Sobre a nova lei de cobertura das campanhas eleitorais

A lei eleitoral para a Assembleia da República nasceu em 1975. Quarenta anos de uso e dez alterações não fizeram, entretanto, dela uma coisa melhor.

Um país que se preze tem uma leitura sobre as suas principais ferramentas, observa o andar dos tempos, promove os incrementos que se impõem. A existência de cinco leis eleitorais e uma lei que enquadra os referendos diz bem do descuido, porque a máquina, os tempos e os modos de concretizar um acto eleitoral diferem consoante o período em que foi expelida cada norma.

Vem tudo isto a propósito da guerra que se alonga entre parlamentares e órgãos de comunicação social (OCS) sobre a cobertura das campanhas.

A Comissão Nacional de Eleições (CNE), esse ente que carece de refundação e de um tempo de agregação à realidade, tem vindo a impor, aos OCS e aos partidos regras que não aderem aos dias de hoje.

A primeira regra tem ligação com as novas tecnologias. Impor aos partidos o uso limitado das redes sociais, dos blogues, das listas de endereços, das mensagens de telemóvel, é uma perda de tempo, é gastar energias tentando impedir o progresso.

Todos sabemos que cada cidadão é hoje um promotor de conteúdos, que as plataformas são transnacionais e estão ao alcance de qualquer um, que o seu controlo não depende da sapiência dos juízes eleitorais portugueses. É por isso que as decisões são ridículas e quem as toma se desgradua no respeito que deveria merecer.

Mas o que mais tem levado ao descrédito da CNE é a visão redutora da igualdade de tratamento a que os OCS devem sujeitar-se perante a realidade das candidaturas.

Esta visão totalitária já impediu anteriormente a realização de debates. Só que as próximas eleições são demasiado importantes para que os portugueses fiquem sem um total conhecimento das propostas políticas das forças que se podem vir a encontrar nas soluções governativas.

O que a CNE tem feito é tratar igual o que é diferente. Em todos os países da Europa Ocidental os debates são entre os líderes das listas representadas nos parlamentos. Tal circunstância nunca levou a que se limitasse a iniciativa dos OCS, em especial das televisões, concedendo um amplo espaço de acerto entre o dever e o direito de informar e o dever de neutralidade perante um acto eleitoral.

O que devemos fazer por agora? Três coisas simples é o que se propõe.

Primeira: retirar da lei eleitoral todas as ordenações à CNE para que 'regule' o combate eleitoral no que se refere à liberdade de informar.

Segunda: garantir, unicamente, o igual tratamento no que se refere aos tempos de antena, que devem existir em todas as estações de televisão e rádio com concessão pública.

Terceira: garantir que, na verificação da independência 'imposta' à comunicação social, a ERC monitoriza, avalia a posteriori e remete ao Parlamento uma análise de desempenho dos órgãos de comunicação social.

Num mundo em aceleração máxima, a imposição legal de um procedimento que ninguém suporta resulta em desfavor de quem se quer proteger. Não deve o poder político ter medo da assunção clara, por parte de OCS, de uma preferência partidária, de uma opção clara por uma proposta política. A nossa democracia, madura e sapiente, conhece bem as implicações que essa liberdade promove.

É por isso que interessa dar o passo para a libertação das amarras. Que as televisões e as rádios se sintam livres, sem qualquer norma para além dos tempos de antena, de gerir e de assumir publicamente o seu compromisso editorial em cada eleição. E que o Estado se limite á verificação legal dos contratos de concessão que outorgou.

*Ex-Secretário de Estado da Administração Interna