Beleza: ‘Um Governo PS não deve fazer tábua rasa do que este Governo fez’

Esteve ao lado de Seguro e agora assume a responsabilidade de ajudar Costa a unir o PS, sem exclusões nem quotas. Rejeita Nóvoa e ainda espera que um socialista avance para Belém.

Beleza: ‘Um Governo PS não deve fazer tábua rasa do que este Governo fez’

O PS não descola nas sondagens e a última dá a coligação à frente. Isso dá razão a António José Seguro?

É difícil ser líder da oposição. António Costa disse, quando António José Seguro era líder do PS, que é talvez o lugar mais difícil na política portuguesa. Não há varinhas mágicas, não há milagres. Seguro ganhou duas eleições e alguns acharam que era por pouco. Na política, como no futebol, o que interessa é ganhar. Estou confiante, estamos a trabalhar para que o partido ganhe as eleições.

Seguro estaria na mesma situação?

Sou suspeito porque sou amigo de Seguro. Sou solidário com os meus amigos, mas para além disso a política não é para amigos. Em termos racionais, qualquer que fosse o líder estaria numa situação muito difícil.

Acha que Seguro foi injustiçado?

Acho. E acho que houve até alguma crueldade. Mas quem anda na política sabe que, às vezes, ela é cruel e injusta. A liderança de Seguro deixa uma marca: a ética e decência na vida pública e a abertura do partido aos cidadãos, através do Laboratório de Ideias e das primárias, que vieram para ficar.

Seguro tem futuro na política?

Claro. Um político com 50 anos é um jovem. Mário Soares praticamente começou a vida política aos 50. Quando Seguro estiver disponível e os socialistas acharem que é útil, voltará. Não se podem desperdiçar políticos com experiência e inteligência e o PS tem tradição de tratar bem os ex-líderes.

O que falta para ganhar as eleições?

OPS tem de ter a confiança dos portugueses. Para isso tem de se mostrar unido, tem de haver uma união saudável e genuína. E renovação também, caras novas, mas respeitando o passado e a experiência. E manter equilíbrios, porque o PS é plural e tem várias sensibilidades políticas.

Então, o que falta agora é união?

Tem de haver uma equipa e todos têm de dar a cara. Tenho feito a minha parte e assumo a responsabilidade de dar contributos para que o partido se mostre coeso. Agora, muito disso depende da actual direcção do partido que tem a faca e o queijo na mão.

Quais vão ser mais prejudicados, os socráticos ou os seguristas?

Essa é uma má maneira de pôr a questão. O PS não deve ser um partido de quotas. Gostava que o debate fosse ideológico e menos de grupos de amigos do líder ou ex-líderes. Era o que faltava ser atirado borda fora algum socialista só porque pertenceu à direcção de Seguro. Este critério também serve para os apoiantes de Sócrates. Não apagamos ninguém da história. Espero que haja inteligência das distritais e confio na palavra do secretário-geral, que disse que haveria inclusão e pluralidade nas listas.

Disse que Costa não deve vender ilusões. O programa do PS faz isso?

Diria isso de qualquer líder do meu partido. É preferível perder eleições na base da verdade do que ganhá-las na mentira. Costa teve o cuidado, seguindo a linha de Seguro, de medir as propostas do ponto vista financeiro. E os portugueses vão premiar quem for comedido nas promessas. A razão não está sempre do nosso lado, um futuro Governo do PS não deve fazer tábua rasa do que este Governo fez. Deve mudar o que está mal feito e manter o bem feito. Temos de perceber quando o nosso partido errou no passado, assumir e corrigir os erros. Somos uma alternativa mas não radicalmente diferente. O PS não é o Syriza, é um partido da social-democracia europeia, moderado. E é assim que tem que se manter.

A colagem de alguns dirigentes ao Syriza prejudica o PS, dada a evolução da situação grega?

Alguns camaradas mais jovens entusiasmaram-se. Quem anda nisto há uns anos percebe que o Syriza vem de uma certa esquerda cosmopolita, um pouco ficcista, que fez promessas na ilusão de que podia impor aos credores só o que queria. Não pode, a Europa vive de cedências de parte a parte.

A direita vai usar isso contra o PS. Como combater esse discurso?

Cabe-nos explicar que não somos assim. Muitas vozes no PS disseram ‘Alto! Não é por aí’. O PS é um grande partido também por essa diferença. É natural que haja alguns mais próximos do BE, Livre e Syriza. E é bom que cá estejam. Por mim, o PS seria a casa da esquerda e até poderiam cá estar dentro, nomeadamente o Livre. Discordo em muita coisa mas temos uma matriz comum.

