Marco Silva: (in)justa causa ou causa justa?

Desde o dia 4 de Junho que o país quase paralisa com as notícias sobre a cessação do vínculo laboral desportivo entre o treinador de futebol Marco Silva e o Sporting Clube de Portugal. 

Em consequência de uma relação reiteradamente tempestuosa ao longo da época, a Sporting SAD informou nesse dia que iria avançar para um processo de despedimento por justa causa. No dia a seguir, anunciou Jorge Jesus como novo treinador.

Não existindo um regime específico dos treinadores, no caso em apreço serão aplicadas as normas do Contrato Colectivo de Trabalho celebrado entre a Liga de Futebol Profissional e a Associação Nacional de Treinadores de Futebol, as do Código do Trabalho e ainda as do regime do contrato de trabalho do praticante desportivo.

É por todos reconhecido que qualquer entidade empregadora desportiva goza do exercício do poder disciplinar e não podemos esquecer que o despedimento com justa causa, sem qualquer indemnização, é a sanção mais grave de um vasto leque possível. Nomeadamente: repreensão, repreensão registada, sanção pecuniária, suspensão do trabalho com perda de retribuição.

Todavia, atendendo aos princípios da graduação e da proporcionalidade, só a violação muito grave dos deveres do treinador pode acarretar o seu despedimento – e sempre após a conclusão prévia de um processo disciplinar.

Tem vindo a público um conjunto de ‘factos graves’ para justificar o processo disciplinar, designadamente: desrespeito do dress code num jogo com o Vizela a contar para a Taça de Portugal (17 de Dezembro de 2014); desobediência a ordens superiores ao não utilizar Marcos Rojo num jogo particular, satisfazendo a pretensão de terceiros (Doyen); violação do dever de lealdade ao não respeitar nas conferências de imprensa as orientações da SAD; recusa de presença em diversas reuniões com o presidente, entre tantas outras alegações.

Porém, a questão de fundo é que não podem existir julgamentos públicos ou sumários de condutas aparentemente desconexas sem uma análise profunda e adequada de toda a situação, sendo certo que o ónus da prova quanto aos fundamentos para a justa causa caberá sempre à entidade empregadora e a sua apreciação, em última instância, ao Tribunal do Trabalho.

O perpetuar da presente situação não agrada a nenhuma das partes, porquanto o Sporting continua a ter Marco Silva como treinador até que seja encerrado o processo disciplinar e, por outro lado, o técnico não se encontra livre para poder ser contratado por outro clube e as oportunidades de mercado já escasseiam.

No meu entendimento, estamos perante uma notória estratégia negocial da Sporting SAD alicerçada no factor tempo, cujo pecado reside na deficiente transmissão da sua posição quanto ao que verdadeiramente se passou com Marco Silva ao longo da época, o que, a acrescer à comunicação precoce, mas talvez inadiável, da contratação de Jorge Jesus, incendiou e muito a generalidade da opinião pública. E, em particular, alguns dos chamados ‘notáveis’ do clube.

Com frieza e equidistância, talvez seja cedo para saber se estamos perante uma (in)justa causa ou uma causa justa. Mas, para o benefício de ambas as partes, Sporting e Marco Silva estão condenados a um inevitável acordo, bem mais célere do que o tempo normalmente despendido no tribunal.

Docente de Direito do Desporto da Universidade Lusíada de Lisboa