O outro lado do milagre

O Verão passa depressa – e, entre o trabalho e as idas obrigatórias à praia, não consegui sentar-me mais do que dez minutos na cama de rede da varanda nem estar um único dia inteiro no monte.

Os quatro dias que passei aqui no monte, no ido Verão de 2010, foram as férias mais descansadas que tive nos últimos tempos. Foram quatro dias sem fazer absolutamente nada, a não ser comer, dormir, ir a banhos e ver as estrelas. Mas este ano também não houve tempo para ver as estrelas. E mesmo que houvesse, quando chegasse a altura de o fazer  já estaria demasiado cansada para manter os olhos abertos.

Das pequenas obras de manutenção às grandes obras de remodelação, dos pequenos trabalhos de jardinagem a outras tarefas como tratar das árvores de fruto que ainda não matámos (talvez por não lhes termos posto as mãos em cima), parece que os trabalhos no campo nunca acabam. Como houve pouquíssimos progressos no projecto de remodelação do monte, a lista vai aumentando todos os dias.

Entretanto, nas minhas deambulações pela internet encontrei uma pequena história sobre o lado menos romântico do empreendedorismo.

Com os meios de comunicação a insistirem  na ideia do empreendedorismo como uma espécie de caminho milagreiro para a liberdade e para a estabilidade financeira, este outro lado do maravilhoso mundo das start-ups conseguiu deixar-me mais 'descansada' (pois eu tenho uma certa queda para o drama). É que esta onda de andarmos todos felizes com projectos novos e fresquinhos, pelos menos em matéria de facebooks, instagrams,  blogs  e afins, não podia, na minha opinião, ser verdade.

Segundo o autor da história (ele próprio um jovem executivo farto da sua vida corporativa), essa ideia fantástica de fundarmos a nossa própria empresa começa logo por dar cabo da nossa vida social. E incluo aqui a vida amorosa.

Em primeiro lugar, porque os amigos passarão a vida a querer actualizações da aventura quando, nos primeiros tempos, não teremos nada para lhes dizer.

Ter um companheiro ou companheira e pais compreensivos e que nos apoiem no caminho que escolhemos pode ser meio caminho andado para não ficarmos completamente isolados pelas preocupações.

Em segundo lugar (e isto para mim é que é o pior, tendo em conta que já voámos do ninho há uns anos e não contamos voltar a não ser de visita), o dinheiro vai acabar-se muito mais depressa do que o inicialmente previsto e rapidamente estaremos a ir às poupanças e a perder o sono por causa disso.

Depois, há a questão do tempo. O tempo de sono, que será pouco em oposição ao tempo que leva a percorrer a estrada do sucesso, que está cheia de rejeições e falhas.

Fundar uma empresa significa dizer adeus a noites bem dormidas e ao tempo passado com os amigos em ameno lazer, pois estaremos a trabalhar (uma vez que não há dinheiro, pelo menos no início, para contratar ajuda).

E, por último, há a definição do sucesso, cuja fórmula mais comummente conhecida é a capacidade da empresa para gerar lucro, ou, no caso português, a quantidade de vezes que se consegue ir aos programas da tarde da televisão.

Mas, para a maior parte dos empreendedores ou sonhadores, o sucesso definir-se-á pela capacidade de transformar a sua ideia num negócio, usando apenas os seus próprios recursos.

Ora, é por tudo isto que a minha propensão para a tragédia nos vai dar imenso jeito: porque não há nada melhor do que estarmos preparados para o pior.