Lisboetas redescobrem a Ribeira das Naus

A tarde está quente e turistas – muitos turistas – e habitantes locais aproveitam as temperaturas típicas de estio para descobrir, com tempo, a Ribeira das Naus. 

Há dois dias na capital, Mimi está “a adorar” a cidade. Veio do Reino Unido a convite da amiga lisboeta Mariana, e a Ribeira das Naus, na frente ribeirinha da Baixa Pombalina, entre o Cais das Colunas e o do Sodré é, “até ao momento”, um dos locais de que esta universitária de 19 anos mais está a gostar. Foi Mariana, que este ano já recebeu vários amigos estrangeiros na cidade onde cresceu, quem a trouxe. “Trago sempre os meus amigos a esta zona, adoram”, sorri a jovem. 

Os fáceis acessos, a boa conservação do local, a relva, “a vista para os edifícios e para o rio” são as razões da preferência por este novo espaço público apontadas pelas duas amigas, atentas a uma possível vaga na relva. “Se for à sombra, melhor”, esclarecem, a sorrir. 

Por estes dias, não é tarefa fácil: a zona está apinhada de turistas a gozar o clima ameno, a passear ou, simplesmente, a observar e desfrutar da ‘nova’ Ribeira das Naus.

As duas rampas relvadas, que evocam as utilizadas noutros tempos por embarcações, atraem também centenas de visitantes. Uns dormem, outros estendem as toalhas e aproveitam, de fato-de-banho, o sol de Agosto.

‘Merecíamos um lugar assim’

Inaugurado por António Costa e pelo vereador do Urbanismo da Câmara Municipal de Lisboa (CML), Manuel Salgado, a 13 de Julho, após uma segunda fase de requalificação que incluiu a recriação da chamada ‘zona terra’, o novo espaço público está a conquistar o coração tanto de turistas como de habitantes de Lisboa e arredores. 

 “Merecíamos ter um lugar assim”, congratula-se Rosa, que aproveitou uma manhã de férias solarenga para atravessar de cacilheiro o Tejo desde o Barreiro e ver a cidade onde trabalha “com outros olhos”. “Este espaço já era nosso. Na traça original já existia para fruição do público em geral. Faltava devolvê-lo aos cidadãos”, assegura, a seu lado, o marido, Francisco Ramalho, olhando para o local onde antes existia o gradeamento das instalações da Marinha Portuguesa, então com acesso vedado ao público. 

Muito mudou. Onde hoje é a Doca Seca, existia um parque de estacionamento degradado. O primeiro passo para esta mudança foi a construção, em 2008, do Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência, que, à partida, parecia mais um edifício de cimento a impedir, de novo, a relação da cidade com o rio. Mas o puzzle não estava completo e só agora, seis anos passados e algumas polémicas pelo meio – a CML chegou a equacionar construir um novo parque de estacionamento no local, mudando de posição após abaixo-assinados dos moradores da zona –, a população tem finalmente uma ideia clara do projecto que apaixona portugueses e turistas. 

Uma praia de escadas

Projectada pelos arquitectos paisagistas João Nunes e João Gomes da Silva, a Ribeira das Naus retoma, nas palavras de Nunes quando da inauguração, “as geometrias e os espaços que antes existiam”. Dois exemplos: está agora visível a Doca Seca onde, desde o século XVII, eram recuperadas embarcações, e a Doca da Caldeirinha, que remonta a 1500, está coberta de água e pode ser atravessada a pé ou de bicicleta através de um passadiço em madeira de onde se vislumbram ainda as estruturas desenterradas do Palácio Corte Real.

Do outro lado, claro, está o Tejo, onde foi recriada a praia aqui existente antes do terramoto de 1755. Um projecto integrado na primeira fase de requalificação deste espaço público, terminada em Março deste ano, e que incluiu a requalificação das infra-estruturas e o avanço da margem para o Tejo, criando a Avenida Ribeira das Naus, com acesso pedonal entre os cais das Colunas e o do Sodré.

Também este é um dos locais adorados pelos turistas. Na escadaria em cimento claro que desemboca no Tejo, vêem-se dezenas de pessoas a aproveitar o Sol: umas de fato-de-banho, que estenderam toalha sobre um dos largos degraus das escadas; outras com guias turísticos ou livros na mão; outras com crianças que aproveitam a ‘praia da cidade’ para molhar os pés no Tejo, agora com menos água, outras que aproveitaram para uma pausa na sua caminhada diária. 

Bruna, brasileira de São Paulo e “apaixonada por Lisboa”, como a própria se define, está simplesmente a “aproveitar esta vista magnífica sobre o Tejo”. 

É a oitava vez que vem passar férias a Portugal e não passa sem “uns dias na capital”. E a sua opinião sobre a Ribeira das Naus resume a dos transeuntes: “Gosto muito, está tudo muito bem cuidado. As pessoas são simpáticas, está tudo limpo. Além dessa luz fantástica de Lisboa”, comenta a turista. 

Uma ‘nova relação com o rio’

Para os que querem conhecer e desfrutar deste novo espaço a pé, os próximos dias são ideais. É que, segundo a CML, a nova Avenida das Naus, que está agora fechada ao trânsito, deverá reabrir ao tráfego automóvel já em Setembro.

De qualquer modo, a avaliar pela receptividade dos turistas ao novo espaço, António Costa tinha razão quando apontou no discurso de inauguração de Julho que a Ribeira das Naus está livre da “camada de esquecimento e de destruição” a que estava votada. Após dois anos de obras e um custo de 11 milhões de euros, está, finalmente, estabelecida uma “nova relação da cidade com o rio”.

sonia.balasteiro@sol.pt