Jogo de espelhos em Nou Camp

A equipa não rende, a estrela da companhia está em queda, os resultados não aparecem. O treinador perdeu a mão no balneário e tem os dias contados. O que foi válido para o Barcelona na primeira metade da temporada é agora a realidade no Real Madrid, em vésperas do clássico em Nou Camp que pode…

Jogo de espelhos em Nou Camp

À imagem de Cristiano Ronaldo e Lionel Messi, os dois maiores clubes de Espanha têm feito uma campanha em sentidos opostos, com os catalães a surgirem agora na mó de cima e os merengues mergulhados num clima depressivo. Na prática, porém, estão separados por um escasso ponto no topo da classificação e o duelo na Catalunha dará ao Real Madrid a oportunidade para alterar o rumo da prova.

Foi o que o Barça conseguiu fazer nos primeiros três meses de 2015, aproveitando a quebra do rival para recuperar a liderança após 16 jornadas na perseguição. A equipa madrilena tem sido incapaz de impor o seu futebol em tempos recentes e só ganhou três dos últimos seis jogos para o campeonato, tal como tinha acontecido com os catalães entre a quinta e a décima jornadas.

A possível saída do técnico Luis Enrique dominou então as manchetes na Catalunha, mas hoje é a cabeça de Carlo Ancelotti que se encontra a prémio. Segundo o jornal Marca, o homem que levou o Real à 10.ª Liga dos Campeões pode nem passar do clássico em caso de derrota. A única nuance é que o espanhol era visado por autoritarismo excessivo – os relatos de que Messi o terá ameaçado nunca foram desmentidos –, enquanto o italiano é acusado de ser demasiado permissivo com os seus pupilos.

“A mão frouxa permitiu-me ganhar três Champions”, ironizou Ancelotti ao ser confrontado com a crítica, após uma monumental assobiadela no empate caseiro com o Villarreal (1-1), no início deste mês.    

As coincidências entre o percurso de Real Madrid e Barcelona estendem-se ao desempenho das maiores figuras. Cristiano Ronaldo deixou de marcar golos ao ritmo da primeira volta – a média de 1,79 por jogo no final de Dezembro baixou para 0,5 em 2015 –, repetindo os desencontros com a baliza que tinham afectado Lionel Messi entre a segunda e a 11.ª jornadas. Cinco golos em 10 partidas foi o fraco pecúlio do argentino nessa fase, o mesmo que regista agora o português.

Com a chegada do novo ano, e depois da entrega da Bola de Ouro a Ronaldo, Messi apareceu com energia e ambição renovadas e o efeito de contágio foi imediato no futebol do Barcelona. “Era um desafio mudar a imagem que tinha dado no ano anterior e voltar a ser o que fui”, assumiu em entrevista recente.

Os catalães passaram a jogar com maior confiança e as vitórias sucedem-se, na mesma proporção que se acumulam os amuos de Ronaldo e os desaires do Real Madrid. Ainda no fim-de-semana passado o português mal festejou um golo de Gareth Bale, só porque podia ter sido ele a marcar momentos antes. Também não escondeu o seu desagrado perante uma reacção negativa dos adeptos, o que lhe tem custado muitas críticas nas redes sociais. Só falta começarem a surgir rumores sobre uma eventual saída no final da época, como aconteceu com Messi quando mal se via em campo e chegou a ser relegado para o banco de suplentes.

Média de Ronaldo chegou a superar os dois golos por jogo

O percurso do Real Madrid e do Barcelona ao longo da época, segundo pode depreender-se também dos dados estatísticos, acaba por espelhar o rendimento de Ronaldo e Messi.

O português arrancou com grande fulgor e exibiu-se a um nível extraordinário até ao fim do ano, chegando a apresentar uma média superior a dois golos por jogo – o que impulsionou o Real Madrid para o topo da classificação. Desde Janeiro, porém, a sua eficácia caiu a pique e a equipa ressentiu-se.

Já Messi demorou a entrar no ritmo, perdeu-se em conflitos com o treinador e passou ao lado das decisões dentro das quatro linhas, até que decidiu começar a jogar à bola. Em Dezembro tinha menos nove golos marcados do que Ronaldo, hoje soma mais dois.  

É neste contexto que surge o clássico de Nou Camp: Messi e Barcelona em alta; Ronaldo e Real Madrid em quebra. A boa notícia para a incerteza da Liga espanhola é que, se há jogos que podem justificar o chavão ‘no futebol tudo muda de um dia para o outro’, este é com certeza um deles.

rui.antunes@sol.pt