Blatter enfrenta cerco do FBI ainda dentro da Fifa

O suíço renunciou à presidência, mas só depois de ter ganho as eleições da semana passada. Consequência do escândalo mais recente ou manobra para ganhar tempo de preparar a sucessão?

Foi reeleito para mais quatro anos e demitiu-se passados quatro dias. Na terça-feira, Joseph Blatter anunciou a decisão numa conferência de imprensa marcada de emergência. Motivo para a saída de cena: um alegado suborno de 10 milhões de dólares (9 milhões de euros) pago pela África do Sul, através de contas da FIFA, com o objectivo de comprar votos para o país ganhar a organização do Mundial de 2010.

O dinheiro era para ter sido pago directamente pelos sul-africanos a Jack Warner, antigo presidente da Confederação de Futebol da América do Norte, Central e das Caraíbas (CONCACAF), mas estes não conseguiram reuniar a verba. E então pediram à FIFA que canalizasse 10 milhões de dólares destinados à organização do Mundial para uma conta controlada por Jack Warner, supostamente com o objectivo de ajudar a desenvolver o futebol das Caraíbas. Segundo a investigação das autoridades norte-americanas, suportada no testemunho de Chuck Blazer, um ex-dirigente da CONCACAF, essa transferência não era mais do que um suborno.

Jérôme Valcke, secretário-geral da FIFA, é suspeito de a ter autorizado. Nega tudo. Alega que esse pagamento só poderia ter sido viabilizado pelo argentino Julio Grondona, ex-responsável pelo comité de finanças da FIFA. Onde está Grondona? Morreu pouco depois do último Mundial.

A investigação a cargo do Departamento de Justiça dos Estados Unidos aproximou-se do núcleo duro da FIFA e Blatter terá sentido o cerco a apertar. Oalegado suborno da África do Sul, com recurso a contas da FIFA, pode ter sido a gota de água para a renúncia do suíço – que, segundo a imprensa norte-americana, também está a ser investigado.

Há, no entanto, outra possível explicação, que aponta para Blatter ter equacionado a demissão logo na quarta-feira da semana passada, após as primeiras detenções e antes das eleições de sexta-feira. Mas acabou por escolher continuar em jogo para passar uma imagem de força às federações que o apoiavam e para ter mais tempo à frente da FIFA. O suíço já anunciou que as eleições para o substituir no cargo só vão ocorrer entre Dezembro e Março, período suficiente para o presidente da FIFA preparar um candidato que possa beneficiar dos apoios na Ásia e em África, dois continentes que estiveram sempre ao seu lado.

A demissão de Blatter surpreendeu muitas das federações que votaram nele. Especialmente depois do seu discurso vitorioso na última sexta-feira: «Gosto de vocês, gosto do meu emprego. Não sou perfeito, ninguém é perfeito. Mas estou certo de que faremos um bom trabalho juntos».

De repente, tudo mudou: «O meu mandato não tem o apoio de todos os que vivem e amam o futebol, por isso vou abdicar e convocar um congresso eleitoral».

Com o adeus de ‘Sepp’ aparecem outros aspirantes à cadeira dourada da FIFA. O príncipe Ali Bin Al Hussein já anunciou que se vai recandidatar e o presidente da Federação Francesa de Futebol, Nöel Le Graët, pediu a Michel Platini para avançar. Luís Figo, anterior candidato, terá poucas hipóteses. Desde logo por ter desistido a uma semana do sufrágio. E depois por não reunir força suficiente na política internacional do futebol que lhe permita ir a jogo com os chamados tubarões.

Outra frente que se abre passa por uma aliança entre Estados Unidos e Inglaterra. Toda a investigação em curso mostra que os norte-americanos estão interessados em poder comandar a FIFA. Mas, dada a pouca tradição que têm no futebol, podem usar o seu poder financeiro e influência mundial para apoiar um candidato inglês. No país onde nasceu o futebol, não faltam críticos severos da gestão de Blatter, principalmente depois de a Inglaterra ter perdido a organização do Mundial de 2018 para a Rússia, num processo debaixo de muitas alegações de corrupção.

Os próximos tempos prometem grandes jogadas de bastidores na FIFA. Todos os que quiserem chegar à presidência precisam de convencer muito bem as 209 federações com poder de decisão. Os votos voltam a ter muito valor. E vários interessados.