistema político-cultural vigente, como se de uma constatação da «normalidade mediática» se tratasse. Aceitamos sem contestar expressões com as quais, no fundo, discordamos, como «interrupção voluntária da gravidez», ou tão somente IVG para esconder o conteúdo, como se o processo natural da gravidez pudesse ser interrompido e posto em suspenso até melhor oportunidade quando estivessem reunidas condições mais convenientes para o retomar. Imposto pela fria burocracia, o uso ilógico do conjecturado eufemismo perdeu a sua óbvia carga crítica e «normalizou-se» no discurso do dia-a-dia mesmo nas esferas que dele têm perfeita consciência. Quem alerte para o absurdo é sempre visto como um radical, um conspiracionista, uma pessoa afastada da realidade do momento, retrógrada, pouco cultivada e socialmente indesejável ou irrelevante.
O que é mais espantoso é que toda a caracterização e desmontagem do processo de controlo lexical está feita há muito por autores e investigadores de todos os lados do espectro político ou filosófico. No seu tratamento pedagógico das distopias, Georges Orwell fartou-se de apontar para o objectivo almejado pelos diversos Ministérios da Verdade que nelas impõem a norma. Pelos vistos sem grande consequência, até porque hoje pouca gente lê textos com mais de meia-página.
Diariamente, somos confrontados com declarações de pessoas que não foram sujeitas a qualquer escrutínio público, mas são elevados e graduados pelos media como especialistas em vários temas, se não mesmo em todos. Enquadrados pelos interesses das agendas políticas supremacistas, como a que sopra de Bruxelas, e pela intolerância de quem as representa, as suas palavras tornam-se lei e são aceites como verdade. Vieram facilmente substituir a velha teia académica destroçada e desprestigiada pela manipulação ideológica. A retórica, narrativas e interpretações dos dias de hoje ficam facilmente embutidas na mente virginal das pessoas, a maioria das quais nem se preocupa em pensar criticamente. Haja quem o faça por elas.
Recentemente, ouvi uma comentadeira regular da TV, afirmar que foi a Revolução do 25 de Abril que trouxe as escolas públicas para Portugal. Se não fosse o facto de, meio século depois, ainda haver, felizmente, muitas pessoas em Portugal que nunca conheceram outra coisa que a escola pública antes dessa data, seria fácil passar esta mentira descarada às gerações mais novas. Não é de estranhar que muitos desses ditos opinion makers tenham crescido a admirar Estaline, Mao, Castro, Hoxha ou Pol Pot. A situação torna-se ainda mais crítica na perspectiva da essência da democracia representativa quando todos os contribuintes são forçados a pagar muitas das fontes que os agridem intelectualmente e os manipulam, distorcendo a realidade histórica.
Estamos já habituados a que vários órgãos de comunicação social, ou parte das suas redacções, se assumam como activistas de causas dinamizadoras da agenda woke, que tanto protagonismo lhes proporciona. Em Portugal o diário Público destaca-se como arauto desse nonsense que frequentemente os faz surfar na maionese e gritar a plenos pulmões, não «Hakuna Matata!» na aldeia do Simão, mas sim incitamentos ao ódio e à fractura social com o recurso a adjectivação desinserida da realidade. Não foi surpresa para ninguém que o Expresso ecoasse a mesma mensagem, papagueando-a em paráfrase bem justinha.
Foi esse o caso que provocou esta minha minha reacção destemperada já que, segundo o Público, devo depreender que apoiar as causas antiaborto, isto é, ser pró-Vida, é ser extremista. Pensava eu, na minha profunda inocência, que preferir defender o elo mais fraco sobre o mais forte seria motivo de, pelo menos, alguma consideração ética social. Aliás, o próprio Estado o faz, embora de forma residual. E os animalistas o aplicam, excepto se se tratar de seres humanos. E os woke mais assanhados dizem querê-lo para os seres que populam o seu universo de letras do abecedário. Enfim, muda-se o ser, muda-se a vontade. Ironia à parte, o que me parece é que os «colectivos» começaram a assustar-se com o que se passa nos Estados Unidos e que por cá pouco se fala. Uma vez garantida a isenção e neutralidade legislativa e funcional, apesar das inclinações abortistas de Trump, o movimento Pró-Vida tem vindo a bater o pé à estratégia holocaustica que a ala radical do Partido Democrata havia imposto por todo o país, promovendo o aborto, perseguindo ferozmente os seus oponentes e subsidiando desbragadamente os seus defensores.
Não deixa de ser espantoso que os dois órgãos de comunicação em causa ˗ o jornal diário Público e o Expresso ˗ estão há muito, ao que consta, numa situação de falência técnica sem um número de leitores mínimos que suportem a sua existência financeira. Além do papel de Tio Patinhas que o Estado Português tem protagonizado com o dinheiro que todos nós compulsivamente lhe entregamos, parece que, pelo menos no caso do primeiro, é o grupo SONAE, dono da linha de supermercados CONTINENTE, que subsidia a sua sustentação. Será que as pessoas que se ressentem ou chocam com o tipo de notícias publicadas não têm pruridos de consciência quando compram nessas superfícies comerciais, sabendo que, directa ou indirectamente, estão a alimentar esses incentivos ao ódio e a distorção da verdade?
Doutorado em História Contemporânea