Corte da despesa está apenas no início

As medidas anunciadas pelo Governo de José Sócrates são apenas o início da redução de despesa que será necessário levar a cabo até 2012. Para que se atinja um défice de 3% do produto interno bruto (PIB) nesse ano, vai ser preciso fazer um esforço adicional de 2,6 mil milhões de euros.

se não se aumentarem mais impostos, o executivo ainda vai ter de cortar despesas equivalentes à eliminação do 13.º e do 14.º mês na função pública, por exemplo, ou reduzir 10% nas despesas do serviços e fundos autónomos.

vários economistas alertam que será necessário impor novas medidas de austeridade. miguel frasquilho, economista e deputado social-democrata, é um deles. em declarações ao sol, o antigo secretário de estado do tesouro de manuela ferreira leite defende que «não há dúvida de que será necessário cortar mais despesa para reduzir o défice em 2012».

eduardo catroga, ex-ministro das finanças, afirma que «não falaria verdade se dissesse que [estas] são as últimas medidas de redução da despesa pública; infelizmente não vão ser». para o antigo ministro de cavaco silva, portugal precisa «de um estado eficiente e que seja sustentável e este não é uma coisa nem outra». por isso, é «preciso simplificar estruturas, simplificar a organização do governo, simplificar a assembleia da república, reduzir, optimizar direcções-gerais, institutos, empresas municipais, regionais».

onde cortar?

depois do pacote de 3,4 mil milhões de cortes de despesas anunciado esta semana pelo primeiro-ministro e pelo ministro das finanças para 2011, onde pode o executivo eliminar mais despesa? cerca de 76% da despesa corrente das administrações públicas dizem respeito a gastos com pessoal e a prestações sociais, pelo que uma consolidação orçamental pelo lado da despesa tem de actuar necessariamente, como reconhece a generalidade dos economistas, nestas rubricas, reduzindo vencimentos, apoios sociais ou pensões. em qualquer dos países que estão mais empenhados em reduzir os défices orçamentais, este foi o caminho.

esperar para ver e apostar no prace

o próprio secretário de estado do orçamento, emanuel dos santos, admitiu, em declarações à tsf, que não está excluído por agora um novo corte salarial da função pública em 2012. tudo vai depender da evolução da economia, podendo, por isso, numa perspectiva optimista, haver até um congelamento ou um eventual aumento.

a reforma da administração pública terá ainda margem para ter resultados. das medidas anunciadas na quarta-feira após o conselho de ministros extraordinário, a redução das despesas com indemnizações compensatórias, dos subsídios às empresas, a extinção ou fusão de organismos e a racionalização das empresas públicas é a que tem menos impacto orçamental: vale apenas 0,1% do pib, cerca de 170 milhões de euros.

mas o consumo intermédio (aquisição de bens e serviços como comunicações, viaturas, consumíveis, etc.), que representa 4,7% do pib, é uma alternativa para a política de cortes de despesa.

de acordo com o último balanço do programa de restruturação da administração central do estado (prace), existem 331 institutos e direcções-gerais, com 4.516 dirigentes. segundo cálculos do sol, reduzir em 10% as despesas de todos os serviços e fundos autónomos que recebem dinheiro do orçamento do estado poderia gerar uma poupança de 2,7 mil milhões de euros. mas esta rubrica contém outros organismos além de institutos. entre eles estão alguns que asseguram serviços essenciais, como o pagamento de pensões ou hospitais públicos que não foram empresarializados.

empresas municipais

outro campo de actuação está nas empresas municipais. o último levantamento da ordem dos técnicos oficiais de contas, feito no ano passado, apontava para a existência de 219 empresas municipais e 30 serviços municipalizados. o total de custos destas entidades ultrapassa os mil milhões de euros, pelo que um corte de 10% geraria uma poupança de 100 milhões de euros e poderia permitir reduzir menos as despesas de investimento.

o imposto municipal sobre imóveis (imi) pode ser visto como alternativa, se a consolidação for feita pelo lado da receita. o secretário-geral da organização para cooperação e desenvolvimento económico sugeriu esta semana a portugal o agravamento da tributação deste imposto e a utilização da folga para reduzir as contribuições que as empresas fazem para a segurança social.

joao.madeira@sol.pt
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