Queiroz Pereira acusa Salgado de resolver problemas com ‘imaginação excessiva’

O empresário Pedro Queiroz Pereira confessou no Parlamento que as dificuldades no Grupo Espírito Santo eram do seu conhecimento há vários anos e acredita que os “problemas eram resolvidos com muita imaginação”. E, tal como José Maria Ricciardi, confessa ter muitas dúvidas que Ricardo Salgado “não soubesse de nada”.

Queiroz Pereira acusa Salgado de resolver problemas com ‘imaginação excessiva’

Pedro Queiroz Pereira enviou quatro cartas e mapas com as avaliações técnicas à dívida financeira do Grupo Espírito Santo, material que constitui o famoso dossier que o empresário entregou ao Banco de Portugal numa reunião realizada a 4 de Outubro de 2013 com o vice-governador Pedro Duarte Neves, com o pelouro da supervisão bancária nessa altura.

“Não tive o mínimo sinal se o Banco de Portugal tinha conhecimento. Eu e o meu advogado questionámo-nos sobre isso a caminho do escritório, após a reunião. O meu advogado referiu que o vice-governador tinha cara de póker [póker face].”

O dono da Semapa ficou com dúvidas se o supervisor foi apanhado de surpresa ou se já suspeitava do GES. Já o próprio Queiroz Pereira confessa que tinha conhecimento que o GES “era um castelo de cartas” há vários anos.

“Eu já percebia que as coisas não corriam bem, há muitos, muitos anos. Desde o início deste século.” Para contextualizar, o empresário recorda aos deputados que o GES foi reconstruído com muitas dificuldades financeiras.

“As famílias, nas quais se incluía o meu pai, ficaram muito pauperadas em 1974. Não havia dinheiro.”

O empresário garante que houve enorme esforço de captação de recursos para entrar na ESI. O segundo grande esforço incidiu, durante os anos de 90, nas operações de natureza financeira, com emissões de obrigações, que aumentaram dívida do GES.

Na altura, diz o empresário, registavam-se “movimentos de dinheiro para baixo e para cima. Foi-se procurar dinheiro em pequenos accionistas e em operações de natureza financeira muito imaginativa”.

A crise financeira mundial, em 2008, apanha o grupo já num grande “stress financeiro”. E aqui começam as “dificuldades insuperáveis”. “Havia dívida já grande, havia juros a vencer. Havia problemas de caixa. Foi-se resolvendo com cada vez mais imaginação e em 2011, 2012 e 2013 com excessiva imaginação, diria eu.”

Pedro Queiroz Pereira revela que “não tinha uma boa relação com o governance” e confessa ter tido “acesas discussões com Ricardo Salgado”.

O empresário garante ter enviado um dossier ao Banco de Portugal com suspeitas sobre a gestão do BES porque sentia a existência de uma certa “fragilidade financeira”. “Os factos que apurámos foram de governance e de contabilização em sociedades de controlo do GES, uma provável insolvência dessas sociedades.”

“Na altura não se falava nem em BESA nem em passivos não contabilizados”. A situação líquida já era negativa em três mil milhões sem a dívida oculta e sem o BES Angola.

O Banco de Portugal pediu mais informação de governance, mas Queiroz Pereira não recebeu respostas das holdings.

O facto de ter ido ao supervisor terá assustado Ricardo Salgado, considera o empresário. Chegou a acordo com o ex-presidente do BES, deixou de ser sócio e comunicou ao Banco de Portugal que não iria prosseguir com a litigância. Esse acordo teve o envolvimento de Fernando Ulrich e Eduardo Catroga. Ulrich é seu amigo de infância e Catroga “não se sabe muito bem de onde vinha”, explica o empresário.

Bancos eram os “donos disto tudo”

O interesse do empresário Pedro Queiroz Pereira na Cimpor foi travado por Ricardo Salgado e Jardim Gonçalves, fundador do BCP, em 2001.

“Jardim Gonçalves e Ricardo Salgado travaram-me [na OPA sobre a Cimpor]. Podia ter ficado com um terço da Cimpor em 2001. Tinham um poder tal neste país” que era preciso controlar, justifica o empresário.

“Não era fácil para mim despoletar guerras com os bancos. Os bancos eram donos de tudo”, acusa o empresário da Semapa.

Ricciardi vivia em pânico

“Sou muito amigo deles todos. A quem eu me queixava com mais veemência era ao Dr. Ricciardi. O grupo estava a ir para o abismo”, conta. Consciente do impacto que a sua denúncia poderia ter, Queiroz Pereira hesitou no envio da queixa ao supervisor. “Demorei seis meses a escrever a carta”, confessa o empresário.

Pedro Queiroz Pereira confessa que tem dúvidas que o contabilista tenha realizado operações sem o conhecimento de Ricardo Salgado. “Quando se fala de Espírito Santo, fala-se de Ricardo Salgado”.