Pobres políticos

O Ministro Miguel Macedo e o secretário de Estado José Cesário prescindiram nesta semana do subsídio de alojamento a que legalmente tinham direito.

e abdicaram daquele subsídio (componente significativo nas suas remunerações mensais) por terem casa própria em lisboa, apesar de os seus domicílios fiscais e familiares serem em braga e em viseu, respectivamente. macedo e cesário, não fosse o caso de exercerem funções políticas, não residiriam, de facto, em lisboa.

o ministro aguiar-branco, num gesto de solidariedade para com os seus dois colegas do governo, também renunciou ao respectivo subsídio de alojamento, embora resida no porto e não tenha casa própria na capital ou arredores.

pela lei, o subsídio de alojamento é devido a quem é obrigado a deslocalizar-se da sua área de residência por força das funções que lhe são confiadas. ora, se esse subsídio é gasto na compra de casa própria, na estadia num quarto de hotel, no arrendamento de um apartamento ou de um palacete, ou até numa tenda… quem tem a ver com isso?

se o subsídio de alojamento está previsto na lei e é devido, tem de ser igual para todos – sejam ou não proprietários de uma ou mais casas nos sítios para os quais são obrigados a deslocalizar-se.

se questão, eventualmente, existe, é o próprio subsídio de alojamento. é esse que deve questionar-se. para todos!

o problema é que o subsídio de alojamento, e outras regalias igualmente questionáveis e inerentes a alguns cargos ou funções, só existem porque são formas (esquemas) de compensar os políticos no exercício de funções pelo baixo salário que efectivamente recebem.

porque é uma realidade: por mais politicamente incorrecto que seja ou por mais aviltante que para muitos possa parecer, os titulares de cargos políticos, em termos exclusivamente de vencimento-base, são mal pagos.

e a falta de coragem política para aumentar os salários dos políticos, ao longo dos tempos, conduziu à invenção dos mais variados subsídios por forma a arranjar outras vias de remuneração ou compensação, quase sempre com a consequente exclusão da respectiva tributação pelo fisco. ou seja, em casos como estes, é o estado que se engana a si próprio e dá o (mau) exemplo.

acresce que aos salários dos titulares dos cargos políticos – nomeadamente os do presidente da república e do primeiro-ministro – estão indexados os salários de muitos outros funcionários públicos e os dos magistrados e, para o futuro, também os dos gestores públicos. e com esse tecto congelado faz anos, não há aumentos para ninguém. e se uns têm, aparte, mais este e aquele subsídio ou mais esta e aquela regalia, a verdade é que, assim, se falseiam todos os pressupostos de equidade e de justiça.

o pior exemplo, aliás, é o das subvenções e reformas dos políticos ou titulares de cargos políticos ou públicos, a acumulação de pensões, a contagem a dobrar para efeitos de reforma ou aposentação do tempo em que se exerce um determinado cargo político e outras benesses que a lei reconhece sem qualquer fundamento moral.

e, como é bem sabido, multiplicam-se os beneficiários aos milhares, país fora, na administração central e na local, nas empresas públicas ou participadas, em institutos ou fundações.

é um regabofe.

o único princípio justo e equitativo, em matéria de subvenções e reformas, é o de cada um receber em razão da sua carreira contributiva e na medida dos descontos que efectivamente realizou.

e é tudo menos justo e equitativo que quem estando no activo possa acumular com o seu vencimento uma reforma ou pensão – ou mais, que não faltam os exemplos.

não faz sentido que quem está no activo receba reforma ou pensão!

quem está ou regressa ao activo deve receber o vencimento a que tem direito e retomar a sua carreira contributiva até voltar à condição de reformado ou pensionista.

será, nalguns casos, injusto. mas o exercício de cargos políticos ou públicos também tem uma vertente de missão que, naturalmente, implica sacrifícios – financeiros também.

a política tem custos e benefícios que estão muito para além do salário-base de cada um. mas estes devem ser condignos, dispensando esquemas que, de uma forma ou de outra, redundam em injustiças ou amoralismos. porque é também por isso que os políticos são os primeiros a terem vergonha de assumir que ganham mal e deviam ser mais bem pagos. e é também por isso que a generalidade da população pensa exactamente o contrário.