Donativos do PS desviados para quotas

Militantes e dirigentes do PS assumiram ao Ministério Público que dinheiro de donativos ao partido foi usado para pagar quotas de militantes da federação de Coimbra, de forma a estes poderem votar nas eleições para a direcção distrital, em 2010.

Os factos foram apurados num inquérito do Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Lisboa, que decidiu arquivar o caso e apenas notificar a Entidade das Contas e Financiamentos Políticos por considerar que a situação não é crime, podendo apenas ser motivo para aplicar multas ao partido.

O inquérito tem como arguido André Figueiredo, deputado do PS e à época secretário nacional adjunto do PS com o pelouro da organização, e foi aberto na sequência de acusações que este trocou com Vítor Baptista, ex-líder do PS-Coimbra, que perdeu as eleições de 2010 na distrital, por dois votos. Na altura, Baptista acusou Figueiredo de se ter imiscuído nas eleições distritais e ter praticado irregularidades para favorecer o seu adversário, Mário Ruivo. Após a derrota, denunciou que Figueiredo até lhe propusera não se candidatar, em troca de um lugar de gestor numa empresa pública – uma «calúnia», segundo este, que acusou Baptista de outras irregularidades.

O DIAP investigou, por isso, vários crimes: tráfico de influências, fraude em eleição, falsificação, financiamento ilícito partidário e até abuso de confiança, burla e infidelidade. Quatro anos depois, foi tudo arquivado – inclusive a alegada oferta de um cargo num empresa pública, conversa de que não há registo nem testemunhas, tendo os intervenientes versões opostas.

Quanto ao resto, o MP interrogou militantes e actuais e antigos dirigentes do PS, que assumiram a prática de 'desviar' dinheiro de donativos para o pagamento de quotas. Nesta eleição em Coimbra, foram pelo menos 22 mil euros que serviram para pagar as quotas de 135 militantes, a tempo de poderem votar nas eleições.
Por lei, os donativos e quotas têm de ser devidamente identificados e os partidos são obrigados a manter contas bancárias separadas: uma para os donativos e outra para o dinheiro das quotas. Aqui, houve dois cheques de donativos (cerca de 7.000 euros) entregues a André Figueiredo e depositados na conta do PS relativa às quotas; e ainda cerca de 14 mil euros resultantes de alegadas «acções de angariações de fundos» em Coimbra que foram regularizados com recurso a cheques passados por pessoas amigas dos dirigentes e militantes (receberam o dinheiro e passaram cheques naquele valor), depois depositados na conta das quotas. 

Para o DIAP, isto não constituiu crime, pois o PS não saiu lesado – uma vez que se comprovou que todas as quantias passaram «a integrar o património do partido». Quando muito pode tratar-se de uma irregularidade.
Ao SOL, a Entidade das Contas informou que foi notificada, mas «aguarda o desfecho do processo», que entretanto está em fase de instrução, na sequência de um recurso de Vítor Baptista, que defende haver financiamento ilícito partidário.

paula.azevedo@sol.pt