Costa a fingir que não percebe

Um espectro paira sobre a campanha de António Costa para as primárias do PS, o espectro de José Sócrates. Os socratistas em peso colaram-se à candidatura de Costa, mas o estigma político que transportam consigo ainda é tão incómodo que ninguém os vê nos jantares de campanha. E se o próprio Sócrates não se coíbe…

Mais curiosa ainda – e politicamente mais sintomática – é a forma como António Costa se esquiva a avaliar sem subterfúgios a governação de Sócrates, como desvia as perguntas inconvenientes sobre este tema com respostas laterais ou circulares, como foge a dar qualquer opinião clara e frontal.

Percebendo a incomodidade de Costa com esta questão, Seguro puxou-a para os debates televisivos da campanha, reconhecendo que “muita gente olha para o PS como responsável pela situação a que o país chegou, nomeadamente nos últimos anos da governação socialista” de Sócrates. E interpelou Costa: “Não podemos meter a cabeça na areia, temos que assumir essa responsabilidade”.

Directamente questionado – “Reconhece ou não que o Governo de Sócrates deixou o país numa situação de pré-bancarrota?” – António Costa circundou o assunto: “Eu critiquei, várias vezes até, esse anterior Governo do PS sobre alguns erros que foram cometidos”. Quais? Ter deixado o país à beira da falência e à mercê de um duríssimo programa de austeridade da troika? Costa responde ao lado: “Por exemplo, o PS utilizou a maioria absoluta com auto-suficiência e não dinamizou o diálogo político”. Mas foi ou não grave a espiral de despesismo público em que Sócrates afundou o défice do país? Costa tergiversa: “Outro erro foi subestimar a importância de acordos alargados sobre programas de infra-estruturas”.

Para concluir, com desfaçatez: “Portanto, estou à vontade sobre isso”. 'Isso' é a famigerada e fatídica governação de Sócrates. Sobre a qual nada diz. Ficamos todos devidamente esclarecidos. 

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