Se o PS não conseguir maioria absoluta, deve procurar alianças à esquerda ou direita?

Temos de ultrapassar esse tabu de não haver um governo à esquerda. Era útil para a democracia um governo, como houve em Lisboa, de coligação à esquerda, nomeadamente com o PCP. Obviamente, fazendo acordos para políticas concretas. Exemplo: onde há áreas onde nos podemos entender à esquerda? Saúde, Educação e Segurança Social. Onde é mais fácil à direita? Na Economia.

Preferiria fazer só acordos parlamentares?

Temos de ambicionar a maioria absoluta e, se não a obtivermos, temos que perceber os sinais dos portugueses. Não me chocaria nada um entendimento à esquerda, como não me choca um entendimento com o PSD ou o CDS. Claro que nunca com estes protagonistas. A situação do país requer estabilidade e, por isso, um governo de maioria, mais do que só acordos parlamentares. Mas o PSsó deve fazer acordos após um referendo aos militantes.

Gostava de ser ministro da Saúde?

Não tenho ambição de ser ministro de nada. Só tenho ambição que o próximo Governo PStenha políticas de Saúde claras, no sentido de separar o que é público do que é privado e que os nossos impostos não sirvam para financiar lucros privados na Saúde.

Na altura das primárias, disse ao i que Costa era um ‘regresso a muito daquilo que foi José Sócrates’. Mantém essa opinião?

Quero virar uma página sobre isso, o que disse está dito no passado. Costa tem-se esforçado para dar esperança aos portugueses e estou a ajudá-lo para que tudo corra bem. O que disse porventura foi mal interpretado. Às vezes, parecia, não da parte de Costa mas de alguns, que havia um receio de que não continuassem nas boas graças da direcção. O PS tem de acabar de vez com esta disputa de facções e claques.

Havia pressões de pessoas ligadas a Sócrates a Seguro?

Houve uma certa agressividade e isso significa algum receio. Houve excessos, eu próprio me excedi na campanha. Por vezes, as lutas internas são mais ferozes que as externas, o que é desagradável. Mas passa, somos camaradas.

A prisão preventiva de Sócrates prejudica o PS?

Não ajuda. Mas temos de separar, como Costa tem feito e bem. Confio na Justiça. Nunca fui apoiante de Sócrates, mas foi líder do PS, primeiro-ministro e é meu camarada, merece respeito e solidariedade pessoal. Espero que corra bem e seja inocente.

Sócrates tem feito essa separação?

Quem sou eu para dar conselhos de estratégia de defesa… Mas às vezes não tem ajudado. Cabe ao PS não se deixar contaminar.

Já desistiu de procurar outro candidato presidencial para o PS?

Não andei à procura de ninguém. Espero é que apareça um socialista candidato a Presidente da República. Até porque essa questão é para depois das legislativas. Há vários com essa capacidade.

Quem?

Há figuras na área do PS com esse perfil: Guilherme d’OliveiraMartins, Jaime Gama, Maria deBelém, Alberto Martins. Claro que, se me fizesse a pergunta há um ano e meio, tinha-lhe dito que candidato a primeiro-ministro era Seguro e candidato a Presidente era Costa. Agora temos Costa candidato a primeiro-ministro…

E Seguro poderá candidatar-se à Presidência?

Se estivéssemos em França, poderia, mas não me parece. Nem estamos em França e, do que conheço dele, quer de facto fazer um intervalo na vida política pública.

Tudo indica que o PS apoiará Sampaio da Nóvoa. Terá o seu voto?

O secretário-geral disse que a seu tempo tomaríamos essa decisão. Se não aparecer nenhum socialista candidato, o partido poderá tomar essa opção. Nesse caso, preferia que não tomasse opção nenhuma. Conheço Sampaio da Nóvoa, tenho consideração por ele e é positivo que seja alguém da sociedade civil que se disponibiliza para a política. Mas faltam-lhe características importantes como a experiência política para fazer pontes entre os partidos, mais ainda se ninguém tiver maioria. Preferia um perfil com um currículo político conhecido nos últimos vinte anos. Não é o meu candidato, é uma candidatura que não me entusiasma.

Se o PS perder as eleições será candidato a líder?

Se não correrem bem as legislativas e o PS não ganhar, todo o PS perde. Seria inimaginável.

Estaria disponível para avançar?

Só falo de cenários possíveis e esse não faz sentido.