O tema da ascensão das potências é central no estudo das relações internacionais. Recorrentemente, as alterações do sistema internacional, com a ascensão e queda das grandes potências, redundam em conflitos militares diretos, entre quem está em ascensão e quem está em queda.
No caso atual, a ascensão da China, sobretudo esta, mas também da Rússia, tem gerado muitas apreensões. Em poucas décadas, a China cresceu muito, sobretudo economicamente. Todavia, uma vez que no sistema internacional, o poder é fungível, o poder económico adquirido facilmente se materializa em poder político (o que já é objetivo) e em poder militar (o que ainda está distante), faz com que – no raciocínio tradicional – a China esteja em rota de conflito com os EUA.
O conflito entre Israel e o Irão, do passado mês de junho, demonstrou, porém, que a maturidade da dita ‘alteração sistémica em curso’ (doravante designada de ‘ASEM’) ainda está distante, grosso modo porque a dimensão militar, anteriormente referida, ainda está longe de estar em equilíbrio. A superioridade dos EUA é evidente.
Há, quatro estados que, na sua ação externa, têm como objetivo central a alteração sistémica, sendo todos eles essenciais para a mesma: China, Rússia, Irão e Coreia do Norte. Todos são potências nucleares, exceto o Irão. Todos têm, pela posse dessas armas, a sua segurança adquirida, exceto o Irão.
Se a dita maturidade da ASEM estivesse mais sólida, em circunstâncias ‘normais’, a guerra com Israel tinha todos os condimentos necessários para potenciar um conflito mais vasto, porque poria em causa os interesses na própria e necessária alteração sistémica.
Os decisores norte-americanos percebem bem que a ‘nuclearização’ militar do Irão desequilibra, contra os seus interesses, a região do Médio Oriente. Seja na relação com o seu aliado, Israel, que deixaria de ser preponderante como é, seja na relação com o ‘aliado difícil’, Arábia Saudita, que correria para ter também armas nucleares, de modo a equilibrar a relação com o Irão.
O Irão percebeu melhor, a partir deste conflito, quer o status quo atual, quer, também, que os seus aliados, China e Rússia, não podem, ou não querem, entrar num conflito direto com os EUA. A Rússia estabeleceu, como linha vermelha, um possível ataque nuclear de Israel ao Irão, afirmando que este estaria, nesse caso, protegido pelo ‘guarda-chuva’ nuclear russo.
Paralelamente, percebemos melhor o quão importante Israel é para os EUA no Médio Oriente: terá os seus interesses próprios, mas é também um ‘proxy’, que faz parte do trabalho sujo.
O tema do Irão não está, goste-se ou não, resolvido. Apenas adiado. Tal como a ASEM não está adiada, está em curso e teremos de lidar com ela.
Ter os EUA a acreditarem que as regras do direito internacional se aplicam a uns e não se aplicam a outros não ajuda a gerar confiança. As regras comummente aceites servem como constrangimento quando temos poder, mas estabilizadas servem também para quando esse poder não estiver tão concentrado apenas em nós próprios, servindo então como argumento e salvaguarda.
Irão e iremos sem paz.