Fim da austeridade está por comunicar

A austeridade acabou. Mas a mensagem não está a passar. Com os números a dar sinais de uma economia a recuperar, o Governo quer virar a página e concentrar o discurso no crescimento. Mas dentro do próprio Executivo reconhece-se que a comunicação não tem sido eficaz e teme-se que António Costa possa beneficiar disso.

Fim da austeridade está por comunicar

“Que este Governo não tem competência para comunicar é um facto”, desabafa uma fonte governamental. 
“Houve 10 mil milhões de corte na despesa, uma coisa nunca vista em 40 anos de Democracia, em 2014 não houve aumento de impostos e houve mais receita graças ao combate à fraude, baixámos o IRS das famílias e aumentámos o salário mínimo”. A lista dos feitos da equipa de Passos serve para tirar uma conclusão: “já mudou alguma coisa”. Mas em vários ministérios há a percepção de que os ganhos não estão ainda a ser bem comunicados.

Indefinição da coligação prejudica mensagem

“O discurso da austeridade acabou, só que é difícil passar a mensagem”, concorda outra fonte do Governo, lembrando que ainda esta semana o ministro Pires de Lima se queixava disso mesmo no Jornal de Negócios. “O próprio ministro dizia que as notícias não passam e os empresários dizem-lhe que desconhecem, por exemplo, o funcionamento do Banco de Fomento”.

As explicações apontadas dentro do Governo para estas dificuldades comunicacionais são vagas, mas há quem ache que a indefinição em torno da renovação da coligação não está a ajudar. “As pessoas estão à espera de uma melhor clarificação da coligação. E, a partir daí, poderão mais facilmente cerrar fileiras em torno das bandeiras do Governo”, analisa um secretário de Estado.

Para tentar contrariar a tendência, Passos pôs ministros e secretários de Estado a falar nas Jornadas do Crescimento do PSD.  “Andaram pelo país inteiro a passar a mensagem”, aponta um membro do Governo ao SOL.

No périplo pelo país, o secretário de Estado das Finanças Manuel Rodrigues foi mesmo a Braga dizer que o Executivo continua a ter “a ambição de conseguir que Portugal atinja o défice zero em 2018”. Mas o optimismo – fundado nos números previstos no Documento de Estratégia Orçamental (DEO) para 2014 – poucos ecos teve.

Nas Jornadas, Maria Luís Albuquerque descreveu também um país em mudança de ciclo. “As pessoas estão mais leves, sentimos que há mais consumo, sentimos que há mais carros na estrada”, disse a ministra das Finanças, que pôs a tónica na recuperação económica, sem deixar cair a importância do rigor orçamental. 
Para o Governo esse continua, de resto, a ser um ponto de honra. “Não somos populistas, não andámos a inaugurar estradas e pontes e a cortar fitas”, afirma uma fonte do Governo.

O discurso para a campanha das legislativas vai, por isso, centrar-se nas estatísticas da economia. Esta semana, chegaram mais duas ajudas: o INE revelou que desemprego desceu em 2014 face ao ano anterior e, na quinta-feira, a Comissão Europeia reviu em alta para 1,6% o crescimento da economia portuguesa em 2015.

Os sinais positivos não passaram em claro no discurso do primeiro-ministro que ainda ontem se congratulava com os dados sobre o emprego. “Os resultados que agora estamos a registar ficaram bastante melhores do que aquilo que eram as previsões”, afirmou, lembrando que os números mostram uma realidade mais próxima das estimativas do Governo do que das previsões de algumas instituições nacionais e internacionais.

A estratégia está definida: todas as oportunidades deverão servir para os membros do Governo acenarem com esses resultados, mantendo a estratégia de não alinhar na onda grega. 

Fontes do Executivo garantem ao SOL que a expectativa continua a ser a de que as tentativas da Grécia de conseguir negociar a dívida deverão sair furadas e, por isso, continua a fazer sentido a descolagem.

Na quarta-feira – ainda antes de o Banco Central Europeu anunciar ter deixado de aceitar a dívida grega como garantia nos empréstimos aos bancos – já Passos Coelho voltava a insistir na tese do “conto de crianças” em relação às exigências do Governo de Tsipras. “Não existe no mundo nenhum sistema em que o país tenha a dívida que entende e que possa ter mais dívida sem que os seus credores digam que a dívida não pode ser paga”, reforçou o primeiro-ministro.

margarida.davim@sol.pt