Poderá a Malaysia Airlines resistir?

Naquele que se assume como o transporte mais seguro do mundo, qual é a probabilidade de a mesma companhia aérea enfrentar dois graves acidentes com centenas de vítimas em poucos meses? 

Poderá a Malaysia Airlines resistir?

O inédito na história da aviação aconteceu à Malaysia Airlines que em Março viu desaparecer um boeing 777 com 239 passageiros. E na quinta-feira passada, abatido por um míssil no leste da Ucrânia, perdeu outro triple seven, com 298 pessoas a bordo, que viajavam de Amesterdão para Kuala Lumpur. 

Segundo dados da Associação Internacional de Transporte Aéreo citados pelo The Guardian, só as 537 vítimas destes dois desastres ultrapassa a média de 517 mortes que a indústria da aviação comercial registou por ano, em média, entre 2009 e 2013.

Por isso, o futuro da companhia é uma grande incógnita. Poderá reconquistar a confiança dos passageiros? Resistirá aos danos reputacionais? Terá capacidade para resistir a um já débil desempenho financeiro? 

Nos últimos três anos, os resultados da companhia malaia não saíram do vermelho. Desde 2011 acumulou prejuízos de mil milhões de euros. E no primeiro trimestre deste ano continuava com resultados líquidos negativos de 104 milhões de euros, muito acima dos 65 milhões no mesmo período de 2013. No ano passado teve perdas de 279 milhões de euros.

Segundo analistas citados na imprensa internacional, os desfechos trágicos do voo MH370 a 8 de Março, e do MH17, na última quinta-feira, agravarão o funcionamento da companhia aérea que, vaticinam, poderá sucumbir até ao final do ano. 

Apesar da estratégia de reposicionamento e de avultados investimentos de quase mil milhões de euros postos em marcha ainda antes dos acidentes, a transportadora de bandeira da Malásia não tem conseguido travar a concorrência. A pesada estrutura de custos, a contestação sindical dos 20 mil trabalhadores e a pouca competitividade face ao sucesso de outras companhias asiáticas, como a Air Asia, também instalada em Kuala Lumpur, ou a Singapore Airlines e a Cathay Pacific, que estão entre as mais conceituadas do mundo, enfraqueceram a Malaysia Airlines. Mesmo com preços mais baixos, nunca conseguiu descolar completamente neste mercado, analisa a Time.

Em Junho, e ainda antes do sucedido na Ucrânia, o CEO da empresa, Ahmad Jauhari Yahya, já tinha assumido que o desaparecimento (ainda não esclarecido) do avião no Oceano Indico, “tristemente adicionava uma inesperada dimensão [à operação] danificando a nossa marca e a nossa reputação no negócio, acelerando a urgência de uma mudança radical”. 

Agora, o cenário é ainda mais negro, tendo em conta as indemnizações que poderá ter de pagar aos familiares das vítimas do despenhamento na Ucrânia, e que se somam às já devidas pelo acidente com o MH370.

Segundo a CNN, a lei internacional estipula que os pagamentos iniciais possam rondar os 150 mil dólares (110 mil euros) por cada uma das 537 vítimas dos dois voos.

Há ainda a perda de dois aparelhos, avaliada em 200 milhões de dólares (145 milhões de euros).

Depois da tragédia em território ucraniano, as acções da empresa chegaram a desvalorizar 18%, mantendo a rota descendente registada este ano, em que o valor bolsista já caiu 35%.

Detida em 69% pelo governo malaio, através do fundo soberano Khazanah Nasion, o futuro da empresa poderá passar por uma generosa injecção de capital, até porque já era público que mesmo que não tivesse sofrido o ataque de quinta, a Malaysia Airlines só teria verbas para se manter até 2015, segundo a Bloomberg. 

Especialistas internacionais apontam ainda outras soluções: ficar com o restante capital para reestruturar a empresa e privatizar, abrir falência e vender os activos, reestruturar, cortar as rotas menos rentáveis, mudar de marca. 

A decisão será sempre do governo malaio, que oficialmente, ainda não se pronunciou sobre o futuro da empresa.

ana.serafim@sol.pt