Pelo fim dos contratos de trabalho

Mário Centeno tem razão. A situação que se vive em Portugal, relativamente ao mercado de trabalho, só cristaliza a precariedade. Mais, cristaliza os salários baixos e desmotiva a competitividade e a produtividade. Mas Centeno é ainda muito recuado perante os desafios que se colocam à nossa economia.

Em minha casa não há o conceito de contrato de trabalho, nem de trabalho para toda a vida, nem sequer se fala de emigração. A minha filha adolescente sabe que o mundo dela é o mundo em que se transita de acordo com interesses dos promotores, em que se salta de acordo com as competências e as oportunidades, se incrementa a vida laboral com uma mescla de iniciativa própria e de trabalho dependente, se procura um projeto em qualquer parte da Europa ou do mundo.

Esta visão que as novas gerações já assumem, que os pais não querem deixar que elas tenham com medo egoísta do seu próprio futuro, deve ser agarrada pelos sociais-democratas, promotores das oportunidades e da justiça. Por isso, a cristalização das conquistas laborais do século passado já não é hoje uma garantia de futuro.

No nosso país não há muita gente com capacidade para investir; a banca está numa situação muito difícil e, também ela, amplia o garrote do financiamento; o Estado vive numa situação de desequilíbrio que não favorece a sua participação, por insuflação de recursos, na economia.

É por tudo isto que importa olhar para o investimento, em concorrência no espaço global, como elemento determinante do crescimento, do nascimento de iniciativas empresariais colaterais e de postos de actividade.

As leis do trabalho só são motivo de conversa entre associações de patrões, sindicatos funcionalizados, especialistas marxistas do Direito do trabalho e amanuenses da concertação social. Nenhum português discute os contratos se tiver a consciência do seu valor para a organização e nenhum promotor quer saber do título, sem termo ou com termo, que apõe no documento assinado quando aposta em novos projectos ou no desenvolvimento de outros já consolidados.

O contrato de trabalho cristaliza a dicotomia tradicional da luta de classes. Mas, se olharmos para a vida de hoje, essa luta de classes é cada vez mais um passado distante, e a transformação que se vive na actividade económica é cada vez mais uma negação da Rerum Novarum.

Os socialistas portugueses deveriam saber que não é uma legislação ultrapassada e rígida que resolve os problemas. E quando o que temos não cumpre, o melhor é encontrar um caminho radicalmente diferente, arrojado.

Em Portugal, importa que se avance para a consagração do contrato livre, com regras de protecção bilateral da relação entre as partes. Se esse contrato é com ou sem termo é absolutamente irrelevante. Só os mais conservadores portugueses, de direita ou de esquerda, não toleram que o mundo evolua. 

Os sociais-democratas sempre foram progressistas e até reformistas. Os nórdicos não discutem o nosso conceito de contrato de trabalho e, por isso, se adaptam a uma realidade dinâmica, emergente.

Importa conflituar com as velhas opções. Ser, neste século, a favor de formatações anciãs, negacionistas da confiança, num mundo em aceleração, é aprofundar a nossa decadência.