Ainda hoje não entende de onde surgiu todo o amor que tem pelas artes. No entanto, nunca teve dúvidas de que o seu caminho seria por ai. De Montemor-o-Novo rumou a Lisboa em busca do seu sonho e hoje parece vivê-lo na sua plenitude. Aos 29 anos, é uma mulher livre e leve, mas que vai aos lugares mais escuros para se encontrar com as suas personagens. Sílvia, da famosa série ‘Rabo de Peixe’, é uma delas. A 2.ª temporada já está disponível na Netflix.
Vemo-la no teatro, no cinema e televisão a viver outras vidas. Quem é a Helena fora dos holofotes?
Não sei e estou muito ok com isso! (risos) Cada vez tenho menos necessidade de me pôr um label, fechar-me numa caixa ou caracterizar-me. Eu sou assim hoje, agora… Amanhã se calhar sou diferente! Sei quem é que eu fui e sei partes de mim que quero atingir.
Já disse que se considera uma pessoa leve, que o que lhe tira a paciência é a lentidão (as pessoas que não são desenrascadas). Isso diz muito sobre a maneira como foi educada?
(risos) Diz tudo sobre a forma como eu fui educada! Ao contrário do que se diz nas anedotas, os alentejanos são malta muito desenrascada! Há uma prontidão diferente. Talvez pela falta de meios, pela necessidade… Acho que esta malta teve de se arranjar e desenrascar, de maneira que as coisas não são propriamente um problema. É por isso que fico um bocadinho mais impaciente quando vejo que há alguma coisa que demora muito tempo… As burocracias, por exemplo! (risos) Quando uma coisa precisa de todos aqueles passinhos quando tu vês que existe um atalho. A lentidão associada a isso… Porque a lentidão associada ao teu tempo e à profissão da tua vida, isso eu procuro cada vez mais! Quero que as coisas sejam cada vez mais lentas, dilatar o máximo possível o tempo, porque nós vivemos muito, muito, muito rápido e eu não quero nada que as coisas me passem ao lado! Quero poder aproveitar o máximo possível a minha família, amigos, profissão! Por isso, nesse campo, muita lentidão e muita leveza, sim! (risos)
As memórias de infância levam-na sobretudo à pastelaria do seu pai?
As que estão mais presentes, sim! Acho que foi uma altura super importante que definiu muitas coisas na minha vida. Foi uma zona muito estrutural para a minha personalidade, porque os meus pais trabalhavam os dois na pastelaria. Eu passava muito tempo lá. Ajudava-os. Também passei muito tempo no salão com a minha mãe. Tinha de ser! Lá está… Uma pessoa tinha de se desenrascar. Também recordo muito bem a casa da minha avó. Trabalhando numa pastelaria, o meu pai acordava e acorda todos os dias às três horas. Eles tinham um horário de trabalho difícil e eu passava muito tempo com ela.
Nasceu em Montemor-o-Novo, no Alentejo. Noutras entrevistas já disse que queria ir para a Escola de Teatro de Cascais, mas era muito nova na altura, e os seus pais não a deixaram ir para longe. Decidiu, então, que iria para a Escola André de Gouveia, em Évora, que tinha o curso de Artes Performativas. Já dançava e cantava. A sua professora de ballet sempre lhe disse que devia ser atriz. O amor pelas artes nasceu consigo? Essa professora teve influência nas suas escolhas? Podia ter-se ficado apenas pela dança…
Pois podia… Na verdade, eu achei durante algum tempo que era isso que ia acontecer. Quer dizer… Só no sonho, porque até eu ir para o secundário achava que ia ter de tirar outro curso qualquer. Não foi por mal, mas o meu pai queria muito que eu estudasse alguma coisa que pudesse dar uma vida mais estável, emocional e financeiramente. Sabendo o que sei hoje, percebo perfeitamente o que é que ele queria dizer com isso! (risos) Mas eu não sei… Tenho dificuldade em recordar-me do momento em que decidi ser atriz. Acho que as coisas se foram desenrolando. Eu não tenho ninguém na minha família ligada às artes, pelo menos de uma forma super direta. A única pessoa que lia livros era a irmã do meu pai. Não ia ao teatro, apesar de existir um grupo de teatro em Montemor-o-Novo, nunca estive envolvida. Não tenho ninguém na minha família que cante ou que dance… (risos) Foi muito forte. Nunca me imaginei a fazer outra coisa… E acho que teve muito a ver com a minha mãe. Acho que ela acreditou tanto em mim e impulsionou-me tanto que ter esse suporte se calhar foi o que me o permitiu não me desviar deste caminho.
