Juan Carlos e Portugal

A abdicação de Juan Carlos cheirava-se. As suas limitações físicas eram evidentes, como ainda ficou claro há dias na sua visita a Lisboa para assistir à final da Champions.

Mas esta mudança de monarca tem implicações internas e externas importantes. Há uns anos, em conversa descontraída com Juan Carlos (em que também estava presente Francisco Balsemão), o Rei dizia-me que o príncipe Felipe estava a fazer um grande esforço para conquistar o coração dos espanhóis. Aí perguntei-lhe se os espanhóis não eram monárquicos. Ele respondeu: “São juancarlistas”.

Recorde-se que Juan Carlos foi o primeiro Rei após a ditadura franquista e o artífice da transição da ditadura para a democracia. Não era, pois, um Rei qualquer. Felipe é diferente. Não tem esse património do pai. E não tem a relação com Portugal que Juan Carlos tinha.

Nessa mesma conversa, tendo eu tentado dizer qualquer coisa em espanhol, Juan Carlos disse-me, convicto: “Fale em português!”. Para ele, Portugal, onde tinha vivido boa parte da infância e adolescência, era uma segunda pátria – e isso facilitou (e muito) as relações entre os dois povos peninsulares. Não sei o que pensa Felipe. Mas uma coisa é certa: as suas ligações a Portugal são ténues ou mesmo inexistentes. Portugal, para ele, será um deserto. A sua atenção dirigir-se-á para o centro da Europa e mesmo para a América Latina – e não para o extremo da Península. Nada, nas relações entre Portugal e Espanha, voltará a ser como dantes.

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