David Mourão-Ferreira ‘sem estereótipos ou interdições’

«Acho que o meu pai foi esse tipo de pessoa a um tempo una e múltipla, sôfrega de vida e arte sem se conformar com estereótipos ou interdições», comentou o seu filho, David Ferreira.

O intelectual público. Essa figura quase extinta, que no século XX português anda rente à cena cultural francesa, encontra lugar cimeiro em David Mourão-Ferreira, poeta e ensaísta, ficcionista e tradutor, político, professor, jornalista, por estes dias recordado em Lisboa, em conferência e exposição.

Foi quarta e quinta-feira o colóquio David Mourão Ferreira: o Escritor, o Professor e a Biblioteca, a assinalar 25 anos do novo edifício da biblioteca da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. E prossegue no mesmo espaço uma exposição bibliográfica homónima até quarta, dia 5.

No colóquio juntaram-se Arnaldo Saraiva, Artur Anselmo, Fernando Pinto do Amaral, Helena Buescu, Paula Morão, Rui Vieira Nery, vários outros. Recordou-se a obra, claro. Antigos alunos citaram o «professor inesquecível». Falou-se do letrista que teve um papel considerado decisivo na renovação do fado pela voz de Amália Rodrigues. Camané cantou oito fados com poemas do homenageado.

«Acho que o meu pai foi esse tipo de pessoa a um tempo una e múltipla, sôfrega de vida e arte sem se conformar com estereótipos ou interdições», comentou-nos o seu filho, David Ferreira, presente no tributo. «A tudo entregando inteligência, sentido musical e uma capacidade única de sedução. Sedução para nos envolver nas suas reflexões sobre o amor, o tempo, a morte, a história. Sedução também nos ensaios, que são muitas vezes magníficas portas de entrada para as obras de outros autores».

David de Jesus Mourão-Ferreira (1927-1996) publica em 1950 o primeiro volume de poesia, A Secreta Viagem, seguido de Tempestade de Verão, e, já agora, encurtando o resumo de uma criação extensa, a novela Gaivotas em Terra, que numa reedição lhe atribuirá em contracapa um «invulgar fôlego de demiurgo» e uma «personalidade de artista autêntico».