Orçamento do Estado sem margem para alterações

O Governo quer manter a linha de consolidação das contas públicas e afasta a ideia de avançar com medidas que representem custos permanentes, como a subida de pensões ou o aumento do SMS além dos 920 euros. Economistas ouvidos pelo Nascer do SOL já tinham perspetivado trajetória de continuidade

O Orçamento do Estado para o próximo ano foi aprovado sem surpresa – um cenário que já tinha sido admitido pelos economistas ouvidos pelo Nascer do SOL e cujo desfecho já era previsível, tendo em conta que o Partido Socialista já tinha admitido a hipótese de se abster em nome da estabilidade, o que se veio a concretizar, permitindo assim ‘salvar’ o documento, que contou com os votos favoráveis do PSD e CDS-PP, mas com o chumbo do Chega, Iniciativa Liberal, Livre, PCP e Bloco de Esquerda. Já com o Orçamento aprovado, os socialistas aproveitaram para deixar um recado ao Executivo de que não seria o PS a «dar uma desculpa ao Governo para o seu falhanço». 

É certo que, depois de aprovado na generalidade, não se prevê grandes alterações na especialidade, uma vez que Luís Montenegro já veio afirmar que a margem para alterações é mínima, com a justificação de que se vive «num contexto internacional de incerteza e insegurança», afastando nomeadamente o aumento permanente das pensões. 

Uma posição que já tinha vindo a ser repetida pelo ministro das Finanças . «Se aumentamos de forma extraordinária as pensões, estamos a aumentar a despesa e a despesa estrutural. Uma coisa diferente foi aquilo que o Governo fez em 2024 e 2025 em função da margem orçamental, e não do saldo da Segurança Social, ao atribuirmos um suplemento extraordinário aos pensionistas. E isso tem a flexibilidade de não criar despesa estrutural e poder ser gerido ano a ano», tem afirmado.

No entanto, Joaquim Miranda Sarmento acenou com a medida de baixar em dois mil milhões de euros o IRS até 2029, tal como estava previsto no programa eleitoral. E referiu que para este ano está não só prevista uma atualização dos escalões em 3,51% como também a redução das taxas em três pontos percentuais entre o 2.º e o 5.º escalões. «Vamos em 2027, 2028 e 2029 continuar com o ritmo próximo dos 500 milhões em cada ano e, portanto, procurando continuar a desagravar a carga fiscal das famílias», disse o ministro.

Ainda assim, o Governo deixou em aberto a atribuição de um novo suplemento extraordinário aos pensionistas, já que está dependente da margem que a execução orçamental possa dar ou não. De acordo com a ministra do Trabalho, a ideia é proteger os rendimentos mais baixos e, ao mesmo tempo, honrar o compromisso de manter a sustentabilidade do sistema. «Foi o Governo do PSD que descongelou as pensões mais baixas e é o Governo da AD que, por várias vias (aumentos do Complemento Solidário para Idosos e suplementos extraordinários que se somam à atualização), está a proteger os pensionistas com menores rendimentos», disse Rosário Palma Ramalho. 

Outra resistência diz respeito ao aumento do salário mínimo nacional, além dos 920 euros, tal como foi acordado com os parceiros sociais. Trata-se de um aumento de 50 euros (5,7%) face aos atuais 870 brutos mensais. O acordo em vigor prevê que o valor do salário mínimo evolua progressivamente para 970 euros em 2027 e 1020 euros em 2028. Já em relação ao salário médio, o objetivo inscrito no acordo é atingir os 1890 euros em 2028.

Contas certas: objetivo mantém-se

A resistência no aumento de despesa permanente é feita em nome do caminho das contas certas. Miranda Sarmento referiu que «Portugal conseguiu passar de um nível elevado de dívida pública para um nível intermédio», tendo reduzido «o peso da dívida pública em percentagem do PIB. De 96,9% do PIB em 2023, Portugal atingirá uma dívida pública de 87,8% do PIB em 2026, sendo a primeira vez, em 16 anos, que este rácio ficará abaixo dos 90%».

E deixa um alerta:«Este esforço não pode ser interrompido e temos de manter um ritmo de redução da dívida pública em 3-4 pontos percentuais do PIB por ano». Ao mesmo tempo, promete reduzir a burocracia, considerando «que asfixia as empresas e os cidadãos e que limita e atrasa o investimento privado, sobretudo o investimento direto estrangeiro» o que, no seu entender, terá «um forte efeito no PIB potencial e na capacidade de colocar a economia a crescer 3% no final da legislatura».

Recorde-se que João César das Neves já tinha declarado ao nosso jornal que este Orçamento «é de continuidade», daí não apresentar grandes alterações de estrutura. Mas apontou uma razão: «Imagino que isso se deva à fragilidade parlamentar do Governo».

Também Paulo Monteiro Rosa, economista do banco Carregosa, lembrou que a escolha das linhas orçamentais depende essencialmente do contexto macroeconómico e do enquadramento orçamental europeu, daí o Governo ter seguido «uma trajetória prudente, compatível com a consolidação das contas públicas e a redução da dívida». No entanto reconheceu que, do ponto de vista estritamente técnico, existiriam alternativas possíveis, como dar uma maior ênfase ao investimento público ou um alívio fiscal mais expressivo, mas lembrando que «cada opção teria implicações distintas em termos de sustentabilidade orçamental e impacto no défice estrutural, ou seja, o saldo orçamental corrigido dos efeitos do ciclo económico e das medidas temporárias ou excecionais».