Regulador usou “persuasão moral” para afastar Salgado do BES

Pedro Duarte Neves, vice-governador do Banco de Portugal, foi hoje inquirido na comissão parlamentar de inquérito à gestão do BES e do Grupo Espírito Santo, tendo revelado que o BdP usou a “persuasão moral” para afastar Ricardo Salgado. 

Regulador usou “persuasão moral” para afastar Salgado do BES

Para tal, usou os mecanismos ao seu dispor, ao adiar os “registos” para o desempenho de funções do banqueiro em outras filiais, cujos pedidos estavam pendentes no banco central. Perante esta postura do regulador, Ricardo Salgado sentiu-se pressionado a apresentar o pedido de demissão.

“O Banco de Portugal criou condições para Ricardo Salgado renunciar”, afirmou o vice-governador.

“O BdP usou o processo de registo para fazer acontecer a saída” do banqueiro, esclareceu. “A persuasão moral com Ricardo Salgado funcionou. Houve um processo de sucessão em Abril que se concretizou em Junho com a sua demissão". Esse processo de sucessão foi assim desencadeado pelo próprio Ricardo Salgado, garantiu o vice-governador do Banco de Portugal.

Miguel Tiago, deputado do PCP, questionou: “Se não existiam dúvidas sobre a idoneidade, porque existia persuasão moral?”. O vice-governador respondeu que “só mais tarde é que começaram a ser recolhidos elementos mais fortes para questionar a idoneidade”.

A deputada do Bloco de Esquerda Mariana Mortágua voltou a insistir em esclarecimentos sobre a “persuasão moral.” Duarte Neves adianta que estavam em curso processos de registos para desempenho de funções no BEST, BESI, ESAF, Espírito Santo Tech Ventures por Salgado.

“Esse registo não foi concedido”, ou seja, “foi usado o elemento de pressão pelo Banco de Portugal através de perguntas e respostas e Ricardo Salgado ter-se-á sentido forçado a renunciar”.

A 16 de Abril, Salgado renunciou a todos os registos que se encontravam pendentes no Banco de Portugal. No entanto, só em Junho é concretizada a sucessão.

O vice-governador esclareceu ainda que os pareceres enviados pelo BES ao BdP sobre a idoneidade de Ricardo Salgado não foram determinantes para a actuação do Banco de Portugal.

Inspectores permanentes no BES desde 2009

Questionado pelo deputado Miguel Tiago do PCP sobre as várias inspecções feitas ao BES, Pedro Duarte Neves revelou que o regulador da banca tinha uma equipa de inspecção permanente na instituição liderada por Ricardo Salgado desde meados de 2009.

A par da supervisão off-site, que incide na análise sistemática da informação enviada pelas instituições ao supervisor, o Banco de Portugal reforçou nos últimos anos a inspecção on-site, ou seja, a realização de exames e inspecções nas próprias instalações dos bancos.

A intenção do Banco de Portugal em colocar equipas de supervisores permanentes nas grandes instituições foi anunciada ainda em 2008 por Vítor Constâncio, tendo em vista a recolha de informação completa e clarificadora.

As inspecções permanentes ao BES começaram em meados de 2009. Essas inspecções permitiam “ter acesso mais directo às decisões tomadas pela administração”, esclarece o responsável do Banco de Portugal.

Forte pressão ao BES

“O Banco de Portugal foi consistente e determinado e fez uma forte pressão ao longo destes meses” junto do conselho de administração do BES, liderado por Ricardo Salgado. “E os montantes em dívida foram reduzidos significativamente”, refere o vice-governador, a quem foi retirado o pelouro da supervisão prudencial, em resposta à deputada do CDS Cecília Meireles.

O supervisor “adoptou uma estratégia de protecção do BES, que assentava também nos deveres de acompanhamento e vigilância das três primeiras linhas de defesa: conselhos de administração, conselhos de auditoria e auditores externos”, afirmou. “Infelizmente, a prática de actos de gestão gravemente prejudiciais aos interesses do BES conduziram a prejuízos não antecipáveis e acabaram por ditar a resolução da instituição.

O Banco de Portugal actuou de “forma séria e rigorosa”, garantiu Pedro Duarte Neves, indo ao encontro das declarações do governador na audição que durou mais de sete horas esta segunda-feira.

sandra.a.simoes@sol.pt