Helen Mirren. A atriz que não tem medo de envelhecer

No início da sua carreira, foi vista como um sex symbol, apesar de sempre ter combatido essa imagem. Nunca teve medo de dizer o que pensa, sempre teve as suas lutas e ultimamente tem falado sobretudo do envelhecimento. Helen Mirren é uma diva e no sábado completou 80 anos de vida.

Não gosta do adjetivo «bonita» apesar de o ouvir várias vezes. Não se importa com o que os outros pensam, mas fica incomodada quando dizem que tem os olhos azuis. «São cinzentos!», faz questão de corrigir. Sempre foi provocadora e nunca deixou nada por dizer… Recorde-se da entrevista que deu, em 1975, a Michael Parkinson. O entrevistador apresentou-a como a «rainha do sexo» da Royal Shakespeare Company e questionou se a sua aparência «atrapalhava» a sua credibilidade como uma atriz séria. Mirren respondeu de forma contundente, questionando se este estava a insinuar que as atrizes sérias não podem ter «seios grandes». A entrevista foi vista como sexista e, durante alguns anos, a atriz odiou Parkinson. Helen é também conhecida por ser uma feminista assumida.

Segundo pessoas que lhe são próximas, citando o The Guardian, a artista é bastante cortês, pontual e fácil, «para uma celebridade». No entanto, segundo a própria, as maneiras são «intencionais». «Isso torna-se mais importante à medida que avanças na vida e percebes o quanto és apreciado pelos outros, e que isso acaba por te ajudar a fazer tudo mais rápido (…) Além disso, à medida que o tempo passa, adquires um respeito maior pelas outras pessoas, pelas  suas necessidades, e pelo fato de que todos têm uma família para a qual voltar e todos têm problemas na vida com os quais estão a lutar», explicou ao jornal britânico em 2015.

Gosta de jardinagem e de ler. Fica mesmo aborrecida quando um livro de que está a gostar muito chega ao fim e, apesar de ter mais do que motivos para se considerar e viver como uma diva, o mais importante para si é conseguir manter alguma normalidade e estar com a família, mesmo sem filhos. «Sinto-me particularmente grata por estar num casamento feliz. Amo o meu marido, amo estar com ele. Ele é um pesadelo, mas é ótimo, e mal posso esperar para vê-lo… Sinto falta dele quando ele não está por perto. Não que eu não possa viver sem ele, porque posso. Mas esta é uma parte muito boa da minha vida. Quando olho para trás e penso no que fizemos juntos…», lembrou na mesma entrevista, na altura com 70 anos. Recorde-se que a atriz é casada com o realizador Taylor Hackford há 28 anos.

Helen Mirren comemorou o seu 80º aniversário no dia 26 de julho, e parece saber lidar bem com o passar dos anos. Em 2023, numa entrevista à Vogue, a atriz revelou odiar o termo «antienvelhecimento», porque considera que envelhecer «é uma parte natural da vida». «Temos que aceitar! Mas isso não significa que não devamos estar no nosso melhor, independentemente da idade. E, claro, produtos para cabelo, cremes e maquilhagem ajudam, com certeza. Eu adoro maquiagem. Passo horas em frente à minha penteadeira, não para tentar parecer uma modelo, mas porque adoro experimentar  novos produtos», revelou, sublinhando que «todos deveriam aceitar quem são». «Essa autoaceitação é uma das coisas mais importantes da vida. Só vivemos uma vez, e com sorte por muito tempo — e, no processo, envelhecemos. As pessoas que exageraram nas cirurgias plásticas parecem monstros. Estão péssimas, parecem muito piores do que pessoas mais velhas que são naturalmente mais velhas, mas gostam da idade. Em vez de ‘antienvelhecimento’, deveria ser ‘aproveite o envelhecimento’», acrescentou. Mas de onde vem esta mulher cheia de garra que continua a ocupar os grandes ecrãs? Como chegou até aqui?

Do teatro ao cinema

Nasceu em Londres a 26 de julho de 1945 e é filha de pai russo e mãe inglesa. Ao longo da sua longa carreira, interpretou cinco governantes femininas tanto no palco como no cinema: Cleópatra, Rainha Carlota, Rainhas Elizabeth I e Elizabeth II, e Czarina Catarina, a Grande. «Não levo os meus papéis para o lado pessoal. Não os vejo como um diário do meu desenvolvimento pessoal», disse numa entrevista. No entanto, o seu passado aproxima-a dessas personagens, já que Ilyena Lydia Vasilievna Mironov – nome com o qual foi registada –, vem da nobreza russa. Um dos seus ancestrais foi o Conde Mikhail Kamensky, marechal de campo na guerra contra Napoleão, entre outros. O seu avô paterno, bielorrusso e nobre, foi coronel e, durante a Primeira Guerra Mundial, adido militar na embaixada czarista em Londres. Após a Revolução de Outubro, este decidiu permanecer na Inglaterra, embora sem um tostão, pois os seus títulos, propriedades e bens haviam sido confiscados pelos bolcheviques. Um diplomata russo privilegiado tornou-se um dos muitos imigrantes retidos e motoristas de táxi londrinos.

Helen e os seus dois irmãos cresceram num ambiente de classe trabalhadora com os preconceitos dos seus vizinhos nativos contra «espiões russos» e com aspirações culturais. «Em casa, durante o jantar, sempre discutimos as grandes questões da vida: ‘Existe uma alma? O que é arte? Qual é a diferença entre arte e artesanato?’», garantiu. Para desgosto do avô orgulhoso e patriota, a família votou no Partido Trabalhista e, por respeito a ele, o sobrenome só foi anglicizado após a sua morte, em meados da década de 1950: Mironov tornou-se Mirren e Ilyena passou a Helen.

Em criança já sabia aquilo que desejava para o futuro: representar. Aos 13 anos, encontrou inspiração numa produção amadora da peça Hamlet. «Fiquei impressionada com todo esse drama exagerado», explicou numa entrevista aoThe Times UK. «Crescemos sem televisão e nunca tinha ido ao cinema. Depois de Hamlet, tudo o que eu queria era voltar para aquele mundo onde todas aquelas coisas fabulosas eram possíveis», detalhou.

Começou a sua carreira no palco, ingressando no National Youth Theatre da Grã-Bretanha aos 18 anos, depois de ter estudado num colégio de freiras onde aprendeu a «não ter medo». Aqui, distinguiu-se no papel da Rainha do Egito em António e Cleópatra, um papel ao qual voltou em 1998 ao lado de Alan Rickman no National Theatre. Um ano mais tarde, entrou para a Royal Shakespeare Company, onde permaneceu durante 15 anos.

De acordo com a Euronews, Mirren conseguiu o seu primeiro papel importante no cinema na comédia romântica The Age of Consent, de Michael Powell, em 1969. Mais tarde, ganhou reconhecimento pelos seus papéis como a mulher de um imperador no drama erótico Calígula, de 1979, a namorada de um gangster em The Long Good Friday e Morgana le Fay em Excalibur.

Recebeu a sua primeira nomeação para um Óscar pelo seu papel de Rainha Charlotte no filme de 1994 The Madness of King George, mas foi apenas depois de 2000 que o seu nome ressoou realmente pelo mundo, graças ao seu papel principal na série televisiva policial britânica Prime Suspect, onde deu vida à inspetora-chefe Jane Tennison e que lhe valeu dois Primetime Emmy Awards. Além desses, ao longo do percurso, ganhou três prémios BAFTA TV, foi nomeada Comandante da Ordem do Império Britânico em 2003 e recebeu o Óscar de Melhor Atriz pelo seu papel no filme A Rainha, em 2007.