Papa quer UE mais democrática e cristã

O Papa Francisco apelou para os deputados europeus combaterem os interesses obscuros de forma a manterem vivas as democracias dos respectivos países, mas também instou para que a Europa não esqueça a matriz cristã e promova os valores humanos em detrimento de uma visão economicista.

Papa quer UE mais democrática e cristã

Não é todos os dias que o Papa visita o Parlamento Europeu. Da última vez que tal aconteceu – era então João Paulo II quem se sentava na cadeira de São Pedro – ainda existia o Muro de Berlim, Portugal e Espanha eram os membros mais recentes de uma Europa a 12. Isso mesmo lembrou Francisco no início do discurso, lembrando que o mundo mudou muito. “A par duma União Europeia mais ampla, há também um mundo mais complexo e em intensa movimentação: um mundo cada vez mais interligado e global e, consequentemente, menos eurocêntrico. A uma União mais alargada, mais influente, parece contrapor-se a imagem duma Europa um pouco envelhecida, que tende a sentir-se menos protagonista”.

Citando quer João Paulo II, quer Bento XVI, Bergoglio fez o diagnóstico da sociedade actual, de todos os constrangimentos à dignidade humana, do desemprego à solidão. Após ter lamentado as perseguições de que são alvo os cristãos, “sob o silêncio vergonhoso e cúmplice de muitos”, e dirigindo-se aos parlamentares como pastor, comparou a Europa com um fresco de Rafael, Escola de Atenas, no qual Platão aponta para o céu e Aristóteles para o horizonte. “Estou convencido de que uma Europa que seja capaz de conservar as suas raízes religiosas, sabendo apreender a sua riqueza e potencialidades, pode mais facilmente também permanecer imune a tantos extremismos que campeiam no mundo actual – o que se fica a dever também ao grande vazio de ideais a que assistimos no chamado Ocidente”. E depois citou o antecessor, Bento XVI: “O que gera a violência não é a glorificação de Deus, mas o seu esquecimento”.

Na mensagem que formulou, Francisco enfatizou a importância da educação e da pesquisa científica, a par do respeito pela natureza. Mas não deixou de lembrar o desafio dos eurodeputados em manter as democracias “face à pressão de interesses multinacionais não universais, que as enfraquecem e transformam em sistemas uniformizadores de poder financeiro ao serviço de impérios desconhecidos”.

O pontífice insurgiu-se ainda contra o facto de toneladas de comida se estragarem e haver milhões a morrer de fome e contra o Mediterrâneo transformado em cemitério. Além de ter apelado para um tratamento digno aos imigrantes, instou a que haja uma política comum quer de imigração, quer no combate às causas da imigração em massa.

Numa intervenção muito aplaudida e fotografada pelos parlamentares, Francisco terminou com uma nota de esperança e de alento: “Chegou a hora de construir juntos a Europa que gira, não em torno da economia, mas da sacralidade da pessoa humana, dos valores inalienáveis; a Europa que abraça com coragem o seu passado e olha com confiança o seu futuro, para viver plenamente e com esperança o seu presente”.

Antes, o presidente do Parlamento destacara a importância do discurso, uma vez que as palavras do Papa são “universais” e proporcionam “orientação em tempos confusos” as suas palavras de paz são necessárias. Schulz disse ainda que a história de vida de Jorge Bergoglio e da sua família é tipicamente europeia – e que o sua vinda para a Europa para reformar a Igreja Católica é um “modelo a seguir”. 

cesar.avo@sol.pt