Timor, lusofonia e o nosso conceito estratégico nacional

Decorre hoje no Parlamento a Conferência Portugal-​Timor-Leste, uma iniciativa da Assembleia da República e do Parlamento Nacional de Timor-Leste, promovida através dos respectivos Grupos Parlamentares de Amizade.

Não posso deixar de mencionar a importância daquela data para muitos de nós. Seja pelo seu significado histórico. Pelo que exigiu e conseguiu em Portugal em termos de unidade em torno de um propósito comum. Pelo significado da movimentação da sociedade civil que existiu. E, desde logo, por ter levado tantos portugueses até Timor-Leste – numa nota pessoal, recordo com gratidão o privilégio que me coube de apoiar o seu Governo e de leccionar no curso inaugural de Direito da Universidade Nacional de Timor Lorosa’e.

Agora estamos numa etapa nova. Tal como acontece face a outros parceiros da CPLP, olhamo-nos de modo a entender como estreitar relações como as económicas, que os relatórios existentes – por exemplo, do Banco de Portugal e da AICEP – mostram ter grande potencial.

Importa, para isso, compreender algumas das principais preocupações espelhadas por investidores nacionais e estrangeiros em qualquer país. A segurança (de trabalhadores, empresários e empresa), a estabilidade do quadro legal (fiscal, laboral, outros), a educação e formação da população, a previsibilidade e qualidade das decisões administrativas e judiciais, a celeridade na resolução de conflitos, ou o grau de transparência do funcionamento das instituições. Estão estes e outros aspectos presentes num nível adequado?

Em sociedades pós-conflito tais factores são talvez ainda mais escrutinados e determinantes. Alguns acontecimentos recentes, complexos no plano bilateral, mostraram existir também a necessidade de reforço do diálogo e da actuação política e diplomática.

Os quadros de cooperação existentes e vindouros devem privilegiar o apoio ao fortalecimento do Estado de Direito e das instituições, também em concretização do abraço dado pelas normas das constituições portuguesa e timorense que prevêem que os dois países devem manter laços privilegiados com os países de língua oficial portuguesa.

Esses propósitos devem ser casados com uma maior exigência em termos de avaliação da qualidade e do impacto do investimento colocado na cooperação. Temos cumprido a nossa missão? Somos eficazes? Os instrumentos de avaliação existentes devem ganhar maior pendor de avaliação de resultados, nomeadamente para que investimentos como o do Programa Estratégico de Cooperação para 2014-2017 (42 milhões de euros) sejam bem sucedidos.

O laço mais forte que nos une, e que é parte integrante da estruturação da solução independentista, encontra-se claro na Constituição timorense: o “tétum e o português são as línguas oficiais da Republica Democrática de Timor-Leste”.

Neste quadro tem sido construído, nomeadamente, um sistema jurídico de matriz lusófona que constitui um potenciador da circulação, da troca de experiências, de maior segurança para os investidores e de facilitação da colaboração no espaço da lusofonia. Esta matriz, comum a outros países, tem facilitado a troca de quadros e aumentado a interdependência dos espaços lusófonos, sendo claramente um caminho a desenvolver para benefício comum.

É também sobre esta base que a nova fase se constrói, podendo Timor-Leste potenciar a sua actuação em necessidades como as de educação, saúde, infra-estruturas, saneamento, águas e outras, e atrair investimento capaz de criar maior animação económica e mais emprego, todos campos onde Portugal pode ter um papel fundamental e natural retorno.

Não tenho dúvidas de que o nosso conceito estratégico nacional, em especial no tocante ao mundo lusófono e ao desenvolvimento da economia, e tal como face a outros países, se projecta de modo a corresponder ao citado gesto constitucional, para o qual a conferência de hoje constitui um importante contributo.