‘Prenda’ de milhões de euros do construtor José Guilherme sem impacto na idoneidade de Salgado

O impacto na idoneidade de Ricardo Salgado do “presente” de 8,5 milhões de euros do construtor José Guilherme foi avaliado pelo jurista e professor Pedro Maia.

‘Prenda’ de milhões de euros do construtor José Guilherme sem impacto na idoneidade de Salgado

A idoneidade do banqueiro, e os pareceres encomendados para se salvaguardar junto do regulador bancário, motivaram muitas questões no Parlamento e estão a desencadear uma troca de acusações entre o Governador do Banco de Portugal e Pedro Maia.
 
Na última troca de correspondência fica a conhecer-se a opinião do jurista relativamente à prenda recebida por Salgado. “É inteiramente verdade que o parecer de vossa excelência [Pedro Maia] se refere apenas à apreciação da transferência de uma quantia da 8,5 milhões de euros feita pelo Senhor José Conceição Guilherme em benefício do Dr. Ricardo Salgado, à luz da explicação dada por este último sobre a natureza e razão de ser desse pagamento”, escreve Carlos Costa na missiva enviada ao jurista.
 
“O parecer de vossa excelência conclui que a transferência do Senhor José Guilherme para o Dr. Ricardo Salgado não afecta a idoneidade deste último, em primeiro Iugar, por ter sido efectuada no âmbito de uma relação pessoal (fora, portanto, dos padrões de conduta profissional descritos no n.2 2 do artigo 30.2 do RGICSF) e, em segundo Iugar, por não ter "dado Iugar a condenação pela prática seja de que crime for"”, revela o Governador.
 
Recorde-se que essa “liberalidade” (presente) atingiu os 14 milhões de euros. Salgado recusou explicar à sua família este montante, declarando apenas que este era “um assunto pessoal”.
 
Não foi a apreciação da prenda ou a conclusão a que o jurista chegou que levaram Carlos Costa a referir os pareceres no Parlamento, mas sim as premissas jurídicas assumidas, já que considera serem relevantes para a discussão dos poderes do Banco de Portugal, explica o Governador na carta.
 
O regulador garante estar disponível para remeter os pareceres à comissão parlamentar, divulgá-los no seu site e dar instruções para que a nota técnica do Banco de Portugal sobre esta matéria respeite fielmente “a integridade intelectual” da opinião manifestada pelo jurista.
 
Carlos Costa regressa ao Parlamento
 
O presidente da comissão já revelou que irá chamar novamente Carlos Costa ao Parlamento, depois de Pedro Maia ter contrariado as declarações do Governador no Parlamento.
 
Carlos Costa afirmou na comissão de inquérito que os pareceres recebidos condicionaram a sua actuação e que, de alguma forma, impediram que a idoneidade de Salgado fosse retirada há muito tempo. No juízo de Carlos Costa sobre a idoneidade de Salgado pesaram também os efeitos na estabilidade do sistema financeiro e a ausência de condenações judiciais ou acusações contra o ex-presidente do BES.
 
Pedro Maia reagiu, garantindo que o Banco de Portugal considerou ter poderes mais limitados do que aqueles que o parecer lhe reconhece. “Associar a minha opinião jurídica e o meu parecer à actuação do Banco de Portugal – que não me atrevo a ajuizar – é, seguramente, infundado e induz em erro”, garante o jurista que exige esclarecimentos e rectificações ao Banco de Portugal. Pedro Maia chega mesmo a afirmar que pondera agir judicialmente em defesa do seu bom nome profissional e académico.
 
Na resposta, o Governador garante ainda que sua referência, na audição do dia 17 de Novembro, a vários pareceres de jurisconsultos sobre o tema da idoneidade “foi feita em termos genéricos, sem identificar os autores desses pareceres ou os problemas e argumentos concretos versados em cada um deles”.
 
Além disso, acrescenta que “não teve qualquer intuito de comprometer ou embaraçar os professores que as subscreveram”, escreve Carlos Costa.

sandra.a.simoes@sol.pt