Delinquência: Cada vez mais pais pedem ajuda por causa dos filhos

Comissões de menores recebem apelos de pais que não conseguem controlar filhos que começam cedo a dar problemas.

As comissões de protecção de menores têm cada vez mais casos de adolescentes com comportamentos delinquentes e cujos pais pedem ajuda porque não os conseguem controlar. Nos últimos anos, subiu o número de sinalizações deste tipo: comportamentos anti-sociais, consumo de drogas e álcool e bullying são os principais problemas detectados e que representavam já 12,4% do total dos casos seguidos pelas comissões em 2013. Percentagem que em 2007 era apenas de 1,2%.

«Eles próprios se põem em perigo e a família não se consegue opor. Alguns temos noção de que são bombas-relógio: são miúdos ‘borderline’, marcados por percursos de vida complicados e que são difíceis de travar. Sabemos que alguns podem passar ao acto, mas como os convencemos de que este não é o caminho?» – questiona Eva Teles, presidente da Comissão de Protecção de Crianças e Jovens de Benavente. A responsável pela comissão onde Daniel foi sinalizado pela primeira vez não comenta o caso, mas diz que há muitos jovens que fazem o mesmo percurso: passam por comissões de menores e instituições, mas acabam por seguir o caminho da delinquência, correndo o risco de passarem a actos mais graves e entrarem no sistema penal.

Eva Teles recorda o caso de um jovem de 18 anos que esteve institucionalizado e, quando voltou a casa, verbalizou que ia matar outro jovem por causa da namorada. «Percebi que ele podia mesmo matar. Por acaso nunca matou. Mas são jovens marcados por vidas complicadas e muito difíceis de trabalhar.Noutros, o sistema investe e eles agarram a oportunidade».

Josefina Castro, subdirectora da Escola de Criminologia da Universidade do Porto, diz que «uma parte significativa dos meninos que chegam ao sistema tutelar educativo (onde são punidos pela prática de ilícitos) têm um historial marcado por entradas e saídas do sistema de promoção e protecção» (onde actuam as comissões de menores).

Há crianças, uma minoria, cujos problemas de agressividade começam aos cinco anos. «Pode ter a ver com factores individuais. Mas se os meios envolventes forem protectores e a família ajudar, consegue-se conter este comportamento», afirma. Se, pelo contrário, se juntarem factores de risco, como exposição a violência, álcool, droga e problemas de saúde mental, podem chegar à adolescência já com comportamentos anti-sociais.

Alguns jovens ‘transitam’ de lares para centros educativos

Celso Manata, procurador da República que coordenou o Ministério Público no Tribunal de Família e Menores de Lisboa durante muitos anos, admite que «há jovens que se vê mesmo qual é o percurso que vão seguir». E lembra que, apesar de existirem duas leis e sistemas diferentes  – um de promoção e protecção e o outro tutelar educativo – muitos miúdos são os mesmos e transitam de um para o outro. E «não há uma articulação entre as várias entidades», critica o magistrado. A justiça juvenil tenta recuperar o jovem quando vai para um centro educativo: «Mas o problema é que o grupo e a família do jovem continuam na mesma. Quando ele sai, volta para o mesmo ‘caldo’ que o levou a praticar ilícitos». Por outro lado, o sistema de promoção e protecção não tem qualquer forma de conter os miúdos que iniciam uma escalada de delinquência: «O regime é aberto e estão num lar, fazem disparates, mas o tribunal não pode fazer nada. Ficamos à espera que façam um ilícito mais grave para os podermos colocar num contexto fechado» (centro educativo).

A nova lei tutelar educativa corrige algumas situações, diz Celso Manata, pois prevê um acompanhamento na comunidade quando um jovem sai do centro educativo. Licínio Lima, subdirector da Direcção-Geral da Reinsersão e Serviços Prisionais, acrescenta que nessa altura é feita uma avaliação do seu risco de reincidência: «Isso decorrerá da avaliação do percurso no centro educativo, mas também do contexto familiar», diz ao SOL. Essa informação é então comunicada às comissões de menores para que possam seguir o jovem quando estiver em liberdade.

Josefina Castro questiona, porém, se há técnicos para fazer este acompanhamento. «Fazer um telefonema não serve de nada».

Oito homicidas com menos de 18 anos, desde 2010

Oito jovens entre os 16 e 18 anos foram condenados por homicídio ou tentativa de homicídio entre 2010 e 2013. Segundo dados do Ministério da Justiça enviados ao SOL, três foram cumprem pena na cadeia. Há ainda outro jovem homicida que, por ter cometido o crime com menos de 16 anos, está em centro educativo. Nas cadeias estão ainda 63 jovens menores de 18 que cometeram crimes, a maioria de roubo e tráfico de droga.

Números

1 homicida cumpre medida em centro educativo.

181 jovens cumprem medida em centros educativos por terem cometido 387 crimes. Há um ano, havia 255 jovens.

387 crimes cometidos pelos jovens que estão internados nos centros educativos, 42% (163) dos quais são crimes contra as pessoas. Em 2012, a proporção  era de 32% (94 em 286 crimes).