Duarte Pacheco: ‘Conseguimos quase o mesmo sem o impacto mediático do Syriza’

Deputado do PSD assegura que Portugal conseguiu mais tempo e menos juros, mantendo a postura de bom aluno e que os ganhos da Grécia são mera semântica, mas admite que prestar contas à troika foi humilhante

Duarte Pacheco: ‘Conseguimos quase o mesmo sem o impacto mediático do Syriza’

A negociação da Grécia com o Eurogrupo mostra que não havia alternativa ao caminho do Governo português?

Ainda bem que houve acordo. É bom para a Europa, para a Grécia e para Portugal. O pior que podia acontecer era uma ruptura. O que já deu para perceber há que há ali uma semântica para consumo interno.

Há mais marketing político do que substância no Syriza?

Há. Até ao momento, sim. Deixar de usar a palavra troika para falar em instituições é a cereja no topo do bolo dessa alteração semântica. Na prática é a mesma coisa. Não é diferente daquilo que Portugal foi conseguindo ao longo dos anos sem porventura o impacto mediático do Syriza.

Portugal fez o mesmo sem a mesma eficácia de comunicação?

Não sei se não será só uma eficácia de curto prazo. Não sei se o povo grego vai ficar muito satisfeito a pensar que tem uma coisa substancialmente diferente para depois constatar que afinal não é assim. A comunicação, se não corresponde aos factos, pode ser muito eficaz no curto prazo, mas leva a um enorme desencanto. 

O que é que conseguimos que se compare ao alcançado pela Grécia?

A maturidade dos empréstimos: era para pagar a 15 anos, deram-nos mais sete. Conseguimos taxas de juro mais baixas do que as previstas. E conseguimos um deslizamento das metas, tal como o que se está a prever para a Grécia. De acordo com o tratado inicial, já tínhamos de ter um défice abaixo dos 3% há dois anos.

Mas Maria Luís não tem a mesma imagem que Varoufakis.

Isso é um problema do Varoufakis (risos). Portugal já devia ter o défice abaixo dos 3%, mas para atingir esse valor era preciso reforçar a austeridade e os nossos parceiros foram sensíveis às dificuldades.

Portugal não é o bom aluno que aceita tudo?

Somos o bom aluno no sentido de termos mantido uma trajectória e não termos vacilado.

O BE tem um cartaz que diz que o Governo é mais alemão do que os alemães. Não faz sentido?

Não faz sentido nenhum. Nós cumprimos e os nossos parceiros perceberam as dificuldades no ajustamento. Podem dizer que deviam ter compreendido ainda mais, mas estamos a falar de graduação. Se o défice do ano passado em vez de ficar abaixo dos 4% ficasse nos 5%, havia medidas que não teriam sido necessárias. Mas isso significava mais 1.700 milhões de dívida. E não é justo atirar dívida para cima das gerações futuras.

Juncker fez bem em fazer um acto de contrição? A troika ofendeu a dignidade de Portugal?

Fico com a sensação de que existiu alguma hipocrisia neste processo. Assistimos com muita frequência ao discurso de dirigentes, como a Sra. Lagarde, a criticar a austeridade, mas depois víamos os técnicos no terreno a exigir o cumprimento escrupuloso do que estava escrito. Já depois do programa de ajustamento, a própria Comissão Europeia criticou Portugal por ter aumentado o salário mínimo. Convém que antes de falarem sintonizem o discurso.

PSD e CDS também não estiveram alinhados na reacção a Juncker…

Não. Não entendo assim. A nossa dignidade não foi posta em causa porque as decisões foram sempre tomadas pelo Governo português. Mas numa situação de humilhação por termos tido de pedir ajuda externa. Um governo democraticamente eleito presta contas de quatro em quatro anos. Este Governo esteve a prestar contas de três em três meses às instituições internacionais – para usar a nova nomenclatura – ou seja, à troika. Isto é humilhante.

Maria Luís fez mal em aparecer ao lado de Schäuble?

O Governo português tem sido coerente, dizendo que o que está a fazer resultou do estado calamitoso a que o país chegou em 2011. Sabíamos que não eram medidas expansionistas, que tinham carácter recessivo, mas foram tomadas na sequência da pré-bancarrota. E estamos a caminhar para sair do procedimento por défice excessivo, suavizando a austeridade.

E isso nota-se em quê?