Só mais tarde ingressou na Escola Superior de Teatro e Cinema (antigo conservatório), em Lisboa. Encontrou aquilo que procurava nesse curso? Se não me engano já admitiu que ficou um bocadinho desiludida…
Estagiei no O Espaço do Tempo – estrutura artística transdisciplinar, fundada em 2000 pelo coreógrafo Rui Horta, no Convento da Saudação, em Montemor-o-Novo -, e conheci artistas incríveis. Estava desejosa de vir para Lisboa! Vim cheia de garra. Eu era muito obcecada com o trabalho, muito perfeccionista e senti que a escola não era isso, pelo menos da forma como eu idealizei. Tinha uma expectativa muito grande. Foi isso que os meus professores, Carlos e Margarida, me passaram em Évora. Isso desiludiu-me muito. Foi difícil porque eu tinha essa vontade toda de vir e, de repente, estava num conflito moral. Tive a convencer o meu pai a vir tirar uma licenciatura em teatro e, de repente, não estava a gostar… Parei um ano, fui trabalhar, voltei… E ainda bem que parei e voltei! Correu tudo bem! Conheci três pessoas maravilhosas, criei uma estrutura artística que é a Bestiário. Já estamos juntos há oito anos, amo essas pessoas, amo o trabalho que estamos a desenvolver… São provavelmente o maior input na minha carreira e naquilo que eu sou enquanto atriz hoje, mais do que todos os trabalhos que eu já fiz!
Nessa altura, que ideias tinha deste universo artístico? Há quem tenha uma ideia romantizada…
Pois… Acho que era o meu caso! (risos) Eu achava que era tudo super reto e super sério. Tinha uma ideia do teatro e do cinema só dos filmes que eu via. Não conhecia ninguém ligado a essa área. Depois, através dos meus professores, fui conhecendo esse mundo. O meu professor Carlos tinha estudado no Conservatório há muitos anos… As coisas eram mais sérias no tempo dele. Agora acho que as pessoas levam tudo muito menos a sério, mas se calhar sou eu que estou a generalizar… Acho que romantizei muito e essa foi a maior desilusão. A culpa não é da escola, de todo! É das histórias que eu criei na minha cabeça.
Tal como dizia, fundou a Bestiário com mais três colegas e amigos. No vosso site dizem querer investigar, com as vossas criações, a nossa herança cultural reavivando as histórias biográficas e populares. Sente que em Portugal isso é cada vez mais importante?
Não sei se é cada vez mais importante… Também tenho vindo a sentir que, apesar dos artistas terem um papel social e poderem ter um papel educativo, não é obrigatório. A arte também pode ser puro entretenimento! Se os artistas não podem ser livres, então quem é que pode? Acho que cada um deve mesmo fazer o que lhe apetecer enquanto artista! Por outro lado, o que nos apetece mesmo é explorar essa identidade cultural, demográfica, ir a zonas mais antropológicas. Não porque queiramos imprimir um selo moral nos nossos projetos, mas porque gostamos de pensar sobre essas coisas. Não queremos educar ninguém. Não somos, de todo, panfletários. Tentamos muito que isso não aconteça. Queremos fazer as coisas com muito amor, com muita propriedade pessoal. No fundo só nos queremos divertir, mandar para fora coisas que nos estão na cabeça.
Então, ao contrário de muitos dos seus colegas, não considera que os artistas tenham quase que uma missão intrínseca de salvamento…
Acho que não. Tu tens a missão que quiseres ter enquanto pessoa! Se levares isso para o trabalho, fixe. Pelo menos a minha missão enquanto pessoa e que transborda para o meu trabalho, porque não consigo propriamente separar as duas coisas, é habitar num lugar de empatia e paz. Tenho a certeza absoluta que se eu estiver nesse lugar, isso vai ter repercussões no ambiente e nas pessoas à minha volta. Não o faço porque quero influenciar as pessoas… Faço-o sobretudo por mim. (pausa) Espera… Eu também faço porque quero influenciar as pessoas! (risos) Eu acredito mesmo que é isso que vai mudar o mundo! Não é Shakespeare que vai mudar o mundo, é a forma como tu o fazes. A forma como tu estás na vida, como pedes um café. Não acho que tenha essa obrigação enquanto artista, acho que tenho essa obrigação enquanto cidadã!
Não podia deixar de referir o seu primeiro projeto a solo, CANTADEIRAS, deste ano que, mergulha nas histórias e tradições das mulheres camponesas do Alentejo. Escreve, canta, dança, encena, atua… Encontra-se em todas essas formas? Considera que esse desdobramento é uma mais valia?
