Câmara de Lisboa acumula juros milionários

Já vai em 1,2 milhões de euros a indemnização que a Câmara de Lisboa (CML) terá de pagar ao ex-trabalhador da EPUL Bernardo Pinto, pelo seu despedimento em 2006. Por cada mês que passa sem saldar a dívida, são mais quatro mil euros de juros que engordam o valor a receber.

Desde que a sentença do Supremo Tribunal de Justiça veio dar razão ao trabalhador, em Julho do ano passado, são 120 mil euros só em juros. Nessa altura, a CML decidiu recorrer para o Tribunal Constitucional (TC), mas os juízes voltaram a dar razão a Bernardo Pinto e a sentença transitou em julgado em Fevereiro.

“São valores que o bom senso e as várias decisões do TC provaram que se poderiam ter evitado”, argumenta Bernardo Pinto, ex-director de Planeamento e Controlo Empresarial da EPUL, que diz não entender por que razão a Câmara tarda em pagar.

Com a Empresa Pública de Urbanização de Lisboa (EPUL) oficialmente extinta em Maio de 2013, a dívida passou para a Câmara, que assumiu os respectivos passivos, incluindo a indemnização deste processo que já estava provisionada nas contas da empresa. Apesar disso, um diferendo entre a Câmara e o ex-trabalhador sobre os montantes a haver a título de indemnização tem feito o processo arrastar-se.

“Já houve uma indicação de pagamento em Fevereiro pela advogada da EPUL, mas isso ainda não aconteceu”, diz ao SOL, explicando ter tido já indicação do departamento jurídico da CML de que os Recursos Humanos “estavam a fazer as contas” ao que teria a receber.

‘É preciso apurar montantes’

Em causa estariam eventuais rendimentos que pudesse ter auferido desde que há nove anos foi despedido da EPUL e que teriam de ser deduzidos ao montante a receber.

Ao SOL, fonte oficial da CML esclarece que “é ainda necessário proceder ao apuramento concreto dos montantes a pagar”. No entender dos serviços jurídicos da autarquia, do “acórdão não resultou para a EPUL qualquer obrigação de pagamento imediato”, porque os valores certos não estarão ainda acertados pela Câmara com base em documentação que comprove os rendimentos que Bernardo Pinto auferiu (ou não) desde que foi despedido. “Não havendo a apresentação dos elementos, naturalmente não podem ser contabilizados juros”, sustenta a autarquia.

A viver no Brasil há quase cinco anos, Bernardo Pinto assegura, porém, ter já remetido toda a documentação pedida: “Já enviei declarações de IRS e do Imposto de Renda do Brasil. Mas continuo sem previsão de pagamento”.

Despedido por causa de dois e-mails

Desde 2006 que Bernardo Pinto contesta o seu despedimento da EPUL, decidido por causa de dois e-mails enviados ao director de Recursos Humanos e a uma administradora da empresa. O desabafo sobre uma proposta de congelamento de salários, com um comentário irónico sobre o despesismo na empresa, foi enviado com conhecimento para os directores e valeu-lhe então um processo disciplinar.

Acabaria por ser despedido e  recorreu então aos tribunais, alegando tratar-se de um despedimento ilegal por ter sido sancionado no uso da sua liberdade de expressão. A indemnização a que tem direito contempla, além de todas as retribuições que deixou de receber desde 2006 (incluindo o valor do leasing da viatura de serviço e o plafond de gasolina), uma compensação de cinco mil euros por danos não patrimoniais. “Fiquei desempregado, aos 43 anos, e fui forçado a emigrar para o Brasil”, diz o antigo director da EPUL.

margarida.davim@sol.pt