Há cem anos – morrer em Sarajevo

No domingo 28 de Junho de 1914 o arquiduque Francisco Fernando, herdeiro do trono imperial dos Habsburgo, e a sua consorte morganática, Sofia Chotek, visitaram Sarajevo, capital da Bósnia-Herzegovina.

Visita de risco: Sarajevo era considerada terra sérvia pelos radicais sérvios, a visita foi vista como uma provocação, e uma célula suicida de jovens fanáticos passou à acção, munida de pistolas, bombas e até de cianeto, caso fossem capturados.

Mas a bomba que lançaram sobre o descapotável Graef & Stift do arquiduque falhou, atingindo o carro dos ajudantes; o arquiduque prosseguiu a visita mas, no regresso da cerimónia na câmara, o motorista enganou-se e enfiou por uma rua errada, cruzando-se com Princip, que se retirava, frustrado com o falhanço. 

E, dessa vez, não falhou os dois tiros, disparados à queima-roupa: um na jugular do arquiduque, outro na barriga de Sofia. Dois tiros que prenunciaram e causaram muitos outros milhões de disparos. 

Desse domingo de Sarajevo resultou uma guerra – a Grande Guerra – de cujas consequências sairiam o comunismo, o fascismo e o hitlerismo. E 20 anos depois, outra guerra, a Segunda Guerra Mundial.

A partir de Sarajevo acabou um mundo, o mundo das monarquias constitucionais e oligárquicas europeias que governavam parte da humanidade, e nasceram outros. Como este nosso – democrático, capitalista e globalizado – onde os Estados europeus contam muito menos do que há cem anos.

Era necessário que a morte do arquiduque conduzisse à carnificina? A guerra era evitável? 
Não há certezas. Os deterministas explicam tudo pelas alianças rígidas contrapostas – Triple Entente versus Triple Aliance –, pela rivalidade anglo-germânica no centro europeu e pela conflitualidade russo-turco-austro-húngara nos Balcãs e no Próximo Oriente. Sobre os dispositivos diplomático-militares actuou uma dinâmica de princípios, garantias e ilusões – e funcionaram aspectos técnicos, como os tempos de mobilização.

Viena (o ministro dos Estrangeiros, Berchtold, e o chefe do Estado-Maior, Konrad von Altendorf, queriam dar uma lição a Belgrado) exigiu satisfações aos sérvios, com cláusulas humilhantes; estes recusaram e os russos apoiaram o irmão eslavo do sul. 

O kaiser Guilherme da Alemanha, por sua vez, garantiu os austríacos; e a França, que tinha uma aliança com a Rússia (e queria a révanche da Alemanha), ordenou a mobilização. 

A Grã-Bretanha, aliada da França, fazia da neutralidade belga uma questão de princípio, enquanto a Alemanha, de acordo com o plano Schlieffen, invadia a França, atravessando a Bélgica.

A máquina da guerra estava em movimento e iriam morrer dez milhões de homens em 50 meses. O provocador – Gravilo Princip – morrera antes do fim do conflito, em 28 de Abril de 1918, numa prisão austríaca em Theresienstadt. Em 1914 tinha menos de 21 anos e não podia ser enforcado.