O Triângulo das Bermudas que aprisiona a RTP

Alberto da Ponte, presidente de saída da RTP, é mais uma vítima fatal do triângulo das Bermudas – grelhas de milhões/audiências/serviço público – em que há muito se converteu e se deixou aprisionar a RTP. Porque o grande equívoco desta equação impossível (que devora administrações atrás de administrações) é querer-se conciliar serviço público com boas…

Ora, a realidade, crua e dura mas incontestável, é que a maioria clara dos portugueses que vêem televisão não querem que lhes dêem bons programas culturais, como um concerto, uma peça de teatro ou uma biografia histórica. Preferem, de longe, uma colorida novela, um ordinário e bisbilhoteiro reality show ou mais um jogo de futebol. Não é por acaso que as mais premiadas séries internacionais só passam no cabo ou já de madrugada nos canais generalistas, como é o caso de House of Cards (na SIC por volta das 00h30), de Homeland (na Fox) ou da consagrada Downton Abbey (SIC, à meia-noite). Grandes documentários como o da Guerra Colonial, de Joaquim Furtado, ou da 1.ª Guerra Mundial, da BBC, são remetidos para a RTP2 ou para desoras na RTP1. Não vale a pena negar os factos. Nem as preferências e o nível cultural da maioria dos portugueses. São o que são.

E é por isso que a RTP1 foi evoluindo, irremediavelmente, para uma estação generalista que é uma cópia quase idêntica da SIC e da TVI. É por isso que a frustrada administração de Alberto da Ponte caiu na armadilha de dar uns largos milhões pelos jogos da Liga dos Campeões, na luta por audiências mal disfarçadas de serviço público. 
Serviço público efectivo resume-se a alguns programas da RTP2 que não passariam, por fracas audiências, em qualquer dos canais generalistas. Tudo o mais é um sofisma.

Irão os novos administradores, Gonçalo Reis e Nuno Artur Silva, perceber esta evidência e adequar a RTP a essa realidade? Aposta-se que, metidos no interior da gigantesca máquina que é o edifício da Marechal Gomes da Costa e vergados ao pesado elefante branco em que se transformou a RTP, não o farão. Vamos continuar a ter mais do mesmo. À custa do erário público, claro. 140 milhões de euros/ano, para ser mais concreto.

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