Eu acho que pode ser uma super mais valia e uma forma de potenciar qualquer que seja a obra em que eu esteja envolvida. Por outro lado, se não for bem gerido, é mau. É muita coisa. Eu acho que tenho tido sorte! (risos) Tenho conseguido canalizar mais ou menos bem essas valências todas que não são propriamente valências! (risos) Acho que fui descobrindo as coisas e estou a ir experimentando. Nunca pensei ter uma companhia, associação, com outras pessoas. Nunca pensei fazer um projeto a solo… Acho que vem uma coisa e eu quero experimentar… Sou essa pessoa que se atira, porque há coisas que aparecem e eu tenho de pôr cá para fora. Essa experimentação está a ser tão boa e tão fixe! Especialmente agora em que estou numa fase em que não tenho medo nenhum de errar! Eu só quero fazer!
‘Estar triste e querer a vida de um homem, é coisa de mal agradecidas’, diz a dada altura no espetáculo que está disponível na RTPPlay. O espetáculo é muito intenso, vem das entranhas. Ser mulher ainda continua a ser difícil nesta área? Sente que é levada a sério?
Essa frase… (risos) Para fazer esse espetáculo tive muitas entrevistas com mulheres, maioritariamente da minha terra. Quase todas tocaram nos mesmos pontos. A história variava aqui e ali, mas era quase sempre a mesma coisa. O trabalho que eu faço nesse espetáculo é, no fundo, fazer uma espécie de discurso esquizofrénico de várias mulheres até chegar a mim. O que é que ficou comigo, o que é que eu quero, o que é que eu não quero, o que é que eu quero resgatar, aprofundar, largar… Deparei-me, muitas vezes, com esse sentimento de: «Eu não estou bem, eu sei que não estou bem, mas eu não mereço sentir que não estou bem! Tens uma casa, comida, filhos». O Alentejo é das zonas mais pobres do país e quando digo que as pessoas sentem que não podem ser mal agradecidas, são pessoas que estão numa classe social e económica muito baixa. Isso tocou-me muito. «Como não? Como é que não podes dizer que não estás bem? Como é que ainda te julgas assim?».
É daí que nasce essa frase…
É sim! Infelizmente ainda sinto que não há uma validação pelo trabalho da mulher como há pelo do homem, embora as coisas já estejam diferentes. Acho que fizemos um caminho extraordinário, vejo sempre esperança. Claro que ainda é preciso consciencializarmos sobre isso, é mesmo preciso não estarmos calados. É nosso papel enquanto cidadãos olhar para o outro, perguntarmos se o outro está bem… Temos de dar a mão às pessoas. Acho que nesse sentido, a mulher tem sofrido muito mais. Nós já podemos fazer aquilo que quisermos da nossa vida pessoal e profissional, mas eu cada vez sinto mais necessidade, quando vou para um teatro, em tour com algum espetáculo – maioritariamente as equipas são masculinas -, de afirmar a minha posição. Aprendi com uma amiga um truque que é esticar a mão. Já não vou com beijinhos, apesar de sentir que isso aproxima as pessoas. Tenho de marcar uma posição. Posso ter este ar de miúda de 20 anos, mas já estou quase a fazer 30. Têm de me levar a sério. Isso é uma aprendizagem! Não só das mulheres, mas das pessoas em geral… O saber dizer que «não».
É uma das protagonistas da série ‘Rabo de Peixe’. De que forma surgiu a oportunidade? Como é que a recebeu?
A oportunidade surgiu porque o Bernardo Almeida – que é o diretor de casting -, me viu no teatro (e acho isso super fixe). Estava a fazer um espetáculo do Ricardo Neves-Neves que não tinha nada a ver com isto! Ele gostou tanto daquilo que me convidou para fazer uma audição. Fico tão grata. A verdade é que fui passando e nunca imaginei que ia ficar. Estava sempre a dizer: «Isto não é para mim!». Eu acho que isso pode ter ajudado de alguma forma porque eu não estava nervosa a fazer as audições. Estava só do género: «Fixe! O texto é fixe! Vou fazer, a malta vai-me conhecer, mas estou a sentir que isto não é para mim!». O processo foi muito giro. E depois quando efetivamente aconteceu… (pausa) Olha, não sei! Agora que penso realmente nisso, todas as coisas que me têm acontecido, acontecem assim dentro de mim. Eu não fico muito agarrada a isso. É mais um: «Bora lá!». Por outro lado tenho – e é uma coisa que eu tenho mesmo de trabalhar – de me dar valor. Sentir que consegui, que mereço. Ficar orgulhosa de mim. Às vezes é fácil – especialmente os atores -, entrarem nesta lógica de: «Ah! Consegui isto, mas espera lá… Há mais… E depois?». Estou a fazer um bocado esse trabalho de ficar orgulhosa daquilo que fiz.
