Onde pára a polícia?

Onde estão os estudantes do povoado de Ayotzinapa? Um grupo de 43 está desaparecido desde a noite de 26 de Setembro, após confrontos com a Polícia da cidade de Iguala, no Sudoeste do México, que foi acusada de ter raptado os jovens e de os ter entregue a um cartel de droga local, os Guerreiros…

Onde pára a polícia?

Em 20 estados do país, milhares de pessoas marcharam esta semana em protesto, exigindo o regresso dos jovens – “levaram-nos vivos, queremo-los de volta vivos!”. Só na capital, manifestaram-se pelo menos 15 mil pessoas. 

Para acalmar os ânimos o Presidente mexicano já tinha enviado na segunda-feira uma força de elite da Polícia Federal, fortemente armada, para o estado de Guerrero (mais conhecido pelas famosas praias de Acapulco): 81 presidentes de câmara e as respectivas polícias municipais estão a ser investigados por suspeita de ligações ao crime organizado.

Enrique Peña Nieto, que ao assumir o cargo há dois anos prometeu acabar com a violência dos gangues – responsável desde 2007 por mais de 100 mil mortes –, condenou estas mortes “ultrajantes, dolorosas e inaceitáveis”. Os cadáveres descobertos foram queimados e enterrados nas valas comuns. A degradação dos corpos não permitiu ainda a sua identificação – e mesmo que sejam dos estudantes, como se suspeita, não somam a totalidade dos desaparecidos.

A tropa de elite federal, que em Iguala já foi vista a fazer selfies com os residentes, vai ajudar na busca dos jovens e garantir a segurança na zona nas próximas semanas. Os Guerreiros Unidos (GU) – cartel de droga local que se dedica também à extorsão, a sequestros e a infiltrar-se nos organismos públicos – foram menos simpáticos: numa narcomanta, as mensagens que estes grupos afixam nas ruas, escreveram: “Ao Governo federal e estatal e a todos os que nos apoiavam, exigimos que libertem os 22 polícias que estão detidos”. E ameaçaram denunciar altos responsáveis que apoiavam o cartel: “A guerra já começou”, rematava a mensagem.

Esses polícias foram detidos após os confrontos de 26 de Setembro – mas o resto da força policial de Iguala (cerca de uma centena de agentes) está suspenso e a ser interrogado. As suas armas, confiscadas, vão ser analisadas para saber se foram usadas em crimes. O presidente da Câmara de Iguala e a mulher – cujos dois irmãos, mortos em 2009, tiveram altos cargos noutro cartel de droga – terão fugido e estão em parte incerta.

A noite fatídica

A 26 de Setembro, estudantes da Escola Normal Rural Isidro Burgos, em Ayotzinapa (vilarejo de uma centena de pessoas no interior do estado de Guerrero), estão em Iguala para angariar fundos e manifestar-se.

Os jovens estudam para serem professores primários, numa escola pertencente a uma rede de institutos estatais rurais criada nos anos 20 para massificar o ensino nas zonas mais distantes dos centros urbanos. É precisamente para protestar contra o recrutamento de docentes oriundos da cidade, em detrimento do que vêm de áreas rurais, que se encontram em Iguala.

Quando decidem voltar a Ayotzinapa em autocarros – à boleia, segundo testemunhas, tomando os veículos à força na versão policial –, a Polícia começa a disparar. Morrem seis pessoas (três estudantes, um futebolista, o condutor de um autocarro e uma passageira num táxi) e outras 25 ficaram feridas.

São 13 os estudantes que conseguem fugir, mas os agentes detêm outros 43, levando-os em carros-patrulha: são presumivelmente levados para a esquadra – só que desaparecem. Uma versão que ganha força é a de que terão sido transportados para um local ermo, entregues pelos polícias aos GU e executados porque não cediam a chantagens. A 4 de Outubro são descobertas as valas comuns com perto de três dezenas de corpos calcinados, após a denúncia de um dos detidos na noite dos confrontos. Familiares dos jovens já deram amostras de ADN, mas as autoridades dizem que as identificações podem demorar até dois meses.

ana.c.camara@sol.pt