A lógica da batata

Há muito que se fala de um regresso aos campos como forma de combater a crise. Se depender de Hugo Santos, esse retorno está garantido, pelo menos em parte. Ex-aluno da EPTOLIVA – Escola Profissional de Oliveira do Hospital, Tábua e Arganil, acabou por ser forçado a emigrar, provando o desfasamento do discurso dos poderes…

Há muito que se fala de um regresso aos campos como forma de combater a crise. Se depender de Hugo Santos, esse retorno está garantido, pelo menos em parte. Ex-aluno da EPTOLIVA – Escola Profissional de Oliveira do Hospital, Tábua e Arganil, acabou por ser forçado a emigrar, provando o desfasamento do discurso dos poderes públicos e da realidade. Está agora em França, depois de coleccionar prémios com o seu projecto inovador: “Optei por emigrar”, confessa por email ao SOL, para “procurar um desafio diferente, tanto a nível profissional como a nível pessoal, adquirir novas competências e tentar encontrar alguma estabilidade em termos de empregabilidade”.

A falta de emprego está, no entanto, no sentido inverso da criatividade, neste caso. Santos, agora com 20 anos, saiu numa idade crucial para um país perdulário de inovadores. Criou a motoplanta, uma daquelas ideias simples que, por isso mesmo, é eficaz: trata-se de uma máquina de plantar batatas, em que a relação não se limita à razão economicista qualidade/preço. É também uma questão de eficácia comprovada e, sobretudo, agraciada com dezenas de prémios em concursos de inovação nacionais, incluindo a Mostra Nacional de Ciência (MNC), onde venceu o prémio especial de engenharias.

Não seriam razões mais que suficientes para que Hugo estivesse num emprego de vento em popa actualmente? “Foram-me apresentadas várias propostas, contudo nenhuma delas foi suficientemente convincente e economicamente viável”.

A máquina descreve-se de uma forma muito simples. Adaptada a um motocultivador de 12 a 14 cv, permite plantar batatas de maneira uniforme e ao mesmo tempo colocar a quantidade necessária de adubo. Santos continua a descrição: “No processo de plantação da batata bastam duas pessoas, uma a conduzir o motocultivador com a máquina e outra a colocar as batatas no depósito circular”. Segundo o jovem, as vantagens são várias, mas destaca-se uma “diminuição do esforço físico e da mão-de-obra” e uma redução do desperdício de fertilizante.

A motoplanta acaba por reduzir as fases de cultivo a “quatro processos”: abre a vala, coloca a batata, segue-se o adubo e tapa a vala. Segundo Hugo Santos, o projecto incluía uma previsão financeira a quatro anos, com uma estimativa de vendas que ia das 50 unidades no primeiro ano às 150 no quarto, a um preço de 350 a 400 euros por unidade.

Hugo tem a intenção de prosseguir estudos num futuro imediato, talvez num curso de engenharia electrotécnica ou electromecânica. Para este natural de Coimbra mas com uma vida passada em S. Martinho da Cortiça (concelho de Arganil), esta máquina é apenas a primeira fase de uma série de ideias com vista a um aperfeiçoamento. Possíveis novos modelos estão em estudo na BLC3, uma incubadora de empresas de Oliveira do Hospital.

Para um futuro mais remoto ficará o regresso. Tal como muitos antepassados seus daquelas regiões beirãs, a França foi um destino de eleição. Mas, para ele, sair foi “apenas uma opção para conseguir obter autonomia financeira” e deixar de sobrecarregar os pais. “Aproveito para confessar que me sinto triste por pertencer a um país em que estudar é hoje para quem pode e não para quem quer, ou seja, é um 'luxo'“, conclui, à espera de melhores dias.

ricardo.nabais@sol.pt