Domingo vamos à bola

Hoje sou frequentador assíduo do Estádio 1.º de Maio, pois é aí que os Mão Morta, como uma boa dezena de outras bandas bracarenses, têm a sua sala de ensaios.

De facto, sob a bancada nascente, o município criou um moderno complexo de salas insonorizadas que veio resolver, para muitos grupos da cidade, a eterna dificuldade em encontrar um sítio onde possam experimentar e fazer barulho sem incomodar ninguém.

Assim, foram aí concebidos os últimos discos da banda, tal como foram congeminados o Maldoror, a performance neuro-áudio-visual Câmara Neuronal ou os diversos opus do projecto de spoken word Estilhaços.

Antes, o Estádio 1.º de Maio era apenas sinónimo das romarias que, ao domingo, desciam a Avenida da Liberdade para ir ver a bola. Foi assim toda a minha infância.

Já adolescente, integrei-me numa dessas romarias e fui ver o Sporting de Braga jogar. Era um domingo de sol e deve ter sido a única vez que fui ver futebol ao Estádio 1.º de Maio. Não era coisa que muito me atraísse, ir à bola.

O meu pai, quando eu era miúdo, levava-me amiúde a ir ver jogar o Vieira, clube de que era dirigente. Eram jogos sem graça, por campos pelados no meio dos montes, com parcas dezenas de assistentes encolerizados a insultar árbitros e jogadores, que não raras vezes acabavam com toda a gente à batatada. Devo ter ficado traumatizado porque, apesar de gostar de bola, não aprecio nada vê-la das bancadas – prefiro a televisão.

Mas o estádio 1.º de Maio, sendo a casa do Sporting de Braga até ao Euro-2004 – quando foi inaugurado o novo Estádio Municipal na pedreira – não era apenas futebol. Vi aí um dos poucos jogos de râguebi a sério, entre equipas britânicas, numa das raras ocasiões em que se jogou râguebi em Braga.

Como também vi aí alguns concertos de música, de que guardo na memória um dos Turma 6, conjunto mítico da cidade do início dos anos 70, e muito fogo preso por ocasião dos festejos do S. João.

Mas o Estádio 1.º de Maio, para mim, além da romaria dominical e da sala de ensaios, é também a obra arquitectónica. As suas linhas modernistas, tendo como referências o Estádio Nacional, no Jamor, inaugurado dois anos antes, e o Estádio Olímpico, em Berlim, finalizado em 1936, de imediato o remetem para essa época totalitária onde a arquitectura tinha por função exaltar os regimes (e que a sua designação primitiva de Estádio 28 de Maio ainda mais acentuava).

Construído entre 1946 e 1950, totalmente em granito e betão, tem uma planta oval e bancadas descobertas de perfil homogéneo (excepto a poente, em cujo topo central se ergue a rectangular tribuna presidencial). A larga entrada em escadaria rasga a cercadura Norte. E uma torre paralelepipédica, ladeada por dois altos-relevos em bronze glorificadores da prática desportiva, ostenta o escudo nacional.

A inauguração do estádio contou com a presença de Salazar e do então Presidente da República, Óscar Carmona, deixando clara a importância da obra para o regime.

Mas, independentemente de tudo isso, é um marco esteticamente afortunado, que felizmente foi reconhecido como Monumento de Interesse Público em 2012.