Aliados objectivos

Henry Kissinger, ao tempo secretário de Estado de Nixon e Ford, sempre defendeu que, em relação à Rússia (então União Soviética) e à China, a política norte-americana deveria ser tal que as relações de Washington com Moscovo e as relações de Washington com Pequim fossem sempre melhores que as relações entre Moscovo e Pequim.

Além dos factores que sempre levam à desconfiança e hostilidade entre potências vizinhas, a solidariedade ideológica comunista dos anos de Estaline fora substituída pela rivalidade na liderança do ‘anti-imperialismo’ mundial. Como alguém disse, «a China comunizara-se mas não se russificara» e o nacionalismo chinês desconfiava dos ‘sociais-imperialistas’ de Moscovo. Nixon e Kissinger aproveitaram a situação e reconheceram Pequim.

Hoje, as coisas são bem diferentes: se os factores de desconfiança se mantêm (embora as temidas migrações das populações fronteiriças chinesas não se dirijam para a Rússia mas para as cidades chinesas), outros têm contribuído para a aproximação russo-chinesa, firmada na hostilidade ideológica do Ocidente. 

Esta hostilidade não resulta apenas das alianças estabelecidas, que levaram os norte-americanos a apoiar os adversários dos russos na questão da Ucrânia; ou o Japão, a Coreia e Taiwan contra a República Popular da China. Russos e chineses vêem o apoio da América aos seus dissidentes internos ou as sanções económicas, no caso da Ucrânia, como simples ‘agressão’… alicerçada no pretexto humanitariamente correcto da defesa dos ‘direitos humanos’.    

Este sentimento de ‘pária do Ocidente’ vem empurrando Moscovo para os braços de Pequim. Os seus dirigentes lêem nas pressões americanas e europeias uma versão de maquiavelismo humanitário manipulado pelos interesses dos ocidentais.

A aproximação russo-chinesa foi recentemente muito falada e sublinhada no acordo energético entre o Presidente russo Vladimir Putin e o Presidente chinês Xi Jinping. O acordo para o fornecimento de gás chega numa ocasião em que a Rússia enfrenta problemas financeiros com a saída de cerca de 50 biliões de dólares, devido ao alarme das sanções. O negócio do gás é para 30 anos e vale cerca de 400 biliões, o maior acordo energético da História.

Ao mesmo tempo, Pequim e Moscovo têm cooperado em políticas alternativas à norte-americana para o Médio Oriente: ambos apoiaram a negociação da guerra civil síria e a moderação e contactos com o Irão.

Os acordos militares são outro tema de interesse comum: China e Rússia efectuaram manobras navais conjuntas no mar da China Oriental e Moscovo tem vendido e continua a vender armamento sofisticado para equipar e modernizar as Forças Armadas chinesas.

Esta cooperação repete-se porque se sentem hostilizados pelos Estados Unidos. Seguem o velho ditado político: «O inimigo do meu inimigo pode não ser meu amigo, mas é, com certeza, meu aliado». Objectiva e subjectivamente.