Ornette Coleman. A linguagem de todos, pelo pioneiro do free jazz

A conversa decorreu em inglês, com direito a tradução, a ponte possível entre o pensador e o músico. É aqui que entraria o jazz, um idioma capaz de pacificar Babel e resolver todos os problemas de expressão.  Corria o ano de 1997, quando o filósofo Jacques Derrida entrevistou Ornette Coleman, coincidindo com os três concertos…

Ornette Coleman. A linguagem de todos, pelo pioneiro do free jazz

Contemporâneo de Charlie Parker e John Coltrane, foi nas décadas de 50 e 60 que Randolph Denard Ornette Coleman, nascido em Forth Worth, no Texas, se atreveu a amolecer as regras no jogo dos ritmos e harmonias, distanciando-se dos cânones e do grande cancioneiro americano. Apostou numa linguagem intuitiva, que se tornaria tão emblemática como o seu desfile regular no seio da comunidade artística de Nova Iorque, celebrizando-se pelo uso de fatos de cetim coloridos. Uma irreverência mais consensual do que as suas primeiras investidas na música, classificadas ao nível do sacrilégio. Basta lembrar os tempos de liceu, quando foi dispensado de uma banda por improvisar durante a execução da marcha "The Washington Post", composta por John Philip Sousa em 1889. 

O R&B e o bebop nortearam os primeiros trabalhos, ao serviço dos Jam Jivers. Depois de um concerto em Baton Rouge, e de um assalto, despede-se do saxofone. O incidente marca a transição para o saxofone alto, que o acompanharia ao longo dos anos seguintes. Em 1958, chegavam as primeiras gravações, Something Else!!!!: The Music of Ornette Coleman, com o selo da Contemporary. No ano seguinte, assinava contracto com a Atlantic Records, e lançava The Shape of Jazz to Come. Iconoclasta para alguns críticos, um verdadeiro génio para figuras como o maestro Leonard Bernstein ou o compositor Virgil Thomson.

As vanguardas seguiam o seu caminho, na ressaca da fase Atlantic e dos dois anos de contracto com a Blue Note, na segunda metade dos anos 60. E a adesão a instrumentos eléctricos revelou-se em discos como Virgin Beauty e Of Human Feelings, com um piscar de olho ao rock e ao funk, cultivados ao longos das décadas de 70 e 80, e receptivos a parcerias com nomes como o de Jerry Garcia, dos Grateful Dead. 

Contra os mais cépticos, faixas como Lonely Woman, "Peace, Turnaround, ou When Will the Blues Leave? haveriam de ascender à categoria dos standards.  

Em 2007, o álbum Sound Grammar valeu-lhe o prémio Pulitzer na categoria de música. No ano seguinte, a lenda que se estreou nos clubes de Los Angeles, semeando génio e controvérsia até às últimas notas, actuaria em Portugal, na Aula Magna e na Casa da Música. 

maria.r.silva@sol.pt