Boxe: Um tira-teimas milionário

A Fórmula 1 viu em Ayrton Senna e Alain Prost a maior rivalidade sobre rodas. Andre Agassi e Pete Sampras protagonizaram batalhas épicas nos campos de ténis. Lance Armstrong e Jan Ulrich fizeram faísca na Volta a França em ciclismo. Michael Jordan e Magic Johnson deram outra dimensão à NBA. E agora há Cristiano Ronaldo…

A história do desporto está marcada por vários duelos emblemáticos e o boxe não é excepção. Cinco anos depois do início de intensas negociações, picardias, confirmações e desmentidos, os dois maiores nomes da modalidade na última década aceitaram medir forças no dia 2 de Maio, na Arena MGM Grand, em Las Vegas. Floyd Mayweather e Manny Pacquiao chegaram finalmente a acordo e vão protagonizar a luta mais aguardada desde aquele que foi considerado como o «combate do século», entre Muhammad Ali e Joe Frazier – dois ícones do pugilismo mundial -, em 1971.

Os contornos do evento são, no mínimo, milionários, uma vez que envolvem verbas na ordem dos 220 milhões de euros. E o lucro, segundo as previsões, será histórico. Se em 2009 a vitória de Mayweather sobre Canelo Alvarez rendeu 17,6 milhões de euros, um valor recorde, neste duelo a organização espera amealhar o dobro: cerca de 35 milhões de euros. Não é de estranhar. O preço mínimo de um bilhete ronda os 3200 euros para o público em geral.

A euforia em torno do duelo tem uma explicação: de um lado estará um norte-americano oito vezes campeão mundial de boxe que nunca conheceu o sabor da derrota desde que se tornou profissional; do outro um filipino que conquistou de forma inédita o título de melhor do mundo em oito categorias de peso diferentes. Um tira-teimas milionário para descobrir quem é o melhor pugilista do mundo no escalão de meio-médio (até 66,7 kg).

Pacquiao manifestou nos últimos anos a intenção de realizar o combate, mas esbarrava sempre na vontade e nas condições impostas por Mayweather, também conhecido pela alcunha de Money, por viver rodeado de luxo e ser o desportista mais bem pago do mundo. A única forma de o convencer foi atender todas as suas exigências: ter direito a 60% das receitas (contra 40% do rival) e obrigar o filipino a submeter-se a um controlo antidoping completo, como se estivesse nos Jogos Olímpicos, e a usar umas luvas próprias.

Mayweather ficou também com o privilégio de anunciar em primeira mão o acordo e mostrar o contrato assinado. «Aquilo que o mundo esperava vai chegar. Vamos fazer história dia 2 de Maio. Não percam!», escreveu o lutador nas redes sociais.
Do outro lado das cordas, Pacquiao escreveu no Twitter: «Dedico esta luta a todos os fãs que a ambicionaram e espero enaltecer as Filipinas».

Marcados pela infância

Emmanuel Dapidran Pacquiao nasceu nas Filipinas, um país onde 40% da população tem menos de dois euros por dia para comer. Como os pais eram separados, foi obrigado a trabalhar desde muito cedo para ajudar a alimentar os cinco irmãos mais novos. Chegou a vender donuts e água fresca durante a madrugada. «Às vezes dormia numa caixa de cartão», conta hoje o filipino de 36 anos, também conhecido por Pac-Man, que se tornou lutador profissional aos 16 anos.

Não muito diferente é a história de Floyd Mayweather, que enfrentou uma infância pobre em New Jersey. A falta de electricidade era o menos – pior era a quantidade de seringas espalhadas em casa, o número de toxicodependentes que se juntava no quintal ou as chicotadas que diz ter sofrido do pai. Fez da academia de boxe o seu refúgio e aos 19 anos atingiu a sua primeira conquista pessoal: a medalha de bronze na categoria -57 kg das Olimpíadas de Atlanta (1996). Era ainda amador quando ganhou também a alcunha de Pretty Boy, por sair dos combates sem mazelas no corpo.

hugo.alegre@sol.pt