Angola reage

A queda do preço do petróleo está a deixar 9.000 empresários portugueses que exportam para Angola à beira de um ataque de nervos e milhares de trabalhadores com dificuldade em enviar dinheiro para Portugal. Em Luanda, o Governo garante que está preparado para combater a crise do petróleo – vai reduzir as importações e cortar…

Além das empresas que têm actividade em Angola – sobretudo as de construção, já com dificuldades em receber e enviar dinheiro para Portugal -, também os exportadores lusos devem ressentir-se. Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), os produtos mais vendidos a Angola são cervejas, móveis, vinho, ferro e aço, medicamentos e enchidos. Angola é o quarto cliente das exportações portuguesas.

Para já, centenas de trabalhadores portugueses em Angola, sobretudo na construção civil, queixaram-se por não conseguirem enviar dinheiro dos salários para casa. Segundo um alerta do Sindicato da Construção de Portugal, na origem do problema está a escassez de dólares, devido à quebra das receitas do petróleo.

O sindicalista Albano Ribeiro diz que os portugueses estão a ter problemas em receber os salários e enviar dinheiro para Portugal. Há até casos de emigrantes que vieram passar o Natal a casa e não regressaram a Angola, onde trabalham cerca de 200 mil trabalhadores portugueses, cuja situação deverá complicar-se com a queda do petróleo.
 
Governo limita importações

O ministro das Finanças de Angola, Armando Manuel, assegurou esta semana que o Executivo tem uma estratégia para lidar com a crise do petróleo. “Certamente auguramos que um quadro de estabilização se venha a observar”, disse Armando Manuel, citado pela Lusa, à margem de uma inauguração.

O Governo já decretou quotas mais baixas de importação em 2015 para produtos como óleo, farinha, arroz e açúcar. Numa economia assente na exportação de petróleo, a descida da cotação do crude diminui a entrada de divisas e dificulta o pagamento das importações. A medida do Governo visa reduzir as compras ao exterior. Em Portugal, o sector das cervejas pode ser penalizado, já que está abrangido pelas novas quotas e Angola tem um peso relevante nas exportações.

O Governo vai também apresentar, em Fevereiro, uma rectificação ao Orçamento Geral do Estado. O novo documento antecipará menos 12,3 mil milhões de euros em receitas petrolíferas, com a previsão do barril de crude a cair para 40 dólares (era de 81 dólares no primeiro OGE). A despesa pública terá de adaptar-se a este nível de receitas e antecipa-se um corte, entre outras rubricas, nos subsídios aos combustíveis. “A recente redução dos subsídios aos preços dos combustíveis deverá também permitir alguma margem de actuação de política orçamental”, indica a economista Luísa Teixeira Felino, num estudo do BPI.

Esta semana, as agências de rating alertaram para o impacto em Angola da descida do petróleo e ameaçaram com cortes na notação financeira do país. A Fitch antecipa que o país cresça 3% este ano, cerca de um terço do crescimento previsto pelo Governo.

Em declarações à Lusa, a directora do grupo de análise do crédito soberano, Carmen Altenkirch, avisou que o rating de Angola pode ser revisto em baixa: “O impacto no rating depende, em última análise, de como o Governo vai responder, de como e se são feitos cortes na despesa e se o défice orçamental é limitado”, sustenta.

A Moody's segue a mesma linha. Lucie Villa, analista desta agência, não acredita que Angola consiga manter o crescimento previsto antes pela agência de notação: 5,5%. E a Standard & Poor's anunciou que vai actualizar a avaliação da dívida soberana angolana a 13 de Fevereiro, remetendo comentários para essa data.

Em 2009, quando o petróleo também entrou em queda livre, Angola acabou por pedir auxílio financeiro ao FMI. Desta vez deverá ser diferente. O estudo do BPI indica que a economia angolana está mais diversificada. As actividades petrolíferas valem hoje 30% do PIB, contra 48% em 2007. Por outro lado, o nível de reservas internacionais é “bastante mais confortável”. Asseguram agora sete meses de importações, mais dois meses do que em 2008.

Houve ainda a constituição do Fundo Soberano de Angola, cujo capital também pode ser utilizado, se necessário. E a taxa de inflação encontra-se no limite inferior do objectivo do Banco Central, “deixando margem para uma eventual desvalorização do kwanza de forma a proteger as reservas internacionais”.

*com Sara Ribeiro

joao.madeira@sol.pt

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