Na devolução de 20% dos cortes nos salários aos funcionários públicos, no aumento das pensões mínimas, no fim da CES, no IRS mais baixo para as famílias numerosas, no IRC mais baixo para as empresas, na possibilidade do IMI contemplar a componente familiar.

A dívida continua em 128% do PIB. É sustentável?

Claro que é. São os nossos credores a dizê-lo. Houve um crescimento da dívida. Mas se estamos a falar de décimas, não é relevante. O relevante é fazer a análise da tendência. Há quatro anos não havia depósitos no Tesouro. Não havia dinheiro para pagar salários e pensões no mês seguinte. Hoje, há reservas no Tesouro superiores a 10% do PIB. Se eu estiver a dever 100 mil euros, mas tiver 50 mil no banco em poupanças, a minha dívida real é 50 mil.

Portanto, não são os tais 128%?

Tem de se tirar 10%. Depois, temos de lembrar que houve um alargamento do perímetro da dívida. O que aconteceu com a complacência do Eurostat durante muitos anos, aqui, na Grécia, em Espanha e em muitos outros países, foi que havia dívida que era desorçamentação pura. O PS diz muitas vezes que em 2007 tivemos o défice mais baixo da História, abaixo dos 3%. Mas se não se transferir dinheiro para as empresas de transportes públicos, essas empresas vão endividar-se. Não aparecia no défice, mas é dívida dos portugueses porque eram empresas públicas. A mesma coisa com os hospitais.

Havia dívida escondida?

Aqui e, para sermos sérios, na Madeira e em autarquias de todas as cores políticas.

A despesa ainda tem de descer?

Vai ter de descer. Estamos com um saldo primário positivo, pelo segundo ano consecutivo. O Governo cortou mais de 10 mil milhões de despesa. Foi uma contribuição de cerca de dois terços, sendo um terço pelo aumento de impostos. Mas é através dessa redução de despesa que podemos ansiar a redução de impostos.

Falta fazer a reforma do Estado?

A reforma do Estado obrigará a um acordo alargado. Temos de identificar se existem funções que o Estado se deve abster de exercer.

Repensar as funções do Estado obriga a um pacto de regime?

Eu acho que é fundamental que essa reforma mais cedo ou mais tarde ocorra e tem de ocorrer sem a demagogia que o PS demonstrou nesta legislatura, ao fugir a qualquer entendimento. A Suécia é um exemplo: tem um governo minoritário social-democrata, mas o principal partido da oposição comprometeu-se a durante a legislatura aprovar todos os orçamentos e o partido social-democrata a viabilizar também todos os orçamentos numa próxima legislatura, se o partido conservador for governo. O PSD teve este sentido de responsabilidade durante os mandatos de Guterres, com Marcelo e Durão como líderes, porque o interesse do país era assegurar a entrada no euro.

Por que é que o CDS aparece como partido do alívio fiscal e o PSD como o partido da austeridade?

Não é verdade. Os dois partidos estão bem presentes no Ministério das Finanças. E estão ambos a trabalhar em equipa para conter a despesa pública e ter as receitas fiscais necessárias.

PSD e CDS estão a trabalhar bem em equipa?

Não são partidos iguais. Se não, havia uma fusão. É natural que tenham preocupações diferentes. Mas tirando aquele período de crise que vivemos em 2013, o balanço é altamente positivo.

Deve haver coligação?

Depois das eleições, não tenho dúvidas. Antes, depende dos órgãos próprios do partido que estarão a avaliar as questões.

Duvida de um acordo pré-eleitoral?

Os partidos ainda não tomaram essa decisão. Não me compete substituir-me aos seus órgãos.

Acredita na vitória nas legislativas?

Tenho esperança de que os portugueses percebam que o esforço que todos fizemos valeu a pena e que não queiram voltar atrás. Como se viu com o governo grego, uma coisa é prometer tudo a todos, outra coisa é poder fazê-lo.

Passos Coelho prometeu em campanha coisas que não cumpriu…

Sim, é verdade. Houve uma alteração das circunstâncias. Apareceram dívidas com que não se esperava. Até numa região autónoma liderada pelo PSD, a Madeira.

O que se prometer nesta campanha será mais realista?

Estou convencido de que o escrutínio hoje é muito maior e as pessoas já não se deixam enganar.

O que é que se pode prometer?

(risos) O programa terá de ser apresentado pelo presidente do partido.

margarida.davim@sol.pt