Liberdade e democracia esvaziam papel dos Centros Escolares Republicanos

Criados entre os séculos XIX e XX, os Centros Escolares Republicanos sobreviveram no Estado Novo, mas não em democracia.

Liberdade e democracia esvaziam papel dos Centros Escolares Republicanos

O Centro Educativo Republicano Alferes Malheiro (CERAM) é o único, num conjunto que não ultrapassa uma dezena, que ainda mantém atividade operacional. Recuando ao passado, encontram-se registos que apontam para o funcionamento simultâneo de 130 centros escolares republicanos, espalhados por todo o país.

Este ‘apagão’ tem uma explicação simples, nas palavras de Alfredo Baptista, presidente do Centro Escolar Republicano Alferes Malheiro (CERAM): «O objetivo central dos centros era a educação, um valores nobre do republicanismo. Por isso, no período que antecedeu a chegada da República, há 115 anos, como nas décadas que se seguiram, esse foi um desígnio perseguido e concretizado».

«Os centros funcionavam sobretudo como espaços com fins educativos, área em que o Estado estava ausente. Tiveram, por isso, um papel muito social na sua génese. O Estado não conseguia contribuir com uma presença operacional. Estava-se no final do século XIX, e essa ausência prolongou-se pelo início e até meados do século XX», assinalou.

Para o presidente da direção do CERAM, «com o progresso do Estado social, que veio a consolidar-se ao longo das últimas décadas, a educação generalizou-se e na atualidade deixou de fazer tanto sentido essa vocação e esse papel dos centros para a educação republicana».

«Sobretudo no pós-25 de Abril, o papel operacional dos centros tem vindo a esvaziar-se enquanto espaços virados para a educação, e ainda bem. Sinal de que o Estado está a promover muito bem esse papel», adiantou.
O CERAM, prosseguiu, «é, presentemente o último sobrevivente dos velhos centros escolares republicanos. E o derradeiro a manter ainda um cariz operacional. Mas o foco mudou».

«Há um novo ímpeto, uma atualização dos objetivos operacionais. Já não se pretende substituir ou colmatar a falta do Estado no setor educativo. Agora o foco está na componente cívica, da cidadania, da consciência do papel do Estado, do papel do cidadão», disse.

Esclareceu que o CERAM tem promovido «a realização de encontros e seminários onde se discutem os valores republicanos, com a presença de diferentes segmentos da sociedade, nomeadamente pessoas de diferentes partidos e de diferentes setores económicos».

«As pessoas vivem numa república, dizem-se republicanas, mas muitas não sabem definir o que isso representa. O que é a república em si, qual o papel nos dias de hoje. É importante haver esse despertar para os valores republicanos. Ser republicano significa ter um conjunto de direitos e obrigações perante a sociedade», enfatizou.

O CERAM, adiantou, hoje em dia promove «ações formativas gratuitas, em escolas públicas, para manter o foco na educação cívica, valorizando o espírito de viver para a cidadania. O objetivo é acompanhar esse despertar para os valores republicanos».

E atirou: «Um certo esgotamento do papel dos centros na educação não faz os faz perder importância. Há valores, como a participação eleitoral e a democracia que se mantêm atuais. Aliás, inicialmente os centros, como o CERAM, tinham inclusive o tema eleições no nome original. Chegou a Chamar-se Centro Escolar Eleitoral e Republicano Alferes Malheiro».

Alfredo Baptista, reconheceu que no processo que levou à implantação da República, a 5 de Outubro de 1910 e com o objetivo de tornar o Estado laico, a igreja, enquanto estrutura dominante no setor educativo, foi afastada dessas tarefas em muitos casos de forma violenta e através de comportamentos extremados de partidários republicanos.