Isto está perigoso

Sou um optimista por natureza, daqueles para quem o copo está sempre meio-cheio. Mas o compacto de desgraças coligido no último número da revista The Economist abalou-me a confiança (e o artigo de Teresa de Sousa no Público do passado fim-de-semana não ajudou).

O ébola fez a capa, mas não, não é principalmente o ébola! Por muito assustador que seja o vírus, por muito devastadora que seja a epidemia, penso que existe muita histeria. Agora que a doença saiu de África e começou a capturar atenção dos países mais ricos, as soluções médicas estarão para breve.

Muito mais preocupante é a situação que o Papa Francisco descreveu como uma espécie de terceira guerra mundial, "combatida por partes, com crimes, massacres e destruições". A Ucrânia parece mais calma, mas, como alguém disse, a crise está apenas a hibernar. Como será com o degelo na Primavera? O Estado Islâmico e o islamismo radical em geral prometem uma guerra que terá fases agudas, mas será certamente crónica por muitos anos: na Palestina sempre e agora na Síria e Iraque, sem falar no frágil Afeganistão. Esta tensão prolongada acabará por abrir brechas nos bastiões do estado de Direito na região, Israel e Turquia. Poderá mesmo impactar o delicado equilíbrio entre a Índia e o Paquistão.

As notícias da União Europeia também não são animadoras. A área do Euro mergulha paulatina, mas ao que tudo indica, inexoravelmente, no seu pesadelo japonês – anos e anos de deflação e recessão. Para o impedir, a Europa está muito mais desarmada do que o Japão estava, pois não possui os instrumentos de intervenção de um governo económico unitário, em particular um orçamento integrado e consenso político em torno da política monetária. A estagnação vai abrir brechas na União, de novo reveladas pela tensão entre a Comissão (com a Alemanha) e a França e Itália, a propósito dos orçamentos de 2015. Uma crise larvar prolongada será, ainda, um caldo de cultura para o florescimento de pulsões nacionalistas que tentarão pôr em causa a livre circulação de pessoas na União Europeia.

Para completar o quadro, a The Economist chama a atenção para o acumular de dívida (pública e privada) chinesa, que no espaço de seis anos passou de 100% para 250% do produto. Como a maior parte desta dívida é devida aos próprios bancos chineses, controlados pelo próprio governo, o risco não é o de colapsos financeiros como os que assistimos em 2008. É antes o da preservação artificial de empresas zombie (como aconteceu no Japão) e as consequências disso no potencial de crescimento da China.

O que fazer? – pergunta o optimista. Não permitir que aquilo que não podemos controlar nos paralise. A estratégia dominante é, sempre, fazer o melhor possível naquilo que está ao nosso alcance.