Tinha 15 anos quando sentiu a beleza fechar-se sobre ele como uma armadilha. Estava no mínimo ambivalente em relação a uma carreira como ator, tendo sido empurrado pela avó, que o arrancou de um ensaio da sua banda para o levar ao casting, e não poderia ter antecipado como, ao ser-lhe dado o papel de Tadzio em Morte em Veneza, obra-prima do realizador italiano Luchino Visconti, isso iria persegui-lo toda a vida. O filme não apenas fez dele um objeto de fascínio, mas uma vítima da sua própria imagem. O cineasta italiano procurava um adolescente que condensasse a pureza e a corrupção, a inocência e o declínio, e encontrou nele uma forma que parecia servir esse propósito até à crueldade. Morte em Veneza constrói-se sobre um olhar que não pede correspondência: Tadzio existe apenas para ser visto, e essa passividade de algum modo encerrou o destino do ator que o encarnou.
Na adaptação do romance de Thomas Mann ao cinema, Björn Andrésen ficou colado à imagem desse efebo de feições andróginas, vestido de marinheiro, que se torna o centro imóvel do desejo de Gustav von Aschenbach, o compositor envelhecido interpretado por Dirk Bogarde. Numa Veneza dominada pela peste, onde o esplendor se confunde com a decomposição, Aschenbach arrasta consigo o pressentimento da morte, enquanto Tadzio encarna o fulgor inatingível da juventude. Entre ambos estende-se o espelho onde o tempo se contempla e se desfaz.
O encontro entre os dois dá-se pela primeira vez num elevador, onde trocam um olhar sem palavras, e Aschenbach fica prisioneiro dessa visão, seguindo o rapaz pela cidade e transformando-o num símbolo da sua obsessão estética e erótica – até morrer, numa cadeira de praia, estendendo a mão para ele.
Durante as filmagens, Visconti media-lhe os gestos, corrigia-lhe o modo de andar, o ângulo do rosto, como se esculpisse uma figura em gesso. Quando o filme estreou, em 1971, apresentou-o à imprensa como «o rapaz mais belo do mundo», um epíteto que se colou a ele como uma chaga. Catapultado para o estrelato internacional, viu-se capturado por tudo aquilo, perdendo o rumo. No seu livro de memórias, Dirk Bogarde: An Orderly Man (1983), o ator mais velho descreveu Andrésen como «o Tadzio perfeito», dotado de «uma beleza quase mística», acrescentando, porém: «A última coisa que Björn alguma vez quis, tenho a certeza, foi estar no cinema».
Criado pela avó, depois de a mãe se suicidar quando tinha apenas 10 anos, foi ela que o empurrou para o teatro e a moda – «Ela queria uma celebridade na família», confessaria Andrésen anos mais tarde. Nascido a 26 de janeiro de 1955, em Estocolmo. Os pais não eram casados, e ele não chegou a conhecer o pai biológico, um artista que morreu num acidente dois anos depois do seu nascimento. A mãe, Barbro (Erixon) Andrésen, poetisa e artista, viria a casar-se com Per Andrésen. O rapaz começou a estudar piano aos seis anos e, pouco antes dos 15, tocava numa banda pop-rock quando a avó o levou, quase à força, à audição com Visconti.
Aquele período conturbado que se seguiu à estreia do filme viria a estar na base do documentário The Most Beautiful Boy in the World, realizado por Kristina Lindström e Kristian Petri, que se estreou em 2021, 50 anos depois do filme de Visconti. Neste, Andrésen recorda como Visconti o levou, pouco depois da estreia do filme, a um clube gay com um grupo de homens experiência que o deixou «muito desconfortável». «Sabia que não podia reagir. Teria sido suicídio social. Mas foi a primeira de muitas situações semelhantes», contou. Disse ainda que, se Visconti fosse vivo, lhe diria para «ir à merda», e que o realizador «não queria saber dos sentimentos de ninguém», acrescentando: «Nunca vi tantos fascistas e idiotas como no cinema e no teatro. Luchino era o tipo de predador cultural que sacrificaria tudo e todos pela obra». Andrésen recorda-se ainda da sensação de, por esses dias, se sentir cercado por «olhares vorazes, lábios húmidos e línguas a rolar», recorrendo ao álcool para suportar a atenção indesejada. Suspeitava que Visconti, homossexual assumido, o estivesse a testar para ver se ele também o era.
Esmagado pela súbita fama, intensificada quando Visconti declarou, na estreia londrina do filme, que ele era «o rapaz mais bonito do mundo», durante a conferência de imprensa em Cannes, onde o filme concorreu à Palma de Ouro, Visconti já se mostrava pronto a descartá-lo: disse que Andrésen já fora mais bonito, que o captara no auge, durante as filmagens, e que estava agora «numa idade ingrata», mas que «talvez viesse a ser um homem atraente».
Após o filme, Andrésen viajou para o Japão, onde a obra foi um êxito estrondoso. Tornou-se estrela pop e modelo, apareceu em anúncios e conquistou uma enorme legião feminina de fãs. Apesar disso, as suas aspirações sempre estiveram na música: tornou-se pianista e compositor talentoso. Continuou a atuar, participando em mais de 30 filmes e séries de televisão, sobretudo na Suécia. Descreveu a sua carreira como «caótica» e disse que Tadzio o perseguira pela vida adulta. «A minha carreira é das poucas que começou no topo absoluto e a partir daí só desceu». «Foi solitário», adiantou.
Teve dois filhos com a ex-mulher, a poetisa Suzanna Roman: a filha, Robine, e o filho, Elvin, que morreu com nove meses de síndrome da morte súbita infantil, enquanto Andrésen dormia ao lado dele, em 1986.