Inundações: Lisboa tem solução

Passados Julho e Agosto com temperaturas abaixo do normal e um Setembro quente, mas extremamente chuvoso, não esperávamos este Outubro com temperaturas máximas acima de 30º C.

Estranhamos o comportamento da atmosfera. O nosso clima regista a ocorrência de alguns fenómenos anómalos com um período de recorrência variável. É o caso deste Outubro que está a acontecer três anos depois de outro ainda mais quente (o mais quente desde 1931) com temperaturas máximas superiores a 35º. Já não nos recordamos, mas havia numerosos incêndios florestais, alguns de grandes dimensões. Não é frequente um período de recorrência tão curto.

Também não nos lembramos do Verão de 2007, quanto mais dos Verões de 1998 e 1988. Verões frescos e húmidos que, sendo poucos, também fazem o clima do nosso verão. É ainda de notar que, mesmo nestes casos, o trimestre estival não tem as mesmas características em cada um dos meses. Por exemplo, já não recordamos que o Junho deste ano foi normal, embora com uma onda de calor entre os dias 11 e 17, com prováveis consequências em excedentes de mortalidade.

Continuando a fustigar a nossa curta memória, já tínhamos atravessado este ano uma outra onda de calor, entre 28 de Abril e 18 de Maio, que teve impactos em algumas áreas de agricultura. Mês de Maio que foi o mais quente no planeta, desde 1880. Segundo a instituição meteorológica americana (NOAA), este mês de Setembro foi também, no mesmo período, o mais quente ao nível global.

No nosso território do continente, este mês de Setembro de tantos queixumes registou valores da temperatura média acima do normal e valores da precipitação que o classificam como extremamente chuvoso.

Foi no dia 22 de Setembro que se registou o primeiro sobressalto com inundações em Lisboa. Neste dia, registe-se o desajustamento do vereador da Protecção Civil, face aos avisos que a Autoridade de Protecção Civil tinha recebido do Instituto Português do Mar e da Atmosfera. Acusar o IPMA de não ter enviado o que provadamente enviou fica registado como exemplo do que um responsável não pode fazer.

Um sobressalto com maiores proporções foi sentido no dia 13 de Outubro, com as inundações que causaram prejuízos e imobilizaram partes da cidade. Revelaram as conhecidas vulnerabilidades face a precipitações muito intensas de curta duração conjugadas com a maré em preia-mar. Situação recorrente, tanto do lado da atmosfera como do comportamento dos responsáveis políticos.

O presidente da Câmara afirmou que nada havia a fazer, que é irresolúvel o problema suscitado pela conjunção de maré cheia com chuva tão intensa num curto intervalo de tempo. Esta é a resposta fatal que recebe dos responsáveis políticos quem anda há décadas no sistema de protecção civil: declarações de circunstância perante a situação gritante que a comunicação social apresenta e, pronto, não se fala mais nisso até à próxima.

Acontece que o problema é resolúvel numa escala temporal de médio prazo, desde que se encontrem meios para viabilizar a intervenção das ciências e da engenharia na execução. E se o problema já é agudo há tantos anos tende a agravar-se com os efeitos do aquecimento global na subida do nível do mar e no aumento das situações de chuva muito intensa e de vento forte em maré cheia.

Há cidades com frentes de água fluviais ou/e marítimas que estão a investir para se adaptarem a esta tendência emergente. Antes de Lisboa declarar a irresolubilidade, veja o que S. Francisco, Nova Iorque, Londres, Hull e Roterdão andam a projectar e a fazer.

*Meteorologista