O que é que nos pode contar sobre a segunda temporada que está quase a estrear?
Não posso contar muita coisa. (risos) Mas posso dizer que a Sílvia ganha um destaque um bocadinho maior. A personagem evolui. Vamos ter muitos colegas novos. Se a história anterior já era muita coisa, esta vai ser ainda mais!
Diz que quando está a criar, a descobrir as suas personagens, isso vem de um sítio que não é nada leve. É na escuridão que também nos encontramos? Como é que criou a Sílvia?
Que fixe! Foste mesmo fazer um grande trabalho de casa! (risos) Isso é verdade! Mas é uma coisa que eu quero mudar, porque já chega de sofrer! Quer dizer, para ser honesta isto é um tipo de sofrimento que até sabe bem, mas não quero ir só a esse sítio buscar essas coisas! (risos) Quero ser feliz! Mas sim, fui buscar a Sílvia a uma zona mesmo muito negra. Também neste trabalho não podes bem escolher onde é que vais buscar as coisas… Se aquela personagem te pede uma coisa, se calhar tens mesmo de ir a zonas menos fixes para conseguires trazer o melhor material possível para lhe dares vida. Mas tanto nesse, como na maior parte dos trabalhos que tenho feito, tenho achado que é nesses lugares mais negros que encontro a firmeza para poder fazer essas coisas. Ainda não acabou… Sei que vou ter de lá mexer… Bendita terapia! (risos) Mas quero muito descobrir – e acredito que estou a conseguir -, um lugar leve, de esperança, de suavidade. Acho que há coisas bonitas e enriquecedoras para ir buscar a essa zona. Quero descobrir.
Ela é uma mulher forte, mas cheia de fragilidades escondidas…
Imensas… Às tantas até criei uma imagem para isto… Essa porcaria toda que ela tem dentro dela aglomera-se e acaba por criar uma bola que vai ficando cada vez mais dura, porque aquilo é tão tenso… Quanto mais se junta, mais dura fica, mais difícil é penetrar e, por necessidade de não partir, tem de criar essa dureza à volta. Por isso é que eu acho que ela é assim dura. Mas bolas… Ela é uma rapariga que não teve uma presença maternal saudável, muito menos paternal, e isso cria toda uma ausência afetivo-emocional. Ela não tem ninguém que a proteja, por isso teve que criar essa carapaça, proteger-se a ela própria. Foi um trabalho muito giro de fazer que, na verdade, não é assim tão desconhecido para mim. Não estou a dizer que a minha educação foi assim. Amo os meus pais, acho que eles fizeram um ótimo trabalho, mas na nossa geração houve ainda alguma dificuldade em pensar numa educação afetivo-emocional. É mais uma educação eficiente, porque também se vivia mal. Sobretudo ali no Alentejo. Era muita pobreza. Às vezes sinto que a malta da minha geração tem assim algumas carências afetivas, porque os pais estavam mais preocupados em não deixar faltar educação, alimento, etc. Felizmente, as minhas amigas estão a ter bebés e eu sinto que as coisas estão a mudar.
O que é que foi mais desafiante em todo este projeto?
Eu acho que o mais desafiante foi conhecer a cultura e a forma de estar das pessoas em Rabo de Peixe, embora não estejamos a fazer um documentário. Não estamos a retratar fielmente, mas tentámos também perceber qual era a ginga do falar, do corpo. Isso foi desafiante, porque é mesmo diferente. Esse trabalho de investigação, por norma e por falta de orçamento, faz-se pouco. Gostava de fazer mais coisas assim.
Deram-vos muita liberdade no processo criativo. Gosta de trabalhar dessa forma?
Sim. Acho que não tive muitos processos em que não tivesse essa liberdade. Tive assim um ou dois e, de facto, não me dei tão bem. Não fiquei tão contente com o meu trabalho e não estava tão feliz no processo. Eu não sou uma pessoa de ir com uma coisa fixa para o set. Faço o trabalho todo em casa e depois tento ao máximo nem sequer pensar sobre isso, só ir! Mas é inevitável pensar: «Estou a pensar nesta cena, nisto e naquilo, estou a fazer conexões da personagem». Depois chego ao set e o realizador – isto aconteceu muitas vezes com o Augusto Fraga -, diz: «Gostava que ela dissesse isto desta forma!». E eu: «Ah! Isso não tem nada a ver com o que eu achava! Bora!». O que eu mais gosto no meu trabalho, especialmente em séries, é quando alguém me dá uma indicação que foge daquilo que eu pensava. Esse trabalho de me colocar nessa indicação, naquilo que eu não tinha em mente, é o real exercício do ator. Acho isso muito giro. Fico sempre muito entusiasmada com essa busca.
Acredito que a série seja o projeto mais ambicioso no qual já participou… O orçamento é diferente, a produção, toda a dimensão. Tal como dizia, faz televisão, teatro, cinema… Infelizmente o panorama não é esse na maior parte dos casos. Há muitas ideias, mas poucos recursos. Acredito que, muitas vezes, seja frustrante…
(pausa para reflexão) Isto é difícil. Claro que a Netflix teve apoio governamental, mas o maior apoio financeiro é de uma identidade privada, por isso é que o resultado não se pode comparar com outros projetos. Embora eu ache que isso dê uma imensa esperança. Apesar de ter sido um orçamento maior do que aquilo a que estamos habituados, é um orçamento muito inferior àquilo que outros países têm! E com isso fizemos uma coisa inacreditável! Temos de ser positivos! É difícil, mas também já se fez um longo caminho. Também é preciso acreditar que as coisas vão melhorar! Louvar o esforço que tem sido feito. Claro que era incrível ter mais orçamento para a Cultura, é necessário! É preciso tomar mais atenção à formação de públicos, à educação, mas se formos olhar para trás… Já fizemos um longo caminho! Que a RTP continue a ter estrutura para apoiar, porque se não for ela, o ICA, não há projetos, não há investimento privado… Eu só desejo é muita força aos meus colegas. Não desistam. Porque quando vais submeter um projeto à DGARTES, quando olhas para a lista dos projetos que não ficaram, de colegas que já estão a tentar há anos, é assustador. Não sei onde é que está a solução, mas também não quero sofrer mais. É continuar a trabalhar, tentar adaptar os projetos aos orçamentos que existem. Não estar a tentar criar uma coisa megalómana que depois não conseguimos fazer. Na Bestiário somos quatro e tentamos desdobrar-nos em todas as tarefas possíveis imaginárias para fazer um projeto. Já chegámos à conclusão que, às vezes, mais vale fazer uma coisa mais pequena. Não é por ser mais pequena que não é grande no seu conceito. Também acho que é preciso restruturar pensamentos sobre dinheiro e conceito. Continuar a queixarmo-nos que não há dinheiro, também não vai levar a nada.
O que é que nos pode contar sobre os próximos projetos? Quais os seus sonhos?
Deixo as coisas acontecerem naturalmente, mas não sou pessoa de ficar parada! (risos) Estou numa fase muito gira da minha vida pessoal e profissional. Estou mesmo a atirar-me de cabeça para experimentar coisas. Sei que há coisas que quero fazer e atingir, mas com muita leveza! (risos) Eu estou a semear, não estou obcecada. Estou a pôr as cartas em cima da mesa e acredito que esse investimento vai ter retorno! Coisas mais concretas… Para o ano vou filmar uma série que me deixa muito entusiasmada. Chama-se Águas Passadas, uma adaptação do livro de João Tordo. Vou ser a Pilar, a protagonista. Vai ser outra que me vai obrigar a chafurdar nas coisas difíceis! (risos) Não é nada que eu não goste! Vamos filmar para o ano. E o CANTADEIRAS vai acontecer ao vivo no dia 1 de novembro em Montemor-o-Novo. Vai ser a única vez que vou fazer esse espetáculo ao vivo. Vai ter outros elementos que não teve na RTP. Quero fechar esse ciclo.No meio disto tudo, estou a preparar um projeto muito especial para mim. Uma coisa muito pessoal que vem do CANTADEIRAS. É um sonho que está na gaveta há muito tempo. Achava que já tinha posto atrás das costas, mas afinal não. Voltei a ganhar confiança em mim para apostar nele. Não posso dizer já o que é, mas de todas as coisas que tenho à frente é aquilo que mais me entusiasma. Vai ser muito diferente daquilo que as pessoas estão habituadas a ver de mim. Acho que o que vai acontecer comigo daqui adiante é: há uma coisa que eu quero muito dizer e eu hei de ter de pô-la cá para fora de uma forma ou de outra! Fazer acontecer!