"Segundo alguns autores, as origens do Carnaval madeirense remontam ao período áureo da produção de açúcar, no século XVI, e a sua ligação aos escravos", disse à Lusa o historiador Alberto Vieira, do Centro de Estudos de História do Atlântico, salientando que se trata de uma "mistura de tradições pagãs, europeias e africanas".
Alberto Vieira explicou que quando se iniciou a expansão do açúcar no Atlântico, a partir da ilha, com ele viajaram também as tradições e expressões lúdicas, pelo que poderá haver influência da Madeira nas festividades carnavalescas do Brasil.
Na ilha, o Carnaval passou por várias fases antes de atingir o estatuto oficial de cartaz turístico, na década de 80 do século XX.
Este ano, o Governo Regional investiu 280 mil euros nas festas e prevê uma ocupação hoteleira de 71%. A organização envolve 4.000 pessoas, das quais cerca de 1.500 participam no Cortejo Alegórico de sábado, 14 de Fevereiro, o mais divulgado pelas autoridades.
O Carnaval na Madeira tem história. Actualmente, está marcado por três momentos: a Festa dos Compadres, no concelho de Santana (norte da ilha), que decorre este fim-de-semana; o Cortejo Alegórico, no sábado (14 de Fevereiro), e o Cortejo Trapalhão, na terça-feira (17 de Fevereiro), ambos no Funchal.
A Festa dos Compadres assinala o arranque das celebrações. Consiste num confronto entre bonecos (o compadre e a comadre) que se acusam mutuamente e vão revelando as falhas e os pecados de cada um. No final, os dois são queimados como punição, aliviando assim as tensões sociais e preparando a comunidade para um novo ciclo.
Esta festividade insere-se nos antigos rituais de passagem do inverno para a primavera e tornou-se popular a partir dos anos 60 do século XX. Actualmente, é um cartaz do concelho de Santana, aonde se deslocam milhares de pessoas para assistir ao "julgamento" dos compadres.
O Cortejo Alegórico, o mais divulgado e utilizado na promoção turística, remota aos anos 70 do século XX. Inicialmente, era organizado pela Juventude Católica, mas em 1980 foi incluído no programa da Direcção Regional de Turismo e acabou por se "profissionalizar".
Alberto João Jardim, presidente demissionário do Governo da Madeira, foi durante vários anos participante activo neste desfile.
O Cortejo Trapalhão, na terça-feira de Entrudo, é considerado mais autêntico e o que melhor espelha a tradição carnavalesca madeirense, quando as ruas se enchiam de gente disfarçada com roupas velhas, máscaras artesanais e caras pintadas com fuligem. Este estilo popular, nascido nos finais do século XIX, contrastava com os bailes privados que decorriam em casas apalaçadas e nos hotéis de luxo.
Na primeira metade do século XX, os mascarados concentravam-se na Rua da Carreira, no centro do Funchal, onde acontecia uma batalha de ovos, farinha, água, serpentinas e 'confetti'. Os excessos que aqui se cometiam eram de tal ordem graves que, em 1910, o Governo Civil emitiu um edital com proibições. Mais tarde, em 1948, foi também proibido o uso de máscaras e os travestis.
A batalha carnavalesca da Rua da Carreira terminou no final dos anos 40, mas os madeirenses continuaram a usar máscaras e disfarces e a percorrer as ruas nos dias de Carnaval, sendo habituais os "assaltos" a casas particulares, forçando os proprietários a oferecer mal-assadas (uma das iguarias típicas da época) sem nunca revelar a identidade.
Na década de 70, grupos mais ou menos organizados de foliões voltam às artérias do Funchal, em memória dos tempos da Rua da Carreira, e assim nasceu o Cortejo Trapalhão. Tal como o Cortejo Alegórico, percorre as avenidas marginais exibindo os mais variados disfarces e críticas sociais.
Lusa/SOL