José Sócrates e Otelo Saraiva de Carvalho

Um turista que aterre em Portugal e consiga traduzir o que tem sido escrito sobre José Sócrates vai pensar que acabou de chegar a um país que vive em ditadura, onde a Justiça é maquiavélica e persegue inocentes. Um país que até tem presos políticos!

Nos últimos dias tudo tem sido feito para desacreditar a investigação que levou à detenção do antigo primeiro-ministro – acusado de fraude fiscal qualificada, corrupção e branqueamento de capitais. Se não vejamos: “A detenção é injustificada”; “É algo inaceitável e infamante não haver uma única prova contra um homem que tantos serviços prestou a Portugal”; “Não sou jurista nem estou a discutir o código de processo penal. Estou a dizer que não faz sentido que uma pessoa possa estar presa, no século XXI, numa democracia, sem se saber porquê”. Estes são alguns dos mimos que têm sido ditos sobre o caso por políticos que desempenharam altos cargos da Nação. Um deles, chega mesmo a apelar ao actual Presidente da República para intervir, sugerindo, talvez, que faça um golpe de Estado na Justiça e que substitua todos os magistrados envolvidos directa ou indirectamente no processo.

Mas se o tal turista for ainda ler o que certos jornalistas amigos de José Sócrates escrevem, deverá, seguramente, apanhar o primeiro avião e fugir desta ditadura, já que se fala até em romarias-manifestações de mais de mil pessoas para a cidade onde o preso 44 está detido. Não se percebeu ainda se querem invadir a cadeia e libertar o preso político ou tão-somente ter mais tempo de antena para pressionar aqueles que hão-de decidir pela continuação ou não da prisão preventiva. 

Sabe-se sim que, inconscientemente, muitos olham para José Sócrates como outros olharam para Otelo Saraiva de Carvalho – quando este esteve envolvido nas FP-25 de Abril. Otelo tinha sido o estratega do 25 de Abril que devolvera a liberdade ao povo, mas quando entrou num grupo terrorista, muitos quiseram perdoar-lhe em nome do que tinha feito. Assim parecem alguns dos defensores de Sócrates. Como ele prestou “tantos serviços a Portugal” não podem ser uns simples procuradores a condená-lo por, supostamente, ter cometido os tais crimes de fraude fiscal, corrupção e branqueamento de capitais. Infelizmente para essas figuras, vivemos numa democracia e a Justiça determinará se é culpado ou não. Se não for, então que façam todas as manifestações que entenderem. Até lá, deixem a Justiça trabalhar.

vitor.rainho@sol.pt