A hora de Mariana

O inquérito parlamentar às trafulhices milionárias do caso BES/PT trouxe para a ribalta uma deputada que já dera nas vistas por outros motivos, mas que obteve ali a consagração pública, justa e merecida. O seu desempenho recebeu elogios de todos os quadrantes, granjeou-lhe o respeito dos pares e o mal disfarçado temor dos inquiridos, alguns…

No esplendor dos seus 28 anos, Mariana Mortágua, economista de formação e doutoranda numa universidade londrina, é a mais jovem parlamentar em exercício. Não impressionou somente pelo domínio dos assuntos, mas também pela segurança, pela argúcia e, acima de tudo, pela forma corajosa e quase sempre desafiadora com que, olhar duro e displicente, confrontou os antigos donos disto tudo. Formular perguntas simples mas carregadas de sentido e oportunidade, ou comentários desarmantes, como o que cobriu de ridículo o incrível gestor Bava, subitamente desmemoriado, pode parecer de somenos numa conversa de café. Não o é numa comissão parlamentar de inquérito. Sobretudo quando se tem 28 anos e, pela frente, gente batida na arte da dissimulação, que tanto ajudou alguns a fazerem carreira e fortuna, sentados em cadeirões de chairmen e CEO.

Mariana é deputada pelo Bloco de Esquerda, um partido ainda recente, mas que, apesar de todas as causas fracturantes de que se foi alimentando, até as esgotar, não é menos velho do que os outros. Tanto que a escolha da jovem doutoranda foi contestada internamente com o argumento de que não pode “um partido de esquerda (…) orientar a sua escolha por um critério tecnocrata – ser economista”. Como se a preparação técnica de um deputado fosse um factor menor a considerar na composição de uma bancada, de esquerda ou de direita. Como se fosse indiferente um membro do Parlamento saber ou não do que fala.

A indicação de Mariana implicou a renúncia de nove candidatos que a precediam na lista do BE por Lisboa. Gerou incómodos, frustrou expectativas e talvez tenha perturbado os arranjos aparelhísticos para a preservação do equilíbrio num partido que, deste ponto de vista, é ainda mais problemático do que os outros – ou era, antes das sucessivas debandadas.

E, no entanto, a escolha revelou-se tão acertada que é hoje um exemplo da renovação necessária nos partidos. Uma renovação geracional que não se limite a quotas de jovens mais velhos do que os velhos. Uma renovação que não decorra somente do percurso nas 'jotas' e dos favores à direcção de serviço. Uma renovação pela competência, que obedeça a esta espécie de lema que Mariana enunciou há umas semanas na sua página do Facebook: “Estudar, discutir, propor, mudar”. Faz-se por aqui a renovação que faz falta. Tanto à esquerda como à direita.

Por conta própria

Pode ser que Henrique Neto tenha uma votação irrisória, ou que nem formalize a candidatura presidencial que anunciou. Mas, ao apresentar-se quando entendeu, sem esperar por este ou por aquele, sem fazer contas aos apoios a receber, sem cair no jogo infantil dos que se vigiam uns aos outros enquanto esperam pelo amén de terceiros, já prestou um serviço à República, mostrando que não vê a eleição presidencial como extensão das legislativas, ou o seu contraponto. Se assim fosse, como parecem entender os protocandidatos que gastam as meninges em cálculos e cogitações, não precisávamos de votar num Presidente. Bastava que o Parlamento o elegesse segundo directivas da maioria. Como no tempo da outra senhora.

Aviso para o Outono

Os resultados das eleições na Madeira não permitem extrapolações para o continente, porque é diferente o quadro partidário, assim como os protagonistas. Mas confirmam e acentuam uma tendência: a abstenção galopante (menos de 50 por cento de votantes) e o declínio brutal dos partidos 'tradicionais'. Com excepção da CDU e do BE, todos perderam votos e deputados em relação a 2011, incluindo o 'novo' PSD de Miguel Albuquerque, com 15 mil votos abaixo do mínimo de Alberto João Jardim. O PS sofreu uma derrota humilhante e a grande surpresa foi um novo partido, nem de esquerda nem de direita, nascido de um movimento de cidadãos, o Juntos Pelo Povo. Mais um aviso para o Outono.