Um dia destes, numa visita de rotina ao dentista, enquanto estava a subir a escada, subia à minha frente uma menina de uns dois ou três anos de mão dada à mãe. Despertou-me a atenção aquela voz miudinha e inocente que ia colocando todo o tipo de questões e ouvia atentamente as respostas, ao mesmo tempo que, a cada degrau – demasiado alto para o comprimento das suas pernas – tentava equilibrar-se e controlar o rodopio involuntário que o corpo fazia em torno da mão dada à mãe.
Maior do que o desafio das escadas era a dúvida e a incerteza da primeira visita ao dentista. Como seria a sala? O que iria lá fazer? Quem a iria receber? Seria uma pessoa simpática, antipática, um senhor, uma senhora? A mãe estaria com ela? Haveria lá outros meninos? Haveria brinquedos?
Se a visita de um adulto ao dentista nem sempre é feita de ânimo leve, ainda que já lá tenha estado dezenas de vezes (e talvez por isso mesmo) imaginemos a de uma criança que é levada pela mão da mãe, sem saber o que a espera. Que, apesar de todas as respostas e explicações, por mais detalhadas e apaziguadoras, a deixa entregue às suas dúvidas e receios, à sua imaginação imensamente fértil, que a faz equacionar um número infinito de cenários.
E, tal como a ida ao dentista, há tantas outras idas, tantas outras visitas e experiências que são vividas pela primeira vez, onde tudo pode ser potencialmente mágico e encantador, mas também tenebroso e assustador. O que esperar? Como preparar-se?
A criança vai porque acredita cegamente nos pais ou em quem a leva. Porque lhe garantem que é para o seu bem, por mais assustador e duvidoso que o cenário lhe possa parecer, porque sabe que jamais a levariam a um sítio ou a fazer algo que a prejudicasse.
Neste sentido, a palavra e o conforto dos pais é essencial. É só deles que depende a sua confiança, a segurança para dar o primeiro passo para entrar no gabinete do dentista, mas também na sala do pré-escolar, na primeira festa de anos. Na vida para além daquela que já conhece, a vida dos sítios desconhecidos, das situações novas e das pessoas que lhe são estranhas.
É nestes momentos de total incerteza e, por vezes, de medo, que a empatia dos pais é ainda mais importante. Bem como a paciência, para com quem coloca a mesma questão 100 vezes até perceber exatamente a resposta, até sossegar o coração e ter confiança para seguir em frente. É importante poder prepará-los, perceber que o entendimento não é igual ao nosso, que algumas situações que para nós são tranquilas para eles podem representar um enorme desafio.
E, ao mesmo tempo, não deixar que os nossos próprios receios se transformem nos receios deles, não deixar escapar os nossos medos para aquele terreno fértil onde os monstros têm a capacidade de se reproduzir a uma velocidade incontrolável e em número imprevisível.
Tentar criar pontes seguras para que os mais pequenos experimentem o desconhecido ainda de mão dada, mas com confiança, e para que possam transformar o medo em